Situação de seca potencia severidade de incêndios. Área ardida nos primeiros 44 dias do ano é a maior em 22 anos. Número de ocorrências (1400) empenhou quase 14 mil operacionais.
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Nos primeiros 44 dias de 2022, 1400 incêndios rurais percorreram 5564 hectares - a maior área ardida em 22 anos e superior ao total dos cinco anos anteriores no mesmo período -, sendo o terceiro em número de ocorrências desde 2001, de acordo com dados obtidos pelo JN junto do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), entre 1 de janeiro e o passado dia 13, confirmando-se o aumento das deflagrações e da severidade dos sinistros associadas a secas.
No ano passado, já tinham ardido 2073 hectares no mesmo período, aliás, com fogos de elevado poder destrutivo: o número de ocorrências foi bastante inferior - 213, o que dá uma média de 9,73 hectares ardidos por incêndio.
Os distritos de Viana do Castelo, com 1386 hectares percorridos até ao passado domingo, Braga (1185) e Vila Real (1145), os três com um histórico de grandes áreas ardidas, foram os mais atingidos. Foram também os que mais ocorrências registaram - 198, 247 e 221, respetivamente.
Segundo números obtidos pelo JN junto da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), no mesmo período foram empenhados 13 914 operacionais, 4076 meios terrestres e realizadas 203 missões com meios aéreos. Vila Real foi o que mais combatentes empregou (2349), seguindo-se Braga (2010) e Viana do Castelo (1848).
Janeiro seco há seis anos
Janeiro foi particularmente severo, com a maior área ardida desde 2001, com 4607 hectares, secundado pelo mesmo mês do ano passado (2073), o que é inseparável das situações de seca que têm atingido o país.
O primeiro mês do ano foi o sexto janeiro consecutivo com quantidades de precipitação abaixo das médias e o sexto mais seco desde 1931, com um valor médio de precipitação de 13,9 milímetros, correspondente a apenas 12% do valor normal no período 1971-2000.
Os primeiros 13 dias de fevereiro também registaram números anormais de fogos (672), só superados, no mesmo período, em 2005 (1135) e em 2012 (1070). Foi o segundo em área ardida (957 ha), depois do de 2012 (1650 ha).
"Estão criadas as condições para que grandes incêndios sejam mais frequentes e mais destrutivos" e para que as "épocas de fogos", que estão a prolongar-se para o outono, sejam antecipadas, comenta o geógrafo José Bento Gonçalves.
"A maior parte dos estudos aponta no sentido da diminuição da precipitação em fevereiro e também em março", nota, considerando a situação "muito preocupante". Com solos muito secos, as plantas atingem "elevados níveis de inflamabilidade", salienta o especialista em incêndios, degradação dos solos e riscos naturais da Universidade do Minho.
Cultura do fogo enraizada
"Qualquer faúlha" propaga os fogos. "Temos as taxas de ignição absurdas - das maiores do mundo", nota Bento Gonçalves, porque o uso do fogo - para a queima de sobrantes agrícolas e rejuvenescimento de pastos nos montes - "é uma ferramenta enraizada na cultura mediterrânica".
Isso explica por que a ANEPC interditou, entre 30 de janeiro e o final do 1 de fevereiro, a realização de ações de fogo controlado, de queima de amontoados e de fogueiras nos espaços rurais, invocando a situação meteorológica, associada à ausência prolongada de precipitação e à previsão do aumento da intensidade do vento.
Restrições de uso da água recuperam albufeiras
As restrições impostas no início do mês ao uso de seis barragens para produção de eletricidade e rega "estão a revelar-se eficazes", disse o ministro do Ambiente, Matos Fernandes. As albufeiras de Aguieira (Mondego) e Touvedo (Lima) saíram da "situação crítica" e "têm mais de 70% de água". Em termos globais, "todas estão a recuperar". Na de Castelo de Bode (Tejo), o nível é "estável".