Calor aumenta e pode levar a temperaturas de 40 graus no fim de semana do S. João
O início de verão no hemisfério Norte começou com os primeiros 11 dias de junho a registar uma temperatura média global sem precedentes, depois de maio ter sido apenas 0,1ºC mais fresco que o recorde para esse período, revelou, ontem, o Serviço de Alterações Climáticas do Programa Copérnico (C3S). É a primeira vez que em junho as temperaturas globais diárias do ar ultrapassaram o limite de 1,5ºC acima da média da época pré-industrial, numa altura em que se inicia um novo ciclo do fenómeno meteorológico El Niño, que faz subir os termómetros.
Corpo do artigo
A primeira semana deste mês de junho foi a mais quente em todo o Mundo alguma vez já registada, com uma temperatura média diária a atingir recorde por uma "margem substancial", sublinhou o Copérnico. De acordo com o serviço europeu, o limite de 1,5.º C foi ultrapassado em dezembro de 2015 e, posteriormente, durante os primeiros meses de 2016 e de 2020, mas nunca durante o mês de junho. Nos próximos doze meses ou mais - tempo previsto do novo ciclo do El Niño - a temperatura global do ar pode vir a exceder novamente o nível pré-industrial.
Contudo, o Copérnico nota que os dados não significam que se tenha ultrapassado a barreira desejável de 1,5º C estabelecida no compromisso histórico de combate às alterações climáticas que saiu da 21.ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (COP21), em 2015, uma vez que o valor definido no Acordo de Paris refere-se a aumentos da temperatura "em médias de vinte ou trinta anos e não para breves períodos de tempo", explica o serviço europeu. Ainda assim, "cada fração de grau é importante para evitar consequências ainda mais graves da crise climática", alerta Samantha Burgess, vice-diretora do C3S, citada na nota.
São João com muito calor
Em Portugal, as temperaturas devem aumentar a partir do fim da próxima semana, na quinta-feira, dia 22, com o pico a surgir no sábado, dia 24, em que se festeja o São João. "Vamos ter agora durante o fim de semana e início da semana uma descida da temperatura. Prevê-se uma subida gradual a partir de quinta-feira até ao fim de semana de 24 e 25 de junho, com valores máximos que deverão ficar acima dos 30º C na generalidade do território.
Nas regiões do interior, como o Alentejo, a região do Vale do Tejo e Santarém, as temperaturas serão mais elevadas, acima de 35ºC", apontou, ao JN, Cristina Simões, meteorologista do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA). Para já, o IPMA não aponta para uma onda de calor, mas sim "um novo período de temperaturas elevadas", uma vez que o fenómeno acontece quando se registam temperaturas 5.ºC acima da média para a estação durante pelo menos seis dias consecutivos. "Dois ou três dias deverão ter outra vez valores elevados, situação habitual nesta altura do ano".
Francisco Rodrigues, geógrafo e climatologista da Best Weather (que analisa os modelos dos grandes institutos de previsão meteorológica internacionais), prevê que depois dos "aguaceiros e trovoadas" que ocorreram esta semana de norte a sul do país, haja um período de estabilidade atmosférica com potencial para a primeira onda de calor significativa deste verão, a partir do dia 23 ou 24 de junho. "É possível termos temperaturas altas entre os 40º e os 45.ºC no interior, e acima dos 30º C no litoral. Os valores mais gravosos apontam 10 a 15º C acima daquilo que é normal para a altura do ano. As noites serão quentes também e há a possibilidade de ocorrerem trovoadas, principalmente no interior".
Uma mudança que o previsor explica ser reflexo da "tendência clara", das últimas duas décadas, para verões cada vez mais quentes, ondas de calor mais recorrentes e de maior intensidade, mas também da "conjugação de fatores que tem a ver com o El Niño". "Estamos perante a sobreposição de um fenómeno normal, que acontece mais ou menos a cada dois, três anos no oceano pacífico e tem efeitos na atmosfera global, com a situação das alterações climáticas e do aquecimento gradual do planeta", resume Francisco Rodrigues.
Quanto à possibilidade de atravessarmos a primeira onda de calor do verão de 2023, o climatologista ressalva que "independentemente da sua duração, é provável que ocorram mais episódios de calor parecidos ao longo dos próximos meses e que, até outubro, haja uma sequência de dias muito quentes".
Os padrões observados apontam ainda para "águas mais quentes do que o normal em todo o Atlântico, com a possibilidade de serem também mais quentes na costa portuguesa" e para um "maior risco do que o normal de ciclones ou tempestades tropicais acontecerem, por exemplo, na região dos Açores, nos meses de agosto, setembro e outubro", acrescenta Francisco Rodrigues. O climatologista atenta ainda para o facto de que "à medida que o planeta irá aquecer "a barreira dos 1,5ºC será gradualmente interrompida mais vezes e quanto mais tempo se permanecer acima desse valor maior é o risco de se virem a desenvolver de fenómenos climáticos extremos, não só momentaneamente, como também no futuro".
Não será a primeira vez que Portugal terá um verão quente e um outono com fenómenos climáticos extremos: quando o El Niño ocorreu entre 1997 e 1998, a par com temperaturas muito elevadas nos oceanos e um ciclo solar intenso, "deu-se um verão quente, com episódios de trovoadas, e um outono com tempestades significativas no Algarve", lembra o climatologista. "Aquilo que estamos a prever é se siga esse padrão, acentuada pelo facto de nesses anos não termos um nível de alteração climática tão significativo como temos hoje em dia".
Pormenores
El Niño está de volta
O El Niño - um fenómeno climático natural que tem origens nas águas mornas do oceano Pacífico - apareceu pela última vez em 2018-2019 e resulta no aumento geral das temperaturas, secas acentuadas em algumas partes do planeta e chuvas intensas noutras. O sistema está de volta, depois de ter dado lugar a um episódio particularmente de quase três anos com efeitos contrários - o La Niña.
Período mais quente
Em maio, a Organização Meteorológica Mundial (OMM) alertou que o El Niño juntamente com os impactos da concentração de gases de efeito de estuda na atmosfera pode tornar o período de 2023 a 2027 o mais quente alguma vez já registado.