Investigador sai do CES por "mútuo acordo" após novas denúncias de agressão sexual
O investigador Bruno Sena Martins e a direção do Centro de Estudos Sociais (CES) de Coimbra chegaram a acordo e terminaram, esta sexta-feira, "a relação laboral existente" e o "vínculo com efeito imediato".
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Em relatos divulgados na quarta-feira, Andrea Vásquez e Helen Barbosa dos Santos, estudantes e investigadoras que fizeram cursos de verão no CES, afirmaram ao jornal "Diário de Notícias" terem sido vítimas de violência sexual por Bruno Sena Martins. No mesmo dia, a Direção do CES adiantou ao JN que ia "avaliar as medidas a tomar" face aos novos desenvolvimentos.
Em comunicado divulgado esta sexta-feira, o CES informa que as "duas partes entendem não estarem reunidas as condições adequadas para a continuação do seu trabalho de investigação de uma forma serena e produtiva".
"A direção do CES continua a reconhecer como válidas e relevantes as conclusões e recomendações contidas no relatório da Comissão Independente, estando comprometida com o desenvolvimento e implementação de uma política eficaz de prevenção e combate a todas as formas de assédio e abuso", lê-se no mesmo comunicado.
Denunciantes lamentam "silenciamento"
Dois anos após a publicação do livro "Má conduta sexual na Academia - Para uma Ética de Cuidado na Universidade", em abril de 2023, pela editora académica Routledge, surgiram na quarta-feira novas acusações contra o investigador do CES. Na mesma obra, publicada em 2023, era também visado o sociólogo Boaventura de Sousa Santos.
Sobre a saída por mútuo acordo de Bruno Sena Martins do CES, o coletivo de denunciantes - criado após a publicação do livro da editora Routledge - aponta que a decisão é um "resultado importante para a segurança das mulheres que continuam a trabalhar e a estudar no Centro de Estudos Sociais".
No entanto, o grupo lamenta que o CES tenha encerrado o "processo de apuração prévia", criado para avaliar eventuais processos disciplinares contra Bruno Sena Martins e Boaventura de Sousa Santos, sem informar as denunciantes sobre os resultados do mesmo.
"Não há transformação real ou outro futuro sem o reconhecimento completo da verdade. Lamentamos, ainda, o silenciamento, a vergonha e a descredibilizaçao que as vítimas passaram, que resulta também da ausência de uma reflexão sobre a falha institucional na proteção das denunciantes", aponta o grupo numa nota enviada à comunicação social.
Bruno Sena Martins tinha regressado ao CES
De recordar que as conclusões de uma comissão independente, em março do ano passado, apontaram existir padrões de conduta de abuso de poder e assédio no CES, por parte de pessoas em posições hierarquicamente superiores. Os especialistas referiram haver "indícios de que atividades de integração informais (por exemplo, jantares, convívios fora do CES) geraram situações inadequadas ao contexto académico".
Depois da comissão independente, o CES abriu um processo de inquérito interno para avaliar a eventual instauração de processos disciplinares. Enquanto Boaventura de Sousa Santos acusou a instituição de "linchamento" e se afastou do CES, Bruno Sena Martins voltou aos cargos no centro de investigação. Contudo, após duas novas denúncias de agressão sexual, o investigador e o CES terminaram esta sexta-feira, por mútuo acordo o vínculo laboral.
Novas denúncias divulgadas na quarta-feira
Andrea Vásquez relatou ao "Diário de Notícias" que participou num curso de verão, em 2017, realizado num hotel em Coimbra. Depois das aulas, os alunos e professores ficavam a conviver. "Na noite em causa eu tinha bebido bastante e estava ali, numa zona do rés do chão, sentada. E o Bruno sentou-se ao pé de mim e começou a tocar-me. Não me beijou ou algo assim, pôs a mão dele dentro dos meus calções", contou.
Já Helen Barbosa dos Santos acusa o antropólogo de lhe ter tocado na perna num bar em maio de 2017, depois de ter participado numa aula de Boaventura de Sousa Santos.
Na casa de Bruno Sena Martins, onde Helen e uma amiga pernoitaram para evitar os custos de uma estadia num hotel, o antropólogo entrou no quarto onde as duas mulheres iam dormir. "Estávamos na cama e ele deitou-se e foi aí o abuso. Me agarrou muito forte por trás e pegou os meus peitos. Dei um grito e quando gritei, ele se deu conta e saiu do quarto", disse. Na sequência das novas denúncias, o investigador Bruno Sena Martins não quis comentar o assunto ao DN.