Centenas de detenções por dia e rusgas em busca de pessoas sem documentos estão a deixar a comunidade imigrante na Califórnia em alerta, com várias associações a organizarem redes de resposta rápida e linhas de apoio no estado.
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“Há muito receio na comunidade. Ainda não há pânico”, disse à agência Lusa Jorge-Mario Cabrera, diretor de comunicação da CHIRLA - Coalition for Humane Immigrant Rights, uma associação que dá assistência humanitária a imigrantes em Los Angeles. “A comunidade não tem a opção de não ir trabalhar, de não pagar as contas, de não levar os filhos à escola”, salientou, referindo que as pessoas “estão em alerta” mas não podem simplesmente desaparecer por medo de rusgas.
A CHIRLA montou a Rede de Resposta Rápida em Los Angeles para monitorizar as rusgas da agência federal ICE, que controla o serviço de imigração e alfândegas e que tem estado a deter cerca de mil pessoas por dia desde que Donald Trump regressou à Casa Branca (presidência norte-americana).
Há uma linha para onde se pode ligar a informar sobre as rusgas e materiais impressos e digitais a informar os imigrantes dos seus direitos. “Fizemos materiais educativos porque queremos dar poder às pessoas, não pânico”, sublinhou Cabrera.
A associação, que também fornece advogados e serviços legais, aconselha os imigrantes a não dizerem nada se forem questionados por agentes ICE, a não abrir a porta de casa ou do carro se forem interpelados, a não fugir nem tentar mostrar documentos falsos, e sobretudo a não mentir aos agentes. “E pedimos que preparem um plano familiar: o que acontece se ficarem ausentes? Para onde vão os filhos?”, exemplificou Cabrera.
O responsável indicou que muitos imigrantes indocumentados estão na expectativa para ver o que acontece, porque achavam que Trump só iria atrás daqueles com registo criminal e pensavam que estavam seguros. “Mas com base no que estamos a ver agora, todos estão em risco”, afirmou Cabrera.
A agência ICE está a fazer rusgas em locais de trabalho e até a tentar entrar em escolas. “Não sei o que vai acontecer, mas já há uma disrupção, uma mão pesada e cruel que é vingativa sem motivo algum. Não há razão para isto, não somos uma ameaça à nação”, considerou Jorge-Mario Cabrera.
"Um ataque do governo contra os imigrante"
Através do CHIRLA Action Fund, uma organização afiliada, os ativistas estão a trabalhar com legisladores e governos locais para resistir às novas políticas da administração Trump, que ameaçam desestabilizar a economia do estado, já que os imigrantes são uma força laboral importante em vários setores. “A Califórnia é um farol de esperança no meio de toda esta escuridão”, considerou o representante.
Na ACLU (American Civil Liberties Union) do sul da Califórnia, a advogada Eva Bitrán está a trabalhar para mitigar os efeitos do que chama “um ataque do governo inteiro contra os imigrantes” nos Estados Unidos.
Um dos objetivos é impedir que o dinheiro dos impostos no estado seja usado para auxiliar o aparato de fiscalização de imigrantes e o plano de deportações em massa.
“Estamos a ver nas rusgas que acontecem na Califórnia uma pressão extrema para que as pessoas aceitem repatriamento voluntário, em vez de enfrentarem um longo período de detenção”, revelou Bitrán. Por isso, a ACLU aconselha os imigrantes a terem um plano, a saberem a quem telefonar e como vão resistir à pressão. “Ao mesmo tempo, não podemos viver com medo. As pessoas têm de ir trabalhar e à escola”, frisou.
Bitrán disse que estas ordens executivas e ações de Trump não surpreenderam a ACLU, mas há algumas diferenças em relação ao primeiro mandato do republicano (2017-2021). A advogada salientou que está tudo a acontecer muito mais rapidamente e isso denota maior preparação por parte da administração. “Também estão a ter menos resistência e sentem-se com mais poder, sentem que têm um mandato mais forte”, considerou.
As estimativas apontam para a presença de 11 milhões de imigrantes indocumentados nos Estados Unidos, com a maior fatia na Califórnia: 1,8 milhões. Ainda assim, é uma redução significativa em relação a 2007, quando eram 2,8 milhões, segundo dados do Pew Research Center.