Reduzir a imigração em Portugal só tem vantagens a curto prazo. No futuro, vai provocar o aumento de impostos, a diminuição da despesa pública e o acentuar das desigualdades. As conclusões são de um estudo da Nova SBE, apresentado esta quarta-feira, sobre o impacto em Portugal do pacto europeu para as migrações.
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Num país cada vez mais envelhecido, onde o peso das contribuições da comunidade imigrante para a Segurança Social representou mais de 12% no ano passado, a imposição de regras apertadas à entrada de estrangeiros vai provocar um “aumento significativo” da carga fiscal às gerações futuras. A conclusão é de um estudo da Nova SBE, apresentado esta quarta-feira, que avaliou o impacto da aplicação do “Pacto para as Migrações e Asilo” numa perspetiva intergeracional.
Segundo os autores do estudo, o pacto polémico aprovado no Parlamento Europeu a 10 de abril de 2024, que visa reduzir o número de imigrantes nos Estados-membros, “deterioraria os saldos da Segurança Social no curto prazo e teria efeitos negativos na atribuição de pensões no médio e longo prazo”, fazendo com que o Governo tivesse de escolher entre reduzir as pensões ou aumentar as transferências do Orçamento para a Segurança Social. “Mantendo-se o fluxo atual de imigração, será necessário aumentar os impostos em quase 15%. Se Portugal adotasse uma situação extrema de não permitir mais nenhum imigrante, então teria de aumentar os impostos em quase 20%”, conclui o estudo.
Os investigadores defendem que as restrições à imigração não só vão reforçar as desigualdades, como limitar as escolhas das próximas gerações, já que Portugal está numa “tendência demográfica de envelhecimento” e é necessária que a chegada de imigrantes, sobretudo mais novos, se mantenha estável. “A restrição da imigração levará a um aumento de impostos, diminuição da despesa pública, deterioração das contas públicas e subsequente impacto na dívida pública, ou uma combinação dos três. Em qualquer dos casos, as gerações futuras verão as suas escolhas limitadas em virtude de um orçamento público mais restrito”, descrevem.
Efeitos na habitação e criminalidade
O estudo da Nova SBE defende que, a curto prazo, a aplicação do pacto europeu poderá reduzir a pressão dos salários dos menos qualificados e dos preços da habitação, bem como diminuir a criminalidade através do aumento das “deportações de imigrantes em situação ilegal”.
Porém, a médio e a longo prazo o entendimento altera-se porque a tendência será a estabilização do mercado de trabalho e a normalização do parque habitacional, bem como a irrelevância da questão da segurança. “Quando os imigrantes estão bem integrados no mercado de trabalho, a imigração não tem impacto na criminalidade”, assumem os especialistas.
Além do estudo sobre o impacto do “Pacto para as Migrações e Asilo” estabelecido pela União Europeia, cujos Estados-membros terão de transpor até 2026, o grupo de investigação da Nova SBE analisou as políticas públicas de habitação, sobretudo no que respeita ao controlo das rendas e à expansão da habitação social. Sobre esta matéria, os autores recomendam a escolha de políticas com base em dados e evidência científica, a redução progressiva ou a eliminação do controlo das rendas, a introdução de uma quota habitacional de 30% e a aposta forte na recuperação de edifícios devolutos.
Controlo de rendas não funciona a longo prazo
De acordo com a investigação efetuada, o controlo das rendas só é eficaz a curto prazo porque "impede que os preços da habitação subam acima do permitido por lei", mas a médio e a longo prazo acaba por ter "o efeito contrário ao desejado" porque os senhorios optam por "colocar a habitação para venda ou retirá-la apenas do mercado de arrendamento", o que faz com que haja uma diminuição da oferta e um aumento dos preços. "No longo prazo, o controlo de rendas leva a um aumento dos preços da habitação. Os cidadãos que possuem habitação enriquecem, enquanto os cidadãos das classes mais baixas que não possuem habitação, têm ainda maiores dificuldades em adquiri-la".
O grupo de investigadores defende que a habitação pública aumente para 30% para haver mais casas a preços acessíveis sem hipotecar as gerações futuras, frisando que Portugal surge na cauda da Europa no que toca ao parque habitacional público. Em comparação com a Suécia, onde 40% das casas são habitação social e cooperativa, Portugal tem apenas 2% de fogos públicos, percentagem próxima dos 3,5% em Itália.
Projeto para promover justiça entre gerações
As conclusões do estudo foram conhecidas esta quarta-feira, durante a apresentação do projeto “Avaliação de políticas numa perspetiva intergeracional”, da Nova SBE e da Fundação Calouste Gulbenkian, que visa “contribuir para um futuro mais equitativo” para todos. O evento contou com a presença dos investigadores da Nova SBE, Francesco Franco, Marli Fernandes e Marlon Francisco.
O estudo sobre o pacto da União Europeia sobre as migrações e asilo é um dos seis desenvolvidos no âmbito do projeto.