Grandes fogos são responsáveis por cerca de 81% do total da área ardida até ao final de julho.
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O incêndio que há oito dias lavra na serra da Estrela, consumindo mais de 17 mil hectares, é a maior ocorrência deste ano e a terceira numa década, contribuindo para agravar a área ardida no país, que em 12 dias aumentou em mais de 20 500 hectares (ha).
Às 21 horas de ontem, as estimativas do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) apontavam 78 937 ha percorridos por 8305 incêndios, contra os 58 354 ha (7 517 fogos) até 31 de julho. Em sete meses, é já a quarta maior área destruída por grandes incêndios, comparada com os valores anuais desde 2013.
Parque martirizado
A ocorrência de Garrocho, na Covilhã, iniciada na madrugada de sábado, com 17 179 ha já percorridos [ler texto ao lado], atingiu o coração do Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE). "Estamos a perder, de forma incomensurável, um conjunto de habitats naturais", reconheceu o secretário de Estado da Conservação da Natureza e das Florestas, João Paulo Catarino.
Há quem fale já em 20% da área protegida, que volta a ser martirizada. Em 2017, arderam 19 337 ha, ou seja, 21,7% dos 89 132 ha de superfície do PNSE, e em 2005 foram queimados mais de 11 mil hectares.
"Quando terminar, poderemos estudar (a ocorrência), e merece ser estudada em pormenor, o que foi acontecendo ao longo da fita do tempo e que poderia ter acontecido de uma forma diferente, ou não, para evitar que o incêndio ganhasse esta escala", disse o primeiro-ministro, António Costa.
Joaquim Sande Silva, da Escola Superior Agrária de Coimbra, propõe uma comissão técnica independente idêntica à criada pela Assembleia da República após os grandes incêndios de 2017 e lamenta a extinção do Observatório Técnico Independente. "Não existe nenhuma entidade independente capaz", disse à Lusa.
Analisando-se os relatórios do ICNF desde 2013, a área já ardida na serra da Estrela está nos três maiores incêndios, sendo superada pelos 21 910 ha atribuídos ao fogo de 8 de agosto de 2016 em Janarde, Arouca, e pelos 43 191 no que deflagrou em 15 de outubro de 2017 em Sandomil, Seia.
Foi um ano particularmente destrutivo. Entre 1 de janeiro e 31 de outubro, arderam 442 418 ha, 93% (412 781 ha) dos quais se deveram a 214 grandes incêndios (áreas iguais ou superiores a 100 ha). Bastou um dia - 15 de outubro - e apenas 32 grandes fogos para arderem 202 156 ha, isto é, 45,7% do total.
mais de 20 grandes fogos
Em 2013, 195 grandes fogos queimaram 115 790 ha (82% do total). Segue-se o ano de 2016: 194 grandes fogos destruíram 138 885 ha (87% do total). Em 2020, arderam 55 218 ha em 65 grandes fogos.
Nesta altura, é previsível que 2022 vá superar o sétimo lugar em maior número de grandes ocorrências (57 até 31 de julho) e a quarta maior área ardida a elas devida, com 47 355 ha, ou seja, 81% dos 58 354 registados - a maior no histórico do decénio no período homólogo.
Dos 20 maiores incêndios registados até ao final de julho, 19 ocorreram nesse mês, tendo o maior, declarado no dia 17 em Murça, distrito de Vila Real, atingido 7058 ha.
António Costa elogia desempenho dos Canadair e promete dois em 2024
O primeiro-ministro, António Costa, considerou ontem que os aviões Canadair são os mais adequados ao combate a incêndios rurais. O seu fabrico tinha sido interrompido pela Bombardier e a encomenda, no âmbito da aquisição conjunta europeia, só deverá ser entregue em 2024, estando Portugal inscrito para adquirir dois aparelhos. "Toda a gente sabe que o Canadair é o meio aéreo de asa fixa, ou seja, para além dos helicópteros, mais eficaz." Dotados de "grande manobrabilidade", explicou, os aviões "adaptam-se bem" às albufeiras do país. Outro aparelho já experimentado - o russo Beriev - "tinha sempre dificuldades e até houve um que chegou a ter um acidente, precisamente porque, ao levantar voo, chocou contra as árvores".