Nos hospitais das regiões Centro e Lisboa e Vale do Tejo há cada vez mais relatos de rutura. Todos os dias abrem-se camas para doentes covid, todos os dias ficam lotadas.
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As urgências entopem com dezenas de doentes à espera de vaga nos internamentos. Nos cuidados intensivos sobra uma vaga aqui outra ali, muito pouco para dar resposta a uma terceira vaga que assumiu a dimensão de um "tsunami".
A expressão é de Artur Vaz, presidente do Hospital Beatriz Ângelo (Loures), que retrata um cenário dramático. À SIC, o gestor hospitalar falou da angústia de ver profissionais exaustos e da impotência para fazer face à procura crescente. Com 232 doentes covid internados, o hospital está a rebentar pelas costuras. Nos cuidados intensivos só há vagas quando há mortes ou quando são dadas altas - e são menos 50% do que numa situação normal porque o doente covid leva mais tempo a recuperar. "Esta terceira vaga não é uma onda. É um tsunami que está a varrer tudo à sua passagem", diz Artur Vaz.
Na maior parte dos hospitais contactados pelo JN, a pressão sobre as urgências está muito abaixo dos anos anteriores nesta época de inverno. Alguns serviços nem metade dos doentes estão a receber. O problema é que boa parte destes episódios - entre 20% e 50%, dependendo da unidade - são de suspeitos ou doentes covid, o que implica respostas em circuitos diferentes e logo mais equipas. Por outro lado, são doentes mais graves e com taxas de internamento superiores.
Alexandre Valentim Lourenço, presidente da Secção Regional do Sul da Ordem dos Médicos, garante que "já foram ultrapassados todos os limites". Há serviços não-covid a fechar todos os dias para dar espaço ao covid, o que representa um forte condicionamento do acesso aos cuidados para quem não está infetado. "Temos 200 mortos covid por dia, mas devemos ter o mesmo número de óbitos não-covid a mais por dia", realça.
40 doentes para internar
No Centro, o Serviço de Urgência do Hospital dos Covões, que integra o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC), está "em completa rutura", denuncia a Ordem dos Enfermeiros (OE). "Já foram abertos todos os espaços disponíveis. Atingiu-se o limite ao nível da estrutura física", afirmou Ricardo Correia de Matos, presidente da OE/Centro. Os doentes positivos e os suspeitos de covid-19 que aguardam o resultado do teste não estão separados, o que é "inadmissível" porque promove a transmissão da doença.
Também o presidente da Ordem dos Médicos/Centro tem recebido relatos de desespero de colegas que não conseguem tratar todos os doentes. No CHUC, "tenho colegas que quando chegam à Urgência no turno da manhã têm 40 doentes para internar. Para isto é preciso mais do que um serviço inteiro", explica.
Apesar do tom vermelho que cobre o mapa em termos de incidência da infeção, a pressão sobre o internamento hospitalar não é igual em todo o país. O Norte ainda tem alguma folga de camas, de acordo com a informação recolhida pelo JN, de Penafiel a Matosinhos, passando pelo S. João, Gaia e Santo António. Mas face ao número crescente de infeções, teme-se uma avalancha de doentes nos próximos dias.
Ajuda
Luxemburgo disposto a receber pacientes
Se o Governo português pedir, o Luxemburgo está disposto a receber pacientes com covid-19 vindos de Portugal. A garantia foi dada pela ministra da Saúde, Paulette Lenert, em resposta a uma questão dos deputados Sven Clement e Marc Goergen, do Partido Pirata. Tendo em conta a situação sanitária difícil que se vive em Portugal e o facto de o Luxemburgo estar a atravessar uma fase menos tensa, os deputados queriam saber se o Governo de Xavier Bettel tenciona propor o acolhimento de pacientes oriundos de Portugal. Na missiva, os parlamentares faziam também referência à comunidade lusa radicada no Grão-Ducado, a maior do país.
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5493 doentes internados nos hospitais (mais 202 do que no dia anterior), dos quais 681 (mais 11) em cuidados intensivos, indica o último boletim da DGS.
50% dos cerca de 300 doentes que chegam todos os dias à urgência do Hospital de Santa Maria (Lisboa) têm covid ou são suspeitos.
264 doentes covid estavam na quarta-feira internados no Centro Hospitalar Lisboa Central (inclui S. José). A lotação máxima são 281 camas, mas em UCI já não havia vagas.
Garcia de Orta mantém lotação esgotada
Com 181 doentes internados, o Hospital Garcia de Orta, em Almada, tinha ontem todas as camas covid-19 ocupadas. A unidade aumentou em mais de 250% o plano de contingência definido para esta época do ano.
Santa Maria abriu 100 camas: sobram 30%
No Hospital de Santa Maria (Centro Hospitalar Lisboa Norte), o maior do país, foram criadas 100 camas para doentes covid-19 em duas semanas. Ontem sobravam menos de 30 vagas. Nos cuidados intensivos estavam ocupadas 48 das 52 camas, mas há margem para abrir mais seis.
Castelo Branco aciona nível de catástrofe
O Hospital Amato Lusitano (HAL), de Castelo Branco, acionou ontem o nível de catástrofe na medicina intensiva, depois de, no espaço de duas horas, ter ficado apenas com uma vaga nos cuidados intensivos.
Falta de enfermeiros adia abertura de ala
A escassez de enfermeiros - 95 estão infetados e 52 estão em isolamento profilático por terem tido contactos de risco -, está a obrigar o Centro Hospitalar do Oeste (CHO) a adiar a abertura de uma nova ala de internamento para outras doenças no hospital de Peniche, referiu ontem a administradora.