Há mais de mil militares em missões e muitos passam quadra natalícia longe da família
Forças Armadas e GNR integram contingentes na União Europeia, ONU e NATO, para garantir segurança ou dar formação.
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Entre Forças Armadas e GNR, são quase 1200 os militares portugueses destacados em missões por vários pontos do globo. Muitos vão passar a quadra natalícia nos países onde estão colocados, longe das famílias, uma contingência que se repete para alguns e é inerente à vida militar.
Do conjunto do Exército, Armada e Força Aérea, estão empenhados 1132 operacionais em 28 missões da União Europeia (UE), NATO e ONU e, ainda, em missões bilaterais e multilaterais, na área da segurança de países amigos. As Forças Armadas estão presentes em países como a República Centro-Africana, Moçambique, Mali, Somália e Afeganistão, entre outros.
GNR na política externa
A GNR tem um total de 55 militares deslocados em várias missões de gestão de crises e capacitação da UE e da ONU, além de estar presente ainda noutros cenários internacionais. Como sucede, por exemplo, no âmbito da agência Frontex, em que a Guarda integra seis missões, tendo 22 profissionais empenhados.
Ao JN, o Comando-Geral sublinha que "a presença de militares da GNR em missões e cargos internacionais vem assumindo uma crescente relevância, contribuindo para a política externa nacional e garantindo, em simultâneo, uma melhor coordenação das atividades operacionais".
"Numa era em que os fenómenos criminais, sociais, políticos, económicos ou de outra natureza são cada vez mais iminentes, impõe-se a união de esforços, cada vez mais fundamentais para antecipar, prevenir ou responder de forma eficiente aos desafios securitários emergentes e transversais", explica a GNR, salientando que "a estreita ligação interinstitucional, potenciada por canais privilegiados de comunicação, facilita a cooperação aos diversos níveis e permite melhorar os resultados alcançados, tanto ao nível nacional como internacional, rentabilizando os recursos e aumentando a eficiência da Guarda".
Em Moçambique estão 59
No documento que "reflete o empenhamento das Forças Nacionais Destacadas aprovado para 2021", o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, almirante Silva Ribeiro, destaca que as missões no estrangeiro servem para "afirmar o país como coprodutor de segurança internacional". "É uma nobre e exigente missão, que requer uma articulação ativa e permanente com a tutela política e uma coordenação intensa com a Marinha, o Exército e a Força Aérea", realça.
A missão de treino e capacitação de tropas locais em Moçambique é a mais recente, tendo sido projetados 56 militares das Forças Armadas e três da GNR para este país africano (ler reportagem). O brigadeiro-general do Exército Nuno Lemos Pires, que comanda a força no terreno, faz "um balanço bastante positivo" da missão, que arrancou em outubro, e adianta, ao JN, que "tudo está a decorrer exatamente como planeado, com uma enorme coordenação entre a União Europeia e Moçambique".
"A nossa missão prepara as forças de Moçambique para serem elas, sozinhas, a tomar conta do futuro do país. Preparamos as forças para atuarem especialmente em Cabo Delgado, e tentamos dar-lhes o melhor treino e equipamento possível, para que possam proteger as populações", diz Lemos Pires, lembrando que a missão da UE contribui ainda para que "haja projetos integrados", assegurando que, "ao mesmo tempo que dá melhores garantias de segurança, também aumenta o nível de desenvolvimento, com apoio económico, escolar, sanitário e ajuda humanitária, o que é uma mais-valia".
Missões de risco
RCA
Tanto as Forças Armadas (FA) como a GNR estão presentes em missões na República Centro-Africana (RCA). A Guarda tem cinco elementos empenhados neste país, e as FA participam em três missões - no âmbito da EU, da ONU e de um grupo de apoio nacional -, num total de 258 militares.
Afeganistão
As FA têm neste país 175 militares, no âmbito de uma missão da NATO. O objetivo é "contribuir para o treino e aconselhamento às forças armadas afegãs", ajudando no "estabelecimento de um clima de segurança sustentável".
"Vamos viver o Natal com a família militar"
Sem festas alargadas, por causa da covid, mas as tropas terão a sua ceia. E a Internet promete atenuar distâncias.
O último Natal que o brigadeiro-general Lemos Pires tinha passado longe de casa fora vivido no Afeganistão, há nove anos, e a experiência ficou registada nas páginas do livro "Cartas de Cabul", em que o militar narra um episódio que lhe ficou "muito marcado". "Nunca mais vou esquecer: o "mullah" [líder religioso] da mesquita local veio ter connosco e disse: "Eu sei que hoje é véspera de Natal e que vocês gostavam muito de estar com as vossas famílias, mas não podem, e gostava muito que viessem rezar connosco à mesquita". Entrámos na mesquita, sentámo-nos e fomos reconhecidos como cristãos dentro do mundo muçulmano. Naquele dia, também se comemorava um outro evento do calendário islâmico, e, naquele momento, o próprio mullah agradeceu e enalteceu o facto de estarmos ali juntos, apesar de diferentes religiões, a celebrar o bem comum. Aquilo encheu-nos a alma", recorda o militar de 56 anos, que agora volta a passar a quadra afastado da família.
"Embora custe muito passar o Natal fora de casa, dentro da família militar juntamo-nos e fazemos o melhor possível. E estas novas ferramentas [de comunicação] já ajudam muito. Só não dão um abracinho", brinca o oficial-general do Exército. Também nascido no seio de uma família de militares, o major da GNR Carlos Covelo, que está a assessorar o comandante da força na área do contraterrorismo, encara com naturalidade a passagem da quadra em missão. "São ossos do ofício", define o militar de 36 anos, para quem uma videochamada há de encurtar a distância que o separa dos dois filhos pequenos, de três e seis anos.
Presentes abertos pela net
"Apesar de não estar presente, eles gostam sempre de ver que o pai está a vê-los a abrir os presentes. São momentos marcantes, e tenta-se, na medida do possível, marcar presença", diz Carlos Covelo, que se prepara para cumprir o terceiro Natal longe de casa - a primeira vez foi há 12 anos, em Timor Leste, e a segunda há três, quando esteve na Mauritânia.
"O sentimento de segurança que temos aqui, a mais-valia de estarmos a fazer uma missão que nos enche de orgulho e que as nossas famílias acompanham com grande carinho a partir de casa, dá-nos uma grande proximidade. Não só sentimos que estamos seguros, como estamos a fazer algo extremamente útil para o povo moçambicano, e isso dá-nos muito alento", assegura o brigadeiro-general Lemos Pires, referindo que entre os militares destacados "há espírito de missão, moral elevada e muito orgulho" no trabalho que está a ser desenvolvido.
O Natal, esse, será o possível. "Por causa da covid, não podemos fazer festas alargadas, nem grandes encontros, mas não vamos deixar de fazer uma ceia de Natal em que uns se poderão sentar com outros, não deixaremos de ter momentos em que poderemos comunicar com a família através de WhatsApp ou outras plataformas, e não deixaremos de ter momentos para aqueles que querem assistir à missa do Galo e estar presentes nas cerimónias religiosas", antecipa o oficial-general. "Vamos viver o Natal da melhor forma possível, com a família militar".