Grupo Vita enviou 45 denúncias de abusos à Igreja. Maioria dos casos são no Norte e Centro
O Grupo Vita enviou 45 denúncias de abusos sexuais às estruturas eclesiásticas, das quais 27 às Comissões Diocesanas. Remeteu 16 para o Ministério Público. A maioria dos casos foram reportados às dioceses do Porto, Braga e Lisboa, com cinco sinalizações em cada uma, e a maioria dos crimes acontecia no confessionário.
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O Grupo Vita apresenta, esta tarde de terça-feira, o primeiro relatório da atividade desenvolvida no último meio ano que exerceu funções. Segundo o documento, a estrutura criada pela Conferência Episcopal Portuguesa para apoiar vítimas deste crime enviou até agora 45 situações de abusos sexuais às estruturas eclesiásticas (Dioceses, Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica e a Nunciatura), das quais 27 às Comissões Diocesanas. Ao Ministério Público e à Polícia Judiciária foram remetidas apenas 16, pois estas não incluem padres falecidos ou casos em que já decorreu processo judicial.
A maioria dos casos reportados às Comissões Diocesanas aconteceram no Porto, Braga e Lisboa, com cinco sinalizações a cada uma destas dioceses, seguindo-se Guarda com três, Coimbra e Funchal com duas cada uma, e as dioceses de Vila Real, Lamego, Leiria-Fátima, Portalegre-Castelo Branco e Évora com uma cada.
Durante os seis meses que está em funções, recebeu 278 chamadas telefónicas relativas a situações de violência sexual no contexto da Igreja. O grupo Vita identificou depois 64 vítimas de violência sexual, tendo sido a maioria dos contactos realizado por telefone (52) e os restantes por email (12). Destes pedidos de ajuda, concretizaram-se 42 atendimentos (presenciais ou online) com vítimas de violência sexual. Das 42 pessoas atendidas, o Vita explica “que três eram pessoas adultas que não preenchiam os critérios de adulto vulnerável, à data da situação” e, por isso, considerou 39 vítimas.
Destas, “apenas 30.8% foram sinalizadas à Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa” e a maioria vive atualmente no Centro (15) e no Norte (12), seguindo-se Lisboa (8), Alentejo (2) e Madeira (2).
Vinte vítimas com apoio psicológico e psiquiátrico
As vítimas foram encaminhadas para diversos tipos de apoio, como psicológico (18), psiquiátrico (2), social (4), jurídico (1) e financeiro (4), estando as consultas de psicologia e de psiquiatria a serem asseguradas pela bolsa de profissionais constituída pelo Grupo Vita e os custos suportados pelas dioceses e Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica. O Grupo Vita encaminhou ainda um leigo, situação que já tinha sido sinalizada às entidades competentes (penais e canónicas), para apoio psicológico com um profissional da bolsa do Grupo Vita.
Cinco outras vítimas estão ainda a aguardar encaminhamento para apoio psicológico e uma outra para apoio psiquiátrico. Verifica-se uma “elevada discrepância” entre as duas categorias profissionais, com os psicólogos disponíveis a cobrirem mais de 80% do território continental, mas os psiquiatras apenas na Grande Lisboa, Grande Porto, Madeira e Açores. Nas regiões autónomas, a bolsa dispõe apenas de psicólogos na ilha da Madeira.
Confessionário e sacristia
A maior parte das situações no contexto da Igreja aconteceram sobretudo no confessionário, seguindo-se a sacristia. Umas das vítimas refere o gabinete do padre. O Grupo Vita refere ainda no relatório que "para oito vítimas, as situações abusivas ocorreram na casa do padre, na casa de férias do padre ou na casa paroquial, para seis vítimas, os factos ocorreram no seminário e em quatro situações no carro do agressor”.
À data dos alegados factos, a grande maioria das vítimas (71.8%) vivia com a família nuclear e cerca de 18% em instituição (cinco vítimas em seminário, uma em colégio de ordem religiosa e uma em casa de saúde). “Das vítimas que referem ter irmãos, cerca de 10% refere que estes também foram vítimas, apesar da maioria (59%) responder negativamente a essa questão. Ainda, 15.4% refere não saber”, lê-se ainda o documento.
Em 75% dos casos, as vítimas tendem a reportar abusos ocorridos nas décadas de 60, 70 e 80 do século passado. Cerca de 12.5% decorreram nos anos 90 e os restantes (12.5%) decorreram após o ano 2000.
Indemnizações
Mais de metade dos comportamentos sexualmente abusivos dizem respeito a toques ou carícias em outras zonas erógenas do corpo, que não os órgãos sexuais, e/ou beijos nas mesmas zonas (56.4% das vítimas). Em 33.3% dos casos houve manipulação dos órgãos genitais da vítima por parte da pessoa que cometeu o abuso e 23,1% das vítimas referem que o suspeito de abusos teve conversas com conteúdo sexualizado. Em 20.5% das situações, a pessoa que cometeu o abuso pediu à vítima para que esta também o masturbasse. Com uma referência residual, foi reportado por seis vítimas sexo oral, anal ou vaginal.
No que diz respeito à pessoa que cometeu o abuso sexual, a quase totalidade das vítimas refere que o agressor foi um sacerdote. Apenas quatro vítimas mencionaram ser um leigo (catequista, seminarista). Na maioria das situações (94.9%), a pessoa que cometeu o abuso não reconheceu a agressão e em duas pediu desculpa. Numa das situações o pedido ocorreu em sequência de uma decisão judicial e, na outra, a pessoa que cometeu o abuso procurou justificar o seu comportamento com experiências passadas, como problemas na infância.
Apenas quatro vítimas indicaram, numa fase inicial, a vontade de ser indemnizadas, como forma de reparação por danos morais. À data atual, em que este relatório é apresentado, algumas vítimas reportaram ter a intenção de analisar a possibilidade de pedir uma indemnização.
O Grupo VITA foi criado pela Conferência Episcopal Portuguesa em abril de 2023, após a apresentação do relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa, e não tem data para cessar funções.