As recentes alterações na legislação laboral e os caminhos que continuam por trilhar no combate à precariedade vão estar, na terça-feira, na mira de académicos e especialistas da área do Direito, num colóquio em Lisboa sobre a Agenda do Trabalho Digno.
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Um dos oradores é o jurista Filipe Lamelas que, ao JN, defendeu medidas estruturais, por exemplo contra o trabalho temporário em atividades essenciais para as empresas e contra os falsos recibos verdes.
Filipe Lamelas é um dos investigadores da Associação Laboratório Colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social (Colabor), que organiza, na Fundação Portuguesa das Comunicações, um colóquio que será aberto pela ministra Ana Mendes Godinho.
Assessor jurídico em processos de negociação coletiva e membro do Tribunal Arbitral do Conselho Económico e Social (CES), Filipe Lamelas começou por recordar que a Agenda do Trabalho Digno resultou de um contexto de Governo minoritário do PS, apoiado no Parlamento por PCP e BE. Partidos que procuraram impor a sua própria agenda em matéria laboral.
Matérias por aprofundar
Por isso, nota que agora – ao contrário das reformas de 2003 e 2012, com retrocesso nos direitos dos trabalhadores – “não há nenhuma malfeitoria” nesta nova agenda. Porém, apesar das alterações pontuais positivas, considera que há matérias que ficaram por aprofundar. Isto quando “o combate à precariedade deveria ser assumido de forma estrutural e não tendo em conta a conjuntura”.
Como exemplo, Filipe Lamelas referiu ao JN o alargamento da contratação coletiva e da representação sindical aos prestadores de serviço com dependência económica. Receia que possa ter o efeito perverso de “normalizar a situação” dos falsos recibos verdes e desviar as atenções destes trabalhadores que são considerados independentes, mas dependem economicamente de uma entidade. A solução, defende ainda, é integrá-los nas empresas.
Apesar das correções e melhorias no trabalho temporário, diz que falta discutir a sua abrangência. A seu ver, deve limitar-se a “situações que não digam respeito às atividades essenciais” e “ao objeto social da empresa”. Ou seja, ser apenas para “atividades acessórias”.
Porque “a precariedade não se esgota no tipo de vínculo”, mas prende-se também com as condições de trabalho, Filipe Lamelas diz ser preciso discutir e “proibir as cláusulas abusivas” nos contratos assinados com as entidades patronais.
Facilitar arbitragem
Como exemplo, apontou que uma cláusula que refere Portugal como local de trabalho é fator de instabilidade quando, na verdade, já se sabe que será apenas no Porto. Outro exemplo é a referência a um horário de trabalho das zero às 24 horas.
Outro tema a debater no colóquio é o alargamento da possibilidade de recurso à arbitragem necessária, na situação em que não se verifica o recurso à mediação, e também em consequência da mediação frustrada. Sobre este tema, Filipe Lamelas também aponta falhas. Defende que aquela possibilidade não deve estar circunscrita às situações existentes. Além disso, considera que não deveria depender de um despacho do Governo ou do CES, mas ser um processo automatizado.
Plataformas digitais
Carvalho da Silva, coordenador da associação Colabor, destacou ao JN tópicos a debater no colóquio, como a presunção da existência de contrato de trabalho nas plataformas digitais; a proibição do recurso ao outsourcing nos 12 meses seguintes a um processo de despedimento por razões objetivas; e a alteração ao regime do trabalho temporário.
Destacou ainda a introdução da possibilidade de representação coletiva e de abrangência de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho aos prestadores de serviço economicamente dependentes; e o alargamento da possibilidade de recurso à arbitragem necessária.