Emanuel Proença, presidente executivo da Savannah Resources, em entrevista ao JN e à TSF sobre as minas de lítio em Boticas.
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Emanuel Proença tem 40 anos, formou-se no Instituto Superior Técnico em Lisboa, fez-se engenheiro na área da gestão industrial, trabalhou como consultor, já liderou uma das maiores empresas do Mundo de transformação de cortiça, o Grupo Piedade, depois a Prio, que mudou o negócio dos combustíveis fósseis em Portugal, tornando-os mais verdes. É agora o presidente executivo da Savannah Resources, a concessionária da exploração de parte do lítio no Barroso.
Uma mina a céu aberto é uma cratera na paisagem, a Savannah vai transformar o Barroso em várias crateras?
De forma nenhuma, mas é uma boa provocação e uma boa forma de começar a coisa. Mas antes quero completar a minha biografia com o facto de ser pai de três meninas, com muito orgulho. Voltando ao assunto das crateras: compreendo que se construa essa imagem, agora a evidência mostra outra coisa. Há muitas minas a céu aberto pelo mundo fora, há bastantes minas a céu aberto também na Península Ibérica. A realidade daquilo que nós vamos fazer no nosso projeto de lítio do Barroso é totalmente compatível com a construção de um Barroso que continua a ter orgulho nas suas origens, continua a ter orgulho da sua paisagem e do seu espaço. Evidentemente que no período temporário em que há uma área de trabalho, o céu está em aberto e, nesse período, há ali um impacto na imagem daquele espaço. Mas estamos num vale de muitas centenas de vales que compõem o Barroso, na ponta sul, que é constituída pelo município de Boticas e pelo município de Montalegre. Nessa ponta sul estamos a trabalhar numa área que ao dia de hoje é uma floresta industrial de pinho. O nosso projeto não obriga à relocalização de alguém, não obriga à movimentação de nenhuma estrutura estabelecida e é totalmente compatível com a continuação de vida tal como ela existe hoje. Espero que seja potenciadora de vida tal como ela existe hoje, porque o projeto será um elemento de atração e de retenção de população, que é muito importante para uma região que nas últimas décadas tem visto retrair a sua população com muita imigração.
Deixe-me, antes de avançarmos para os detalhes do projeto, ostentar aqui mais duas ou três das bandeiras que são assinadas por quem contesta o projeto. Uma mina à porta de casa, uma quantidade de água impressionante para trabalho de exploração de lítio, destruição da paisagem considerável. Há uma forma aceitável de apresentar o projeto para quem vive e trabalha no Barroso nesta altura?
Já. É o que temos vindo a fazer, sobretudo, nos últimos nove meses. Temos estabelecido muitos pontos de trabalho e de contacto a nível local, principalmente na aldeia onde se concentra uma parte de oposição ao projeto, que existe e que continuará a existir. Não há projetos unânimes, não há projetos que sejam acarinhados por toda a gente exatamente da mesma forma, mas nessa mesma aldeia de Covas do Barroso, temos um escritório, várias pessoas que são da aldeia, que são parte da nossa equipa e que temos muito orgulho em ter na nossa equipa. Evidentemente que temos mais pessoas de Boticas, de Dornelas e teremos certamente de várias aldeias que estão próximas à área de projeto. No mês passado propusemos às pessoas destas várias aldeias, um autocarro para fazer uma visita a uma mina no sul de Portugal, para compreender um bocadinho mais o que é a realidade e a dimensão do nosso projeto em operação. Compreendendo sempre as diferenças de todos os projetos mineiros, ajuda a compreender um bocadinho melhor o que será o futuro naquela região. E eu acho que o exercício correu muito bem, o autocarro foi cheio.
Se estivesse do outro lado da barricada, poderia enumerar os perigos de um projeto desta envergadura?
Eu estou dos dois lados da barricada, portanto o que é importante fazer é precisamente a desconstrução da ideia de que há uma fonte de tensão que é inalterável. Eu sei que o projeto, durante alguns anos, não teve uma cara tão presente em Portugal e portanto não se conseguiu explicar de forma tão adequada. Estes são projetos que demoram muito tempo a chegar à fase de maturação. São muitas dezenas de milhões de euros de investimento até que realmente se comece a executar o projeto e, ao longo desses anos, é normal que um grupo opositor consiga passar mensagens de preocupação e torná-las muito focais. Compreendo a preocupação, a deturpação associada à preocupação, evidentemente, tenho de a combater e tenho de desconstruir as mensagens que foram exageradas e que foram sendo passadas como verdades absolutas e que não se aplicam ao projeto. Compreendo que se gere receios de que o projeto possa criar um impacto paisagístico irremediável, que possa ter impacto nas águas, que possa criar poluentes, possa criar pó, ruído e por aí adiante. Consegue-se criar este tipo de mensagens alarmistas de forma muito fácil e abrangente. Cabe-me a mim explicar que não é bem assim, que a realidade não é bem assim. O consumo de água, por exemplo. Este é um projeto que acaba por ter um consumo de água bastante modesto. Há várias formas de extrair mineral de lítio no Mundo, duas que são as mais comuns, por rocha dura, ou espodumena, que é o que se faz sobretudo na Austrália e que nós trabalharemos no Barroso. Há depois o processo por salmoura, que é aquilo que se faz no Chile, na Bolívia e na Argentina em que o consumo de água é muito elevado. Nós faremos esse consumo de água recolhendo a nossa própria água, fazendo pequenas barragens para fazer a recuperação de água do inverno e depois poder trabalhar durante o verão. Não tocaremos no rio local. Não teremos nenhum afluente, porque trabalhamos a água em circuito fechado. Só precisamos da água para fazer a separação de minerais por densidade e, portanto, é um processo com muito poucos químicos.
O Ministério Público diz que a Declaração de Impacto Ambiental não está em conformidade com a lei. Como é que está este processo?
Herdei o projeto quando entrei em setembro do ano passado, herdei um projeto que foi feito com uma qualidade técnica muito forte, foi muito escrutinado, tem sido certamente um dos projetos mais escrutinados precisamente por ter uma oposição local que mantém a pressão para que o escrutínio seja muito, muito forte. Apesar de tudo, tenho toda a confiança que as coisas foram feitas da melhor forma. Se existe alguma lentidão é porque são precisos procedimentos burocráticos. Mesmo assim, os procedimentos de controle por parte de todas as entidades que acompanham este projeto são muito, muito inteligentes.
Disse que a empresa vai ter receitas de mais de 300 milhões de euros, dos quais 10 milhões serão para o município de Boticas. Vai dar emprego a milhares de pessoas. Terá um impacto positivo para travar a desertificação. Ora, se este projeto é assim tão bom, como é que justifica as manifestações e até a contestação dos autarcas da região, entre eles, o próprio presidente da Câmara de Boticas?
Vai ser preciso combater a desinformação que foi criada ao longo de alguns anos, sobretudo a nível regional. Temos feito um trabalho com as entidades locais e que tem sido de respeito mútuo, de diálogo e de compreensão. Aquilo que foi a contestação de há um ano atrás, e que ainda teve algum eco nestes últimos meses, parece-me que já não está em total consonância com a forma de relação entre o projeto, a empresa e as entidades da região. À medida que vamos fazendo cada vez mais este exercício, mais as posições vão sendo mais positivas porque é bom para o projeto, é bom para a região e conseguimos trabalhar muito melhor todos os efeitos colaterais que o projeto tem e tirar benefício deles. É preciso construir pontos de confiança mínimos para que possamos depois trabalhar em conjunto os vários elementos de projeto.
Que impacto terá esta receita de 10 milhões de euros para o município de Boticas?
Será uma boa pergunta a fazer ao município e ao senhor presidente da Câmara e aos presidentes futuros que virão. Como sabem, haverá eleições autárquicas no próximo ano e o senhor presidente está a terminar o seu terceiro mandato e, portanto, está certamente atento a todos os planos na região, para construir um futuro melhor. Eu posso dar-vos só os elementos numéricos e factuais. Um município como o de Boticas, que tem cerca de 6 mil habitantes, tem hoje um orçamento municipal anual entre 9 e 11 milhões de euros. A realidade normal de todos os municípios portugueses, diria eu, é que grande parte desse orçamento é despesa regular. Estamos a falar de um projeto que consegue meter outros 10 milhões de euros em cima do orçamento municipal e com isso multiplicar por muito a capacidade de investimento e capacidade o desenvolvimento. Por lei, a empresa é obrigada a pagar "royalties" ao município e ao Estado, para além de todas as outras componentes de impostos normais. Como qualquer negócio industrial e empresarial, tem todas as outras componentes de impostos diretos, de impostos indiretos, de geração de valor económico colateral por todas as contratações que se faz a nível local, todo o envolvimento da economia local e regional e tudo isso tem efeitos colaterais positivos também.
Tem algum fundamento à acusação de que a empresa está a tomar posse de terrenos baldios?
Absolutamente nenhum, evidentemente. Nós temos uma área de concessão que é relativamente abrangente, inclui ao dia de hoje algumas centenas de parcelas. Temos um interesse particular em fazer as coisas o melhor possível, porque se fizéssemos mal num sítio teríamos problemas na fronteira com outros terrenos. É uma acusação que não tem fundamento. Ao dia de hoje já temos mais de 100 parcelas adquiridas de forma amigável e temos também utilizado todos os instrumentos legais que normalmente são aplicados nestes processos, como as expropriações. É normal não só em projetos mineiros, mas também em barragens, em autoestradas ou estradas. Mas a prioridade é manter um processo de aquisição amigável. Creio que tem tido bastante sucesso e adesão. Nunca terá a adesão completa e nunca resolverá todos os temas de definição de propriedade local nesta região...
As parcelas são muito pequenas, não é?
Sim. Há problemas de definição de fronteiras, há problemas de definição de propriedade, há problemas com herdeiros e por aí adiante, e portanto é sempre inevitável haver, em certo momento, recurso a mecanismos legais que servem precisamente para resolver isso, como é um processo de expropriação. Agora, a nós cabe-nos manter, enquanto pudermos, o processo de aquisição amigável e permitir a todos os que querem fazer a venda e querem pôr os seus papéis em dia, conseguir reconciliar toda a informação legal relativa ao seu terreno. Ainda temos algumas dezenas de terrenos que estão a passar por esse processo. Até agora comprámos todos os terrenos seguindo as mesmas regras e acho que isso também é importante, fazer um tratamento uniforme e pagar valores muito acima dos valores normais de mercado, que também é uma coisa boa para quem vende.
Tem ideia de qual é a percentagem de terreno que o projeto vai ter no município de Boticas?
Se juntarmos o município de Boticas e de Montalegre, aqueles que definem a região de Barroso e até é classificada como Património Agrícola Mundial, a nossa área de concessão será um duzentos avos de todo esse território. O nosso projeto não abrange, na primeira fase, toda a área de concessão e, portanto, a ocupação de espaço será ainda menor. Acho que também vale referir uma coisa: o nosso projeto é "open pit". O que é isto? O trabalho de exploração é feito em sequência. Começamos numa área e depois de esgotada do ponto de vista técnico, avançamos para a segunda. O projeto é sequencial e repõe o espaço geográfico tal como ele estava e portanto, em nenhum momento vou estar a ocupar toda a área.
Além das manifestações de intenção quanto às refinarias de lítio e outras unidades industriais, há alguma coisa neste momento que seja certa sobre os negócios que vão estar dependentes da exploração do lítio em Portugal?
Sim, bastantes coisas. Estes projetos demoram muito a chegar ao momento em que começam a operar e demoram muito, sobretudo, por questões associadas a componentes técnicas e a componentes de cumprimento de todas as regras e legislação aplicável. Não estando ainda em atividade, esta empresa já colocou no projeto mais de 40 milhões de euros. Estamos cotados em bolsa e temos um escrutínio muito grande, um dever de prestação de informação muito grande e qualquer pessoa pode ser a investidora na empresa.
Para todos os efeitos é uma empresa inglesa, certo?
É uma empresa que é de direito inglês, está cotada na bolsa inglesa, temos também a subsidiária portuguesa e ao dia de hoje, apesar de ser de direito inglês, já é cerca de 15% portuguesa, com acionistas portugueses. Também é perto de 15% alemã. A Savannah não só vai garantir a exploração de lítio, mas também o feldspato e mica. Sobretudo o feldspato, que tem muita utilidade numa indústria que é muito acarinhada pelos portugueses, que é a cerâmica. Empresas como a Vista Alegre, Spal ou Revigrés são consumidoras de feldspato para fazer as pastas cerâmicas. Esperamos poder também colocar esse produto ao serviço de uma indústria que precisa de voltar a energizar-se.
Para a espodumena de lítio, já fechámos um acordo com a AMG Critical Materials, uma empresa cotada na bolsa neerlandesa, uma empresa muito credível no setor químico, já com muitas décadas de experiência e de trabalho em vários minerais e em vários processos químicos e que tem a característica interessante de ter sido, em setembro, a primeira empresa a abrir uma refinaria de grande dimensão na Europa. Estamos, por parceria, a trabalhar com quem está mais avançado na refinação de lítio para que parte deste lítio possa ser importante para a indústria automóvel europeia. Há outros sítios de exploração de lítio também relevantes na Europa, que é a Alemanha e a na Chéquia. Mas o único projeto que é similar ao nosso nas características, na competitividade, na forma de produção e por aí em diante é um projeto na Finlândia, que está neste momento em construção. Está mais adiantado do que nós. É um projeto muito, muito bem feito e muito bem construído pelos finlandeses, mas ligeiramente mais pequeno no recurso e na capacidade de estar ao serviço da indústria automóvel e transição energética europeia. A parceria com a AMG põe-nos a trabalhar com os melhores e os mais bem colocados nessa frente. Por essa parceria temos um acordo de venda de parte do material extraído, cerca de 20% a 25% da nossa produção nos primeiros anos. Estamos a construir uma fileira do lítio e, portanto, são muitas as entidades envolvidas que vão desde a mineração até ao veículo elétrico. Temos anunciado a possibilidade de mais duas refinarias em Portugal. Na componente de refinação até estamos muito bem colocados para ser precursores, transformadores e desenvolvedores de uma indústria europeia de escala. E depois temos a fábrica de baterias da Galp em Sines e várias outras mais pequenas em reparação e construção pelo país fora.
Para as pessoas terem uma ideia, quando estiverem em produção cruzeiro, quantos automóveis elétricos poderão ser produzidos?
Com números mais exatos, poderá colocar no mercado acima de 800 mil veículos por ano. Estamos a falar de veículos elétricos suficientes para eletrificar toda a frota portuguesa vezes cinco. É um projeto de dimensão que, a partir de Portugal, ajudará a Europa, e não só Portugal, a acelerar a sua eletrificação e transição energética. Existe grande vontade e capacidade da indústria automóvel europeia. Em todas as conversas que temos mantido, e são com alguns dos grandes nomes da indústria automóvel, da indústria de baterias, da indústria de refinação, todos apontam no sentido de acelerar o caminho e aqui posso referir-vos a empresas como a Volvo, a Tesla, a Mercedes e muitas outras que têm mantido interesse em acompanhar o projeto e em posicionar-se para transformar todo o seu sistema de produção e torná-lo cada vez mais verde e cada vez mais eletrificado.
Mas há possibilidade de trazer alguma fábrica para Portugal de alguma destas marcas?
Eu tenho certeza que essa possibilidade está na mesa. Tenho muita confiança que, fazendo um bom trabalho na construção desta fileira, aumentaremos cada vez mais a probabilidade disso acontecer. Nos primeiros seis meses deste ano foram anunciadas em Marrocos a construção de seis fábricas de baterias, de cátodos, de ânodos, de acumulação de baterias e por aí adiante, quase todas por empresas chinesas. São mais de 10 mil milhões de euros de investimento que são colocados aqui mesmo ao lado. Portugal, trabalhando bem esta fileira, posiciona-se para acolher alguns dos outros investimentos que aí vêm. O Mundo precisará, ao longo dos próximos 15 anos, de construir cerca de 200 fábricas de grande dimensão de automóveis elétricos. São fábricas que estarão ao nível do que é uma Autoeuropa. Se pegássemos no que é a quota que a Savannah pode ter de produção de lítio a nível mundial, implicaria que Portugal poderia atrair até perto de cinco fábricas. Imaginem o que poderia ser o impacto que lhe está associado. Se trouxéssemos mais uma, duas, três "Autoeuropas" seria já absolutamente fantástico e um passo enorme no sentido de termos um Portugal mais competitivo.
O valor atual do lítio é de cerca de 11 mil dólares por tonelada. Nos próximos tempos esse valor pode crescer para 15 mil dólares. Como é que o projeto fica em termos de rentabilidade com estas oscilações?
O projeto tem a sorte de ser muito competitivo a nível mundial, precisamente porque tem um recurso de muito boa qualidade e a exploração e custos são competitivos. É verdade que estamos a cumprir com a legislação mais exigente a nível mundial, a legislação europeia, o que torna as coisas mais caras, sendo o projeto ainda mais desafiante. Mesmo cumprindo com essa legislação toda, mesmo cumprindo com todo de investimento associado, a nossa estimativa é que estaremos a meio da curva de custos a nível mundial. Significa ser competitivo e poder trabalhar em qualquer circunstância de mercado. Evidentemente que quanto mais o preço do mercado internacional for elevado e quanto mais nós conseguimos produzir, melhor a rentabilidade para os nossos acionistas, melhor a parcela de "royalties" que fica no município e mais os maiores os impostos que fica em Portugal.
Já percebi que é um otimista e olha para a curva a subir e não pondera sequer que a curva venha a descer...
Sim, a curva de preço num mercado de “commodity” em construção como é o do lítio, vai ser sempre volátil ao longo dos próximos anos. Em 2020 estava a 8 mil dólares, em 2022 estava a 80 mil dólares agora pode chegar aos 15 mil. Espera-se que o preço consiga continuar a desenvolver capacidade para suprir a procura, que está a crescer muito rápido.
Que garantia tem que o lítio tirado do chão do Barroso, a partir de 2026, fica em Portugal?
A questão é onde é que ela exporta ao longo da fileira, ao longo da cadeia de valor. Quanto mais nós conseguirmos desenvolver os projetos que estão a montante, os projetos que estão a meio da cadeia de valor e a jusante da cadeia de valor, mais valor acrescentado bruto para o país. O foco é assegurar que este e os outros projetos avançam a uma velocidade adequada. Do nosso lado, o que faz mais sentido é que o produto fique o mais perto de onde seja usado. Não faz sentido pegar no produto e levá-lo para o outro lado do Mundo para ser processado, para ser transformado em baterias e em carros. Quanto mais próximo tudo estiver, melhor. Há muito trabalho a fazer para que isso seja possível.
Quanto tempo de exploração é que está estimado no projeto?
Temos um recurso definido e a sua exploração totalmente assente também do ponto de vista de autorizações, de contratos de concessão, autorização de impacto ambiental condicionada e por aí adiante, para trabalhar ao longo de 17 anos. O que acontece nestes projetos é que ao longo destes 17 anos, vou ajustando as minhas estimativas de procura e vou tentando merecer a confiança de continuar a explorar. E se isso acontecer, então muitos outros anos virão.
Disse que um dia este projeto faria regressar aqueles que emigraram para outros países, contribuindo para a desertificação do Barroso. Mantém essa convicção?
Não só mantenho, como fico muito feliz por ver começar a acontecer. Nas últimas contratações da empresa já temos alguns casos de pessoas que voltaram após 15 anos em França, ou após 20 anos nos Estados Unidos...
Em que áreas?
Pessoas que estão a trabalhar connosco no desmatamento, na geologia, no ambiente, na relação com as comunidades...Para a frente, vamos contratar operadores de fábrica, operadores de máquinas, motoristas de camiões e de máquinas pesadas, engenheiros, pessoas de recursos humanos, pessoas de área financeira e por aí adiante, todas as valências necessárias para uma atividade deste género. Os que voltaram ainda são poucos mas já são pequenos sinais de que isso está a acontecer. Temos casos de pessoas que puderam ficar na sua região e não tiveram de emigrar e temos casos de pessoas que vieram do litoral para trabalhar no interior.
Está em plena discussão o Orçamento de Estado, a situação política tem estado instável. Com este impasse já teve indicações deste Governo sobre o que pretende da exploração do lítio, até por comparação com o Governo anterior?
Governos responsáveis e com vontade de desenvolver o país querem todas as atividades que façam com que os portugueses tenham mais oportunidades...
Isso é um conceito muito genérico...
É, mas isso dá a resposta que está subjacente. Cria-se a ideia de um Governo ter de se pronunciar especificamente sobre um setor A, B ou C e não tem forçosamente. Em particular, em relação à fileira e ao projeto, sim, já tivemos evidentemente mensagens de apoio e de endosso ao desenvolvimento da fileira.
O escândalo da Operação "Influencer" prejudicou ainda mais a imagem de um setor já polémico?
Sim, claramente. É evidente que a Operação “Influencer” gerou uma crise de confiança até em investidores internacionais. Logo na sequência da Operação "Influencer", o preço da ação caiu muito e foi preciso trabalho para restabelecer a confiança por parte dos agentes internacionais. Não só na fileira, não só no nosso projeto, mas também no país. Estamos apostados em ajudar a que isso aconteça. Eu apanhei o processo de Operação "Influencer", estava há seis semanas na função e, portanto, como imaginam, não foi de todo um processo agradável. Fizemos tudo aquilo que havia a fazer para assegurar aos nossos acionistas, às nossas equipas e às pessoas que uma operação de investigação não é uma operação de acusação e que não é, por ter acontecido aquele ponto de partida, que há um ponto de chegada. Evidentemente que houve efeitos na reputação. Estamos a aproximar-nos da data em que faz um ano, não houve do nosso lado nenhum desenvolvimento, ou que nós saibamos, nenhum desenvolvimento relevante. O senhor primeiro-ministro saiu, mudou-se o Governo. As empresas envolvidas, algumas estão sob escrutínio, outras estão a avançar. Nós estamos a avançar com a atividade com toda a normalidade e com toda a confiança de que qualquer dúvida que surja, seja ele entidade judicial ou política, será endereçada com todo o detalhe que é necessário para que se restabeleça a confiança.
E em relação à questão polémica da construção de uma estrada em troca de favores?
É um bom ponto. Foi referido como fazendo parte da investigação da Operação "Influencer". Uma estrada que tem por objetivo fazer sair os camiões da área de atividade até à autoestrada parece evidente para o projeto. Mas a estrada é bastante consistente com a ambição e a vontade da população de ter uma ligação melhor à autoestrada, porque há essa dificuldade que não afeta só o dia-a-dia das pessoas, afeta os cuidados de emergência, por exemplo. Uma ambulância que sai de uma daquelas aldeias para o hospital demora entre uma hora e uma hora e meia. Evidentemente que estamos a preparar-nos para construir uma estrada que é importante para o projeto, para a região e que ajudará a todos.
Nessa variação acionista depois da demissão do Governo no ano passado, houve investidores a sair por causa disso?
Sim, claro. Aqueles 15% de portugueses que falava há pouco substituíram investidores estrangeiros. Alguns saíram porque estavam com a empresa há mais de uma década e acharam que era o momento para sair, como é normal em empresas cotadas. O facto de ter havido muitos portugueses a comprar ações no período subsequente, a ação voltou a valorizar para valores mais consistentes. Estou satisfeito e reconhecido por tê-los a bordo e muito feliz por ter mais chefes portugueses, porque os meus acionistas são também os meus chefes.
A Savannah Resources tem vida além deste projeto do lítio no Barroso?
Ao dia de hoje estamos focados neste projeto, que é de dimensão, de qualidade e de classe mais que suficiente para ter 100% da nossa atenção.