Herdades com mais de cem hectares e regiões com boa disponibilidade de água são as mais procuradas. Um terço do Alqueva já está em mãos de empresas estrangeiras.
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Há cada vez mais interesse estrangeiro nas terras portuguesas e os números refletem-se na compra e venda de terrenos e negócios agrícolas. Os valores das operações fechadas em Portugal ascendem a 1,6 mil milhões desde 2021. No Alqueva, mais de 47 mil hectares do perímetro de rega já são ocupados por empresas internacionais.
No Ribatejo, a Trilho Saloio fechou recentemente a venda de cerca de 180 hectares de olival localizado em Alcanhões, Santarém. Os terrenos passam agora para as mãos da Aggraria, detida por um fundo de pensões canadiano. Os valores da transação não foram revelados, mas é o exemplo mais recente do interesse de estrangeiros no setor agrícola português. Entre 2021 e 2024, o volume de negócios andou à volta dos 1,6 mil milhões de euros só em Portugal e o número ascende a cinco mil milhões se juntarmos os valores de Espanha, avança a consultora CBRE ao JN. Os anos com mais valor transacionado foram 2022 (400 milhões) e 2023 (733 milhões). Em 2024, ficou-se pelos 266 milhões de euros.
Estes investidores são sobretudo estrangeiros e os fundos especializados são os responsáveis pela maior parte das transações de grande escala, nomeadamente os que estão sediados nos EUA, Canadá, Reino Unido e Espanha. As herdades “com acesso seguro e legalizado a água” são as mais procuradas, explica Manuel Valadas de Albuquerque, responsável pelo Agribusiness na consultora. Trata-se de propriedades com mais de cem hectares e com “foco principal nas culturas permanentes, como o olival, o amendoal, nozes ou pistachos”, acrescenta. Há também um crescimento da procura por culturas de maior valor acrescentado, como o melão e a melancia.
Ribatejo na moda
Se o Alqueva, com cerca de 130 mil hectares de regadio, tem atraído a maioria dos investimentos dos últimos anos, a verdade é que o Ribatejo começa também a ser um local de aposta. A operação da Trilho Saloio com a Aggraria é o exemplo. “É uma abertura de um novo polo de desenvolvimento deste mercado. É uma zona onde se consegue produzir azeite com uma grande qualidade e há disponibilidade de água”, refere Manuel Valadas de Albuquerque.
O aumento dos preços e a falta de “espaço para crescer” do Alqueva ajudam a explicar a tendência. “A maioria das transações no Alqueva nos últimos anos têm sido feitas ao preço de terra de regadio entre 30 e 40 mil euros por hectare, os valores no Ribatejo ainda não chegaram aos 30 mil euros para terrenos comparáveis”, nota.
Alqueva e Idanha no mapa dos investidores
De norte a sul do país, há novos donos das terras e não falam português. A Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva (EDIA) revela que 38,5% do total de hectares do perímetro de rega pertencem a estrangeiros. Os maiores investidores são os espanhóis, seguindo-se os americanos, britânicos e chilenos. O olival é a cultura predominante, mas também há alguma expressão do amendoal. A EDIA relaciona o interesse estrangeiro na região com o “crescimento da procura mundial por alimentos e a necessidade de diversificação de investimentos agrícolas”. A produção agrícola destina-se na sua maioria ao mercado externo. Também a Associação de Regantes e Beneficiários de Idanha-a-Nova aponta que uma “boa parte do capital investido” e que está a desenvolver o território de intervenção da associação “vem de fora do país”. E enumera projetos com promotores brasileiros, americanos, espanhóis e turcos. O JN contactou a Associação de Beneficiários do Mira (ABM) e a Associação De Agricultores Do Vale Da Vilariça, mas não obteve resposta.
Pormenores
Só nozes
A Trilho Saloio está a redefinir a sua estratégia de mercado que passa apenas pela produção de nozes de qualidade na Região Centro. “O setor está em franca recuperação com a subida gradual dos preços e o aumento do consumo”, afirma João Sanches, CEO da empresa.
Poucos apoios
São poucos os investidores de maior dimensão que fazem candidaturas a projetos da Política Agrícola Comum. Segundo a Associação de Regantes e Beneficiários de Idanha a Nova (ARBI), a “falta de flexibilidade e a burocracia” tornam estes apoios pouco atrativos para os grandes investidores.