Maioria das restrições já foi levantada, mas há instituições que contrariam as orientações da DGS e que ainda não deixam os utentes irem a casa.
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Quase dois anos após o início da pandemia, o Governo aliviou, em fevereiro, a maioria das restrições. Mas o progresso que houve no país não se reflete em alguns lares de idosos. Várias instituições continuam a proibir os utentes de ir a casa ou de passear com as suas famílias no exterior. O constitucionalista Paulo Otero diz que privar os idosos da liberdade "constitui um crime".
Segundo a Associação Nacional de Gerontólogos (ANG), ainda existem, atualmente, "várias práticas no que toca às medidas de restrições por parte das estruturas residenciais para pessoas idosas". Por um lado, há as que permitem as saídas, sem qualquer tipo de condicionante. Noutros casos, as deslocações ao exterior são permitidas, com obrigatoriedade de teste antigénio no regresso à instituição. "No extremo das restrições, ainda verificamos, infelizmente, instituições que não permitem a saída para o exterior", relata a ANG, que defende o "desconfinamento para todos".
Paulo Otero, constitucionalista, afirma ao JN que a proibição "não deixa de ser uma dupla ilicitude". "Por um lado, não há uma norma [do Governo] que permita proibir as saídas dos utentes. Por outro, reter as pessoas contra a sua vontade constitui um crime", explicou o também professor da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.
Diretrizes pouco claras
A orientação 009/2020 da DGS refere que, "quando um residente sai da instituição por um período inferior a 24 horas, não é necessária a realização de teste laboratorial para SARS-CoV-2, nem de isolamento profilático aquando do regresso". Por isso, apesar de a ANG entender que a diretriz "é pouco esclarecedora", a maior parte dos lares deixa os utentes deslocar-se ao exterior. Contactada pelo JN com objetivo de esclarecer as orientações em vigor, a DGS não respondeu.
"O que estamos a dizer às nossas instituições é para cumprirem as diretrizes do Governo, de deixar sair, e para cada Misericórdia avaliar a sua situação, caso a caso", adianta Manuel de Lemos, presidente do Secretariado Nacional da União das Misericórdias Portuguesas. O dirigente explica que como "fator de avaliação" se deve ter em conta, por exemplo, a vacinação dos familiares. "Em nome da defesa do interesse e do bem-estar dos idosos, se for possível, que se permitam as saídas, uma vez que não há uma norma que as proíba", acrescenta.
O presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade Social, padre Lino Maia, também defende que, "não estando a decorrer surtos de covid-19, é conveniente que os idosos institucionalizados possam sair e passar tempo com as famílias". João de Almeida, presidente da Associação de Apoio Domiciliário, de Lares de Casas de Repouso (ALI), diz que "a maioria dos lares deixam sair, mas alguns tentam evitar" o que entende ser "abusivo, mesmo que o façam a pensar em protegê-los".
"O desconfinamento não pode escolher idades. Os direitos humanos devem ser aplicados a todos, independentemente do local onde vivem. Devem ser tidos em conta não só os riscos associados à covid-19, assim como os riscos associados à limitação de contactos sociais a longo prazo", deixa claro a ANG.
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Leva a problemas mentais
Para Sónia Vinagre, presidente da Associação Nacional de Apoio ao Idoso, "nesta fase, não há qualquer motivo para essa clausura". "O conhecimento que temos da doença, hoje, é muito maior. E o facto de os idosos não poderem conviver com a família leva a problemas mentais".
"Contradição" nas normas
João de Almeida, da ALI, advoga que "as orientações da DGS têm uma contradição". "O idoso pode sair da instituição com um familiar. Fora de portas, não se controla se dão beijos ou abraços. O mesmo familiar, depois, vai visitá-lo e tem que estar com máscara e afastado", frisa.
Apelo ao "bom senso"
Para gerir a permissão das saídas, Manuel de Lemos, da UMP, apela a que "se faça uso do bom senso", quer por parte das instituições, quer por parte das famílias dos seniores que recebem em casa idosos institucionalizados, procurando evitar que corram riscos desnecessários.