Com urgências e enfermarias pressionadas, serviços hospitalares reorganiza-se para dar resposta ao aumento da procura. País com mais de 30 mil novas infeções diárias.
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Serviços de urgência em máximos, enfermarias dedicadas a doentes covid cheias, profissionais de saúde infetados. No pico de produção para recuperar atividade, os hospitais reorganizam-se para dar resposta ao aumento da procura. Pede-se o regresso da gratuitidade de testes nas farmácias e o reforço da linha SNS24. Anteontem, registaram-se 30 274 casos e 27 óbitos. A taxa de positividade ronda os 47%.
Nos próximos dias, o Hospital de S. João, no Porto, decide se interrompe em 20% a atividade programada. O centro hospitalar alargou uma enfermaria para acomodar os 80 internados com covid e aumentou a área de atendimento das Urgências, onde continuam a chegar doentes referenciados não urgentes. Profissionais de saúde infetados com SARS-CoV-2 contam-se 200. Na mesma cidade, o Hospital de Santo António abriu uma nova unidade, tendo nove vagas em enfermaria covid e uma na Unidade de Cuidados Intensivos (UCI). Ontem, tinham 10 doentes em UCI, 71 em enfermaria e cerca de 50 profissionais infetados.
Cenário que se repete em vários hospitais da região. Na segunda-feira, revela a ARS Norte, contavam-se 600 doentes em enfermarias e 44 em UCI. O Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho registava uma "taxa de ocupação de 100% em UCI (10 camas) e em internamento (52 camas). A manter-se este ritmo, prepara-se "para poder abrir mais uma ala de internamento dedicada à covid". As urgências estão acima dos níveis pré-covid: média nos últimos sete dias de 621 admissões diárias, contra cerca de 530 em 2019.
O Hospital de Braga confirma um aumento da pressão, "quer pelo aumento de doentes covid e não covid, quer pela dificuldade no encaminhamento de doentes para a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados e para os Lares Residenciais". Fatores que explicam uma "taxa de internamento superior a 85%. Em enfermaria estão 42 doentes com covid e em Intensivos dois. As Urgências registaram um máximo a 28 de março, com 736 atendimentos, frisando o hospital que de janeiro a abril deste ano "47% dos atendimentos eram relativos a utentes com pulseira azul ou verde".
No Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, a taxa de ocupação em enfermarias covid está nos 90% (nível 4, de 5, do plano de contingência) e em UCI nos 75% (nível 2). Na terça-feira acorreram à Urgência 523 doentes, 36% "de triagem cor verde e azul, o que está a impactar muito a prestação". Afluência que se faz sentir também no Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa: 67 doentes em enfermaria e dois em UCI.
LVT reforça camas
Se o Norte responde por 40% dos novos casos, Lisboa e Vale do Tejo está já nos 30% e os hospitais da região acusam também a pressão desta sexta onda. Fonte oficial do Centro Hospitalar Lisboa Central avança ao JN ter sido ontem ativado um plano que prevê a abertura, a partir de hoje, de "mais 18 camas", para ter, "para já", 113 camas covid - estão internados, atualmente, 95 doentes. As três urgências (São José, D. Estefânia e MAC) registaram mais de 800 atendimentos na segunda-feira.
No Santa Maria, o mesmo cenário, com recorde de admissões nas urgências (adultos, pediatria e ginecologia) na segunda-feira - 800, o valor mais alto desde o início da pandemia, a maioria não covid e "muitos doentes com pulseira amarela e laranja". Os internamentos covid estão "relativamente estáveis, mas com tendência a aumentar". Ontem, o Centro Hospitalar Lisboa Norte contava ultrapassar as 40 camas . O que "levanta desafios de organização de serviços, mas não compromete a atividade". Em termos de profissionais infetados, contam agora uma média de nove/dia, contra 4/5 na semana passada.
"Os hospitais estão em níveis recorde de produção. As camas já estão sobreutilizadas porque há mais cirurgias e internamentos. Há muitos profissionais infetados. Em cima disto um aumento de casos de covid. É a tempestade perfeita", resume o médico Xavier Barreto, da Associação de Administradores Hospitalares. "Precisamos de respostas alternativas ao Serviço de Urgência: a reposição dos testes gratuitos nas farmácias e o reforço do SNS24".
SNS
Coordenar e distribuir casos para não limitar atividade programada
Desde o início da pandemia, lembra o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, que se pede "uma coordenação das várias estruturas hospitalares, que não existe como um todo". Um trabalho em rede, explica Alexandre Lourenço, "essencial para distribuição de casos por todas as instituições para não limitar a atividade programada". Uma "resposta em rede que nunca veio a ser implementada", lamenta. Numa leitura geral da atual situação, o pneumologista Filipe Froes fala numa conjugação de vários fatores: "A circulação da nova linhagem BA.5, mais transmissível e com a particularidade de evadir mais facilmente a imunidade (ler ao lado). O aliviar de medidas, nomeadamente o uso de máscara". Sem que, frisa o clínico, tivessem sido criadas "alternativas para compensar esta nova situação, nomeadamente o acesso a novos fármacos e anticorpos monoclonais".
Reações
Sem novas medidas
A ministra da Saúde admitiu que a evolução da pandemia venha a condicionar a atividade hospitalar programada e recusou, para já, o regresso de testes gratuitos nas farmácias e do uso obrigatório de máscaras. O Sindicato Independente dos Médicos exige que o Governo acautele, além dos grupos vulneráveis, a vacinação dos profissionais de saúde, perante "o pandemónio instalado nos serviços".
Farmácias disponíveis
Após uma quebra de 60% aquando do fim da comparticipação, as farmácias registaram, na segunda-feira, um pico de procura, com 15 mil testes. Quando eram gratuitos, a média andava nos 25/30 mil. A Associação Nacional de Farmácias manifesta total disponibilidade para voltar a realizar testes.
À lupa
30 274
Na passada terça-feira contabilizaram-se 30 274 casos diários de infeção por SARS-CoV-2 e 27 óbitos.
63,6%
A linhagem BA.5 da variante ómicron é já dominante, com uma frequência relativa de 63,6% a 15 de maio.