Uma equipa científica internacional demonstrou que o parasita da malária está a resistir ao tratamento devido às suas múltiplas alterações genéticas e não a uma única mutação, como se julgava até aqui.
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O estudo foi publicado na revista “Nature Communications” e, de acordo com a Universidade do Minho, reforça a teoria proposta em 2020 pela equipa de Pedro Ferreira e Isabel Veiga, do Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) da Escola de Medicina, que participaram no novo trabalho para defender a hipótese de alterações nos genes plasmepsin e mdr1.
A recente pesquisa, diz a instituição em nota de imprensa a propósito do Dia Mundial da Luta contra a Malária que hoje se celebra, “revela que a resistência à piperaquina (um medicamento essencial no tratamento da malária) deve-se a múltiplas alterações genéticas no parasita da malária”. Em particular, “variações no gene plasmepsin 3 estão associadas a uma eficácia reduzida do tratamento com di-hidroartemisinina-piperaquina e a um maior risco de recorrência da malária, sobretudo entre crianças em países africanos, onde a doença é mais prevalente”.
“Esta descoberta confirma o que sugerimos há cinco anos e tem implicações importantes na forma como controlamos e tratamos a malária”, afirma Pedro Ferreira.
O estudo, acrescenta, “sublinha a urgência de métodos avançados para acompanhar e monitorizar a resistência a antimaláricos. As atuais estratégias de vigilância centradas em mutações genéticas individuais podem não ser suficientes”.
Tratamento repetido reduz eficácia
Os investigadores concluíram, ainda, que “a piperaquina permanece no organismo humano durante várias semanas e protege contra novas infeções. Já a di-hidroartemisinina só perdura algumas horas, deixando a piperaquina depois isolada. Ou seja, futuras combinações de medicamentos antimaláricos devem ter uma farmacocinética similar para retardar a resistência do parasita”.
Os especialistas realçam também que “a vida semi-longa da piperaquina pode deixar de ser uma vantagem se o seu uso for repetido em escala, sobretudo em regiões com muitos casos de malária ou ao ser aplicada habitualmente por prevenção em crianças e grávidas”. Ou seja, "o parasita tende a adaptar-se mais rapidamente e corre-se o risco de haver doentes novamente infetados após o tratamento”. Os cientistas alertam que, se nada for feito, a piperaquina pode deixar de ser eficaz como medicamento preventivo em muitos países.
O novo estudo foi coordenado pelo Instituto Karolinska (Suécia) e juntou vinte cientistas, incluindo das universidades do Minho, Lisboa, Nova de Lisboa, Exeter (Reino Unido), Tübingen, Heidelberg (ambas na Alemanha) e de Ciências e Tecnologias de Bamako (Mali), bem como do Centro de Investigações Médicas de Lambaréné (Gabão), do Centro Alemão de Investigação de Infeções e da Fundação Oswaldo Cruz (Brasil).
Esta equipa prepara-se agora para testar alternativas antimaláricas em grávidas, como a sulfadoxina-pirimetamina e a sua eficácia profilática em alternância com a piperaquina, procurando assim formas de manter a proteção sem acelerar a resistência.
Dia mundial da luta contra a malária
Hoje assinala-se o Dia Mundial da Luta contra a Malária. A doença é transmitida pela picada dos mosquitos Anopheles, contaminados pelo parasita Plasmodium.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, em 2023 houve 263 milhões de casos de malária, incluindo 597 mil mortes em 83 países. A África está associada a 95% dos casos, 76% dos quais com crianças até 5 anos de idade. A Ásia, a América Latina e, em menor escala, o Médio Oriente e partes da Europa também têm sido afetados.