Desesperados, frustrados e “tratados como lixo” é como se sentem os imigrantes que tentam conseguir uma marcação na Agência para a Integração, Migrações e Asilo para renovar o título de residência. À porta das instalações no Porto houve quem se juntasse para protestar contra o caos que tem sido o processo.
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Era suposto ter sido uma manifestação de imigrantes à porta da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) no Porto, mas a adesão à causa foi escassa. Ainda assim, houve quem, esta quarta-feira, se deslocasse para mostrar o seu descontentamento e fazer um retrato do desespero que tantos outros sentem.
Em causa estão as condições de atendimento da AIMA e os pedidos de ajuda de vários imigrantes que podem vir a ficar ilegais no país, colocando em risco a sua liberdade. Sem trabalho e sem poder voltar para casa, muitos veem o seu título de residência caducado e após milhares de chamadas e centenas de e-mails enviados, continuam sem conseguir uma marcação.
José Carlos Sousa tem 56 anos e há cinco anos decidiu vir com a mulher e os filhos para Portugal. Casados há mais de 20 anos, no Brasil viviam no Rio de Janeiro, mas a violência do seu país fez com que quisessem sair. José Carlos tem dupla nacionalidade, uma vez que grande parte da sua família é do arquipélago dos Açores, mas o título de residência da mulher brasileira, Gerlane Silva, de 49 anos, vai caducar em abril.
“A ausência de documentação para a minha esposa está vencendo agora em abril e desde janeiro que a gente liga sem parar para a AIMA, o que não funciona, como o serviço de agendamento por email também não funciona”, disse, frustrado com a situação que não parece ficar resolvida tão cedo.
Este ano conseguiram agendar uma marcação no Instituto dos Registos e do Notariado da Póvoa de Varzim, sendo que o casal vive em Vila do Conde, mas alegaram que o assunto teria de ser tratado diretamente com a AIMA, por ser casada com um português. Já na AIMA de Braga foram “tratados como lixo”.
Estão dispostos a ir a qualquer estabelecimento do país, mas não há marcações disponíveis para os próximos 120 dias. José Carlos, apesar de adorar viver em Portugal, acredita que o país não reúne condições para as pessoas viverem legais, e se houver problema com a mulher, vão embora.
No banco, Gerlane Silva, sem documentos, não consegue mexer na sua conta, ficando, por isso, dependente do marido, algo que nenhum dos dois quer. Já recebeu chamadas do médico de família e mudou os cartões associados ao pagamento do ginásio, por exemplo, o que lhe retira toda a sua autonomia.
De quarto em quarto, o máximo que aguentou foram 3 meses
José Carlos Sousa “não precisa de Portugal”, mas há outros imigrantes que necessitam. Nem todos têm condições financeiras estáveis, como Guilherme Mayerhofer. Veio do Rio de Janeiro para Portugal e desde então anda de quarto em quarto. Com 44 anos, o período máximo que conseguiu ficar num quarto foram três meses. Agora está em Braga, mas vem todos os dias trabalhar para o Porto. Queria arranjar um lugar apenas para si, mas os “T0 atualmente custam o mesmo que um quarto”.
Numa loja a vender camisas, os empregadores pediram-lhe documentos. “Quem trabalha em restauração já está habituado a esse pacote de documentos”, mencionou, em tom de brincadeira, mas revelando o desespero que tem sentido nos últimos meses.
Equivalência e residência são os problemas de Guilherme neste momento. Confessou que quase foi preso há cerca de três semanas numa operação STOP, porque faltavam três dias para o seu título de residência caducar, e ainda há quem não reconheça os alargamentos dos prazos.
Ficando ilegal pode ter complicações a nível de trabalho e fica impossibilitado de viajar. A maioria dos locais onde trabalhou contratou-o e, ao fim de um mês, arranjaram um motivo para o despedir e não lhe pagaram o salário.
Aos ouvidos de Guilherme já chegou a informação de que existem máfias que cobram dinheiro para conseguir um agendamento, mas admitiu que ainda não chegou a essa fase.
Antes da hora da manifestação foi lançada uma petição, que conta já com cerca de 500 assinaturas, exigindo a instauração de uma coordenação entre várias entidades portuguesas para que se criem procedimentos únicos para todos os imigrantes.