As escolas e os Agrupamentos de Escolas (AE) que ficaram com cerca de 300 horários completos por preencher, sobretudo na área da Informática, já estão a divulgar essas vagas através de ofertas de escola, garante ao JN Arlindo Ferreira, autor do Blog De Ar Lindo e diretor do AE Cego do Maio, na Póvoa de Varzim. Para agilizar a contratação de professores, a Direção-Geral da Administração Escolar está a autorizar o recurso a esta solução, em vez de as vagas serem colocadas, primeiro, em reserva de recrutamento.
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Informática é o grupo disciplinar com mais falta de professores, o que Arlindo Ferreira atribui ao alargamento de Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) ao 2.º Ciclo em 2018. "O Ministério da Educação (ME) não precaveu a necessidade de docentes nesta área", justifica. Lembra ainda que o mercado absorve a maioria dos licenciados nesta área, ao oferecer condições de trabalho mais aliciantes do que as escolas.
O autor do Blog De Ar Lindo considera que a solução para atrair mais professores passa precisamente por aí, e não por contratar, mesmo que apenas a título excecional, licenciados sem habilitação para a docência, nos casos em que não haja candidatos ao preenchimento das vagas a concurso, como está agora em cima da mesa. "A habilitação própria poderá resolver alguma coisa, mas também trazer falta de qualidade, porque as pessoas não têm formação para serem professores."
Qualidade em causa
"Admitir pessoas sem habilitação profissional completa para dar aulas é uma perda de qualidade no processo de ensino-aprendizagem", afirma João Dias da Silva, da Federação Nacional de Educação. "Não podemos ter um sistema educativo de qualidade baratinho", defende. "Há pessoas com habilitações profissionais que não estão no sistema porque a perspetiva de estabilidade deixou de existir, e os salários não são compatíveis com as despesas de deslocação".
Francisco Gonçalves, da Fenprof - Federação Nacional dos Professores, acusa os sucessivos ministros da Educação de desinvestimento na carreira. "A imagem de que os docentes estão longe de casa e que a profissão não é valorizada é verdadeira e levou a que houvesse menos candidatos aos cursos", acredita. Quanto à solução proposta pelo ME, teme um "aligeiramento da exigência, que poderá pôr em causa a qualidade do ensino". A situação que lhe parece mais problemática é poder lecionar no Pré-Escolar e no 1.º º Ciclo apenas com licenciatura, ou seja, sem componente pedagógica.
"Quem é que garante que, mesmo assim, as pessoas querem ser professores, se nos primeiros escalões são mal pagos, não têm apoios na estadia, nem na deslocação?", questiona Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas. "O ME pode tomar 1001 medidas administrativas, mas se a profissão não for valorizada pouco interessa este esforço."
Filinto Lima defende que o problema "só será resolvido se houver um investimento sério do Ministério das Finanças na Educação", para que sejam criadas condições mais atrativas para a profissão. Quanto à possibilidade de recorrer a licenciados apenas com habilitação própria, também teme que a qualidade seja afetada.
O projeto de despacho "toma por base o que já está definido para as licenciaturas pré-Bolonha [mínimo de quatro anos] e os requisitos de acesso aos mestrados conducentes à profissionalização", contrapõe fonte do ME.
Reunião na sexta-feira
A possibilidade de as escolas poderem contratar titulares de licenciatura, desde que disponham de 120 créditos na área científica correspondente à disciplina a lecionar, está prevista na proposta de despacho do gabinete do secretário de Estado da Educação, a que o JN teve acesso, e que será discutida na sexta-feira com os sindicatos dos professores.
A proposta de despacho sugere que se considere que preenchem os requisitos de formação científica, para as áreas disciplinares dos diferentes grupos de recrutamento, os candidatos que sejam titulares de licenciatura em Educação Básica.
As pessoas que possuam uma qualificação de nível VI (licenciatura) ou equivalente, que constituam requisito de acesso ao 2.º º ciclo de estudos (mestrado), e tenham obtido, quer no quadro dessa qualificação quer em outros ciclos de estudos do ensino superior, os requisitos de formação fixados para os respetivos grupos de recrutamento também poderão dar aulas.
A possibilidade de as escolas poderem contratar titulares de licenciatura, desde que disponham de 120 créditos na área científica correspondente à disciplina a lecionar é outra das medidas previstas pelo ministério, a título excecional.