Ostentam o símbolo do caracol, mas não são cidades que ficam para trás. Pelo contrário, aquelas que integram o movimento Cittaslow (slow cities, em inglês), iniciado em Itália há mais de 20 anos, acreditam que desacelerar pode ser o caminho para oferecerem uma vida melhor a quem ali fixou raízes ou está de visita.
Corpo do artigo
O conceito surgiu inspirado pelo slow food, mas depressa se estendeu da alimentação a outros setores, procurando reduzir o frenesim e o stress e cultivando um modo alternativo de estar nas zonas urbanas. A rede internacional Cittaslow identificou mesmo um conjunto de requisitos, em sete áreas, que as cidades têm de cumprir. Vão desde a energia e ambiente (não só ter parques e jardins, mas também investir em energias renováveis, transportes sustentáveis e tratamento de resíduos, por exemplo), às infraestruturas (mobilidade sustentável, ciclovias, mobiliário urbano), qualidade de vida (requalificação de zonas degradadas, instalação de fibra ótica, wi-fi, etc.), hospitalidade, respeito pelas tradições e natureza, coesão social e colaboração entre organizações.
Sofia Pereira, presidente do Slow Movement Portugal, explica que ser "slow não é ser demasiado lento ou preguiçoso", mas sim procurar "equilíbrio". E quem defende esta forma de estar na vida não tem de estar isolado, sozinho ou "no meio da floresta", podendo viver numa cidade.
Menos trânsito e barulho
Não é fácil, reconhece, "desacelerar" pessoas ou cidades, sobretudo numa época em que se vive uma relação "frenética" com o tempo e em que as zonas urbanas são associadas a velocidade, trânsito, ruído, aglomerados de pessoas, pressa, múltiplas tarefas, stress, ansiedade. Mas ainda assim a presidente do Slow Movement Portugal acredita que "é possível desacelerar numa grande cidade quando temos bem definido o que é importante para nós" e criar zonas urbanas com modelos alternativos.
De acordo com Sofia Pereira, as Slow Cities devem ser cidades com "menos trânsito e menos barulho". Devem ter "identidade própria" e cultivar "o sentido de ligação entre os produtos e os consumidores, entre pessoas e meio ambiente protegido, entre residentes e visitantes - que se devem sentir residentes durante a estadia".
Estas zonas urbanas, continua, devem ser "ajustadas à escala humana, com os centros históricos preservados e os edifícios novos harmonizados", com lugares de lazer e cultura, com comércio tradicional e justo, zonas pedonais, festivais que exaltem as raízes, promoção dos bairros mais antigos. Trata-se de uma cidade para todos e, para isso, "as acessibilidades têm de prever a presença de todos por igual", finaliza Sofia Pereira.
Atenuar as consequências negativas da globalização
Tavira foi uma das cidades que aderiram ao movimento internacional Cittaslow em 2008 e, desde 2018, tem a coordenação nacional. Esta é, explica a Câmara ao JN Urbano, uma forma de manifestar a sua "preocupação com as consequências negativas da globalização". Tem por base "a adoção de um estilo de vida saudável, o qual coincide com a classificação da dieta mediterrânica como Património Cultural e Imaterial da Humanidade da UNESCO".
Para alcançar esses propósitos, Tavira tem apostado em festivais de gastronomia, mostras de artesanato e de tradições e no Plano de Promoção da Atividade Física, que fomenta a prática desportiva em todas as faixas etárias e incentiva a adoção de um estilo de vida saudável.
Em 2013, Viana do Castelo também aderiu à rede Cittaslow, por ser um "selo de garantia". A cidade define-se como sendo "amiga" do desporto e "apaixonada pelos seus usos e costumes". Tanto que é candidata a Cidade Europeia do Desporto 2023 e avançou com a certificação do traje à vianesa e do bordado de Viana, da torta de Viana e valorização do vinho verde.
Mas Viana está também atenta ao "futuro" e a "novas soluções para garantir a qualidade do meio ambiente", realça a Câmara.
Para além do apoio ao comércio, aquisição de bicicletas elétricas, investimento numa rede de ciclovias e ecovias, destaca-se a aposta nas energias sustentáveis. A Autarquia e quatro empresas assinaram um memorando com vista à criação de uma Comunidade de Energias Renováveis na Zona Industrial de Neiva, "com o objetivo de as empresas passarem a produzir 47% da energia consumida a partir de fontes renováveis", adianta o Município.
Acessibilidades e revitalização urbana
Em São Brás de Alportel, outra cidade aderente, o enfoque tem sido dado à "defesa das tradições, hábitos e costumes locais, produtos e produtores, entre outras singularidades que respeitam a identidade são-brasense", observa a Câmara.
O Município algarvio tem, também, feito "um investimento gradual, mas constante, na defesa do meio ambiente, na promoção das acessibilidades, no respeito e valorização pela História, património material e imaterial". Os exemplos vão desde a Festa das Tochas Floridas ao espetáculo Sons de São Brás, uma viagem cultural por músicas originais são-brasenses, cuja gravação decorreu em diversos locais do concelho.
As acessibilidades e revitalização urbana são outras apostas de São Brás de Alportel, que tem "um circuito acessível de mais de 10 quilómetros dentro do núcleo urbano da vila, isenção de barreiras arquitetónicas em muitos dos espaços públicos e um conjunto de equipamentos desportivos amplamente utilizados pela população".
A compostagem doméstica, recolha porta a porta no Centro Histórico e o projeto-piloto PAYT - pague apenas o lixo que produz - são mais alguns exemplos de projetos em curso em São Brás de Alportel que atestam a preocupação com o ambiente e a qualidade de vida.