O número de crianças com 6 anos na Educação Pré-Escolar não pára de aumentar desde 2013: eram quase 10 mil no ano letivo 2016/2017.
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O relatório Estado da Educação 2017, do Conselho Nacional de Educação, alerta para o facto de a taxa de retenção entre os que entram no 1.º ano com 5 anos ser quase o dobro dos que entram com 6 anos. A idade de ingresso devia ser revista? Especialistas ouvidos pelo JN dividem-se: há quem defenda um ano de transição e quem prefira que os critérios de matrícula privilegiem a maturidade em vez da idade.
Por que razão há cada vez mais crianças com 6 anos no Pré-Escolar? Professores, diretores, pediatra, pedagogo e pedopsiquiatra acreditam que seja mais por falta de vaga no 1.º Ciclo do que por opção dos pais. Concordam, no entanto, que prolongar o jardim de infância pode ser benéfico para os mais novos e imaturos.
"De nada serve apressar a escolaridade", insiste Renato Paiva. O pedagogo defende que a idade de ingresso passe para os 7 anos. "É uma altura em que temos maior maturidade e que a aprendizagem se torna mais facilitada". Já para a pedopsiquiatra Ana Vasconcelos, esta revisão não é uma prioridade, até porque atrasar o ingresso por uma questão de imaturidade da criança "não é muito científico" e o tempo sem estimulação nada resolve.
Paulo Oom também considera que a idade de ingresso está correta, mas defende que a maturidade e competências pré-escolares da criança devem pesar na matrícula. "Havendo dúvidas, não deve ingressar". O pediatra garante que a entrada no 1.º ano "é tema de conversa de todas as consultas dos 5 e 6 anos". O início do ano é a "altura ideal para, havendo dúvidas", se fazer os testes às pré-competências de leitura, escrita e raciocínio matemático. "Havendo um atraso no desenvolvimento, o ingresso deve ser adiado, se for ligeiro deve ser definido um programa de estimulação", recomenda.
custo de saltar etapas
As crianças que fazem os 6 anos entre 16 de setembro e 31 de dezembro ficam com as matrículas condicionadas à existência de vagas. O Ministério da Educação sublinha que já é possível adiar a entrada no 1.º Ciclo. Desde 2016, quando foram aprovadas as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, que o ingresso de "alunos condicionais" é ponderado pela escola em conjunto com os pais. A tutela acredita que "com uma transição mais articulada, gradualmente, irá reverter o número de alunos que não começam a escolaridade obrigatória na idade modal".
O relatório alerta que os alunos que entram um ano mais cedo registam taxas elevadas de retenção logo no 1.º Ciclo: por exemplo, no 2.º ano, 6,7% dos alunos com 7 anos (idade expectável) reprovaram em 2016/2017 enquanto os de 6 anos foram 12,3%.
Independentemente da idade, é importante que ao entrar no 1.º Ciclo a criança tenha autocontrolo para que consiga estar sentada à secretária a maior parte do dia. "Ter boa consciência fonológica. Entender rimas, perceber que Renato tem três sílabas (Re-na-to). Conhecer as letras e ter um discurso fluente. Em termos psicomotores ter uma motricidade global adequada e um treino de motricidade fina na pega do lápis, da caneta, do pincel ou da tesoura", explica Renato Paiva.
"Recebo muitas queixas de professores de que as crianças chegam ao 1.º ano cada vez mais infantis", admite Manuel Micaelo. O coordenador do 1.º Ciclo da Fenprof recomenda aos pais que "prestem muita atenção aos filhos". "Às dificuldades na fala e à sua capacidade de atenção". Pois uma entrada prematura pode resultar num "retrocesso". "Paga-se um custo, por saltar etapas".
Para a coordenadora do Pré-Escolar da Fenprof, a revisão da idade de ingresso "é uma discussão que tem de ser feita", insiste Júlia Vale. "Há sempre exceções" mas, quando as crianças precisam de mais tempo, "é benéfico prolongar por um ano o Pré-Escolar".
"Conheço vários casos de pais que pediram para os filhos ficarem mais um ano na pré e não foi por falta de vaga", admite Manuel Pereira. Para o presidente da Associação de Dirigentes Escolares, o relatório é "um alerta". O diretor considera que podia ser criado "uma espécie de ano zero, de transição para o 1.º Ciclo".
Detalhes
9912 Crianças de 6 anos estão no Pré-Escolar - De acordo com o relatório Estado da Educação 2017, em 2016/ 2017 estavam inscritos no pré-escolar 9912 crianças de 6 anos. Em 2007, eram 2865, um crescimento superior a 70% e sempre ascendente.
12,3% Dos que entram mais cedo chumbam - O relatório alerta que alunos que entram com 5 anos no 1.º Ciclo chumbam mais: nível de retenção de alunos de 6 anos no 2.º ano é de 12,3%, enquanto nos 7 anos é de 6,7%.
Ministério quer saber se há lista de espera para salas de 3 anos
É uma promessa que o Governo garante que irá cumprir no próximo ano letivo: a universalização da educação Pré-Escolar para todas as crianças a partir dos 3 anos. O Orçamento do Estado para 2019 prevê a abertura de, pelo menos, mais 100 salas. Por isso, recentemente, os diretores foram questionados sobre se têm lista de espera para as salas de 3 anos. É o caso do Agrupamento Dr. Costa Matos (Gaia), revela Filinto Lima. O presidente da Associação Nacional de Diretores alerta que a universalização requer condições, especialmente nos grandes centros urbanos. Júlia Vale receia que, sem investimento na rede, o Governo tenha de recorrer a contratos com colégios ou instituições de solidariedade social para superar falhas na oferta.