O Sindicato dos Médicos Dentistas convocou uma manifestação para esta quinta-feira, às 12 horas, em frente a Assembleia da República. Pede políticas que revertam a “desacreditação” da classe e a criação de uma carreira especial no SNS para colmatar a pobreza na profissão.
Corpo do artigo
A manifestação nacional, onde são esperados cerca de 300 profissionais, foi marcada pelos direitos de uma classe que atravessa "a maior crise laboral desde que existe em Portugal". Os profissionais queixam-se da falta de respostas e de abertura para o agendamento de negociações por parte dos governantes. “Não nos ouvem”, assevera o Sindicato dos Médicos Dentistas.
“Anteriormente ao atual ministro [Manuel Pizarro] havia reuniões regulares, com a ex-ministra da Saúde Marta Temido e mesmo António Lacerda. Não é por falta de iniciativa, enviámos vários e-mails e o nosso assessor [do sindicato] já entrou em contacto com o ministério. Responderam que está em agendamento, mas, até à data, a reunião não se materializou. É um dos motivos para esta manifestação”, declarou João Neto, presidente do Sindicato dos Médicos Dentistas, ao JN.
“O que mais me preocupa é o futuro dos estudantes de medicina dentária. Entram no curso desconhecendo a realidade que os espera e sendo que é um dos cursos mais caros do país. Muitas vezes, vê-se os pais a pagarem alojamento a filhos deslocados para terminarem um curso que nem garante perspetivas de emprego em Portugal, só para terem de emigrar para França, por exemplo”, acrescentou. A propósito, uma das reivindicações do sindicato é a redução das vagas dos cursos de medicina dentária e o impedimento da criação de mais cursos. “São cerca de 600 profissionais a emigrar todos os anos devido à crescente precariedade do sector, com profissionais a trabalharem 50 horas por semana com remunerações de 300 euros mensais”, avisa.
"É o momento de agir"
“É momento de agir e lutar pelos direitos dos médicos dentistas como legítimos e imprescindíveis profissionais de saúde”. O sindicato acrescenta que, apesar de Portugal ter o dobro dos médicos dentistas recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), tem também “um dos piores índices de saúde oral da União Europeia (UE)”. De acordo com o perfil português de saúde oral, lançado pela OMS em 2022, a percentagem de portugueses adultos com cáries não tratadas em 2019 foi 27,5% e o índice anual de incidência de cancro oral por cada 100 mil pessoas em 2020 foi 9,1% nos homens e 1,9% nas mulheres.
Nesse sentido, o sindicato pede a urgente criação de uma carreira especial de médico dentista no SNS. “São contratados precariamente ao atropelo dos seus direitos laborais. Os seus contratos de trabalho reduzem-nos a técnicos superiores administrativos que, ilegalmente, exercem funções de médicos dentistas, sem perspetivas de evolução na carreira”, refere o sindicato. “Temos colegas que estão há 20 anos como técnicos superiores, outros estão no SNS a falsos recibos verdes, contratados por empresas de trabalho temporário. Não existem médicos dentistas de carreira no SNS”, explicou João Neto.
“É incompreensível, porque não há falta de médicos dentistas em Portugal e são reconhecidas, nacional e internacionalmente, as suas elevadas competências técnicas. A explicação reside no facto de que, até aos dias de hoje, nem o poder político nem a Comunicação Social conhecerem verdadeiramente a real situação da medicina dentária no nosso país”, aponta o sindicato. Adicionalmente, o rácio de 650 habitantes por cada médico dentista previsto para 2025 em Portugal é “manifestamente exagerado e nefasto”.
Reformulação do cheque-dentista
O sindicato da classe exige, também, a reformulação do cheque-dentista, anteriormente de 40 euros e, após o período da Troika em Portugal, reduzido a 35 euros, o valor atual. “Há muitas situações em que o utente que usa o cheque-dentista tem, por exemplo, sete ou oito dentes para tratar e fá-lo pelo valor de 35 euros. Ou seja, é o próprio Estado a explorar a classe de médicos dentistas!”, exclamou o presidente do sindicato. “Os cheques-dentista deveriam ser atribuídos em número equivalente aos tratamentos necessários por cada paciente, porventura com os limites que o Governo considere”, recomendou João Neto.
Para além disso, o sindicato pede a regulamentação dos planos de saúde, que considera “um abuso para com o profissional de saúde”. “As empresas que os gerem exploram os médicos dentistas, impondo tabelas de preços ridiculamente baixas com contratos onde os obrigam a realizarem tratamentos gratuitos (totalmente sem qualquer remuneração por parte das empresas detentoras dos planos)”, justifica o sindicato. João Neto disse, ao JN, que considera esta matéria “de grande importância”.
Outra reivindicação da classe é a alteração da legislação da publicidade em Saúde, devido ao aumento de publicidade enganosa que desacredita os médicos dentistas e promete “tratamentos milagrosos” aos portugueses, que, posteriormente, têm de ser corrigidos pelos profissionais. “Há uma selvajaria de publicidade enganosa que os leva [os doentes] a fazer tratamentos desnecessários que, muitas vezes, nem são promovidos por dentistas. São induzidos a fazer procedimentos que, amiúde, levam a situações muito graves e evitáveis. A lei sobre a publicidade em Saúde está desatualizada”, rematou o presidente do sindicato dos dentistas.