As condições de habitabilidade estão a degradar-se e há cada vez mais pessoas a viverem em casas sobrelotadas, ou seja, em imóveis em que o número de divisões é inferior ao número de ocupantes. O retrato é traçado pelo Instituto Nacional de Estatística, que alerta para um agravamento da privação habitacional severa.
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As conclusões do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento do Instituto Nacional de Estatística (INE) relevam que aumentou de 9,4% para 12,9% a proporção de pessoas que residem em alojamentos "em que o número de divisões habitáveis era insuficiente". Também subiu o número de moradores em condições severas de privação habitacional de 3,9% para 6%. Afeta, sobretudo, os mais pobres e as famílias com crianças ou jovens até aos 17 anos que residem em cidades e em zonas mais urbanas.
Na informação publicada esta sexta-feira, o INE dá conta de que 4% das pessoas com 16 ou mais anos admitiram que, por falta de casa, tiveram de pernoitar temporariamente noutro alojamento (privado ou coletivo), na rua, num espaço público ou em casa de amigos ou familiares. "As principais razões, referidas pelos inquiridos, foram os problemas de relacionamento ou familiares (39,6%) e os problemas financeiros (19,1%)", pode ler-se no documento do INE.
A taxa de sobrelotação é superior nas áreas urbanas (14,9%) e afeta, particularmente, a população em risco de pobreza e as crianças e os jovens até aos 17 anos. Cerca de um quinto das crianças e do jovens (21,8%) vivem em imóveis sobrelotados.
"O risco de viver numa situação de insuficiência do espaço habitacional era mais significativo para a população em risco de pobreza: 27,7% da população em risco de pobreza estava em situação de sobrelotação habitacional, o que compara com 9,8% na restante população", lê-se ainda. Nas regiões autónomas dos Açores e da Madeira, os casos de sobrelotação cresceram ainda mais do que no Continente: Nos Açores, essa taxa passou de 13,5% em 2022 para 21,4% no ano passado, enquanto, na Madeira, subiu de 13% para 20,3%.
Além viverem num imóvel demasiado pequeno para o número de residentes, 6% da população em Portugal reside em casas sobrelotadas degradadas. A habitação tem, pelo menos, um destes problemas: inexistência de instalação de banho ou duche e de sanita com autoclismo, no interior do alojamento; teto que deixa passar água, humidade nas paredes ou apodrecimento das janelas ou soalho; e/ou luz natural insuficiente num dia de sol.
De um modo geral, o INE sublinha, também, que quase um terço da população (29%) mora em habitações com soalhos apodrecidos, humidade e infiltrações de água e 8,1% não tem luz natural suficiente em dias de sol.
Quase metade da população (42%) não consegue aquecer a casa
Portugal continua a ser um dos cinco piores países da União Europeia no conforto térmico da habitação. Um quinto (20,8%) da população portuguesa não tinha, no ano passado, capacidade financeira para manter as casas quentes, mais 3,3% do que em 2022.
"Portugal era, em 2022, um dos 5 países da UE-27 em que esta incapacidade era mais elevada, com 17,5%, quase o dobro da média europeia de 9,3%", especifica o instituto, assinalando que a "percentagem da população em risco de pobreza sem capacidade financeira para manter a casa adequadamente aquecida (37,3%) representava mais do dobro da restante população (17,4%), e afetava, em especial, os idosos (28,5% para o grupo etário com 65 e mais anos)".
Ora, aos residentes que não conseguem aquecer a casa por razões financeiras, acrescem 21,6% da população que admite morar num alojamento que não é suficientemente quente no inverno por outros motivos e 38,3% cujas casas não são frescas no verão. Ou seja, feitas as contas, quase metade da população (42%) vive em casas que são frias no inverno e não conseguem aquecê-las adequadamente. Os sistemas de aquecimento mais utilizados são "o aquecimento fixo não central" elétrico. A segunda fonte de energia mais usada é a lenha (36,1%).
No entanto, 26,6% residentes em Portugal não usam aquecimento em casa. Essa proporção é muito superior na Madeira (86%) e nos Açores (72,6%).
"A proporção de pessoas que viviam em alojamentos em que não era utilizado qualquer tipo de aquecimento em casa era mais elevada em situações de pobreza: 39,7% da população em risco de pobreza referiu não utilizar aquecimento em casa, o que compara com 23,9% da restante população", como é referenciado, igualmente, na informação do INE.
Rácio entre despesas de habitação e salário melhorou
O INE destaca, ainda em contrapartida, que há uma "ligeira melhoria no rácio entre as despesas em habitação e o rendimento disponível das famílias, registando-se, em 2023, uma carga mediana das despesas em habitação de 9,7%, inferior ao resultado de 10,2% registado no ano anterior". Já a taxa de sobrecarga das despesas em habitação (em que o rácio entre as despesas anuais com habitação e o rendimento disponivel é superior a 40%) foi de 4,9%, pouco abaixo do valor no ano anterior (5,0%).
Essa sobrecarga é superior nas áreas predominantemente urbanas (10,3%), descendo para 8,8% nas pouco povoadas. Sem surpresa, sáo as famílias mais carenciadas que mais sentem o peso da sobrecarga das despesas com a habitação.