Maria José Fernandes: "Temos a concordância dos partidos para doutoramentos nos politécnicos"
Assumiu nesta semana a presidência do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), sendo a primeira mulher a fazê-lo. Maria José Fernandes, presidente do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave (IPCA), trouxe à discussão os doutoramentos e as universidades politécnicas, que o anterior ministro da Ciência e Ensino Superior não considerou prioritários, pelo seu papel na internacionalização dos institutos. Garante o apoio de deputados da Esquerda à Direita. E, a bem da coesão, defende limitações nas vagas de acesso. Sob pena de se "desertificar ainda mais as instituições do interior".
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Assumiu como uma das bandeiras do seu mandato a transformação dos institutos politécnicos em universidades politécnicas, a ministrarem doutoramentos.
É uma área que foi já assumida no mandato anterior. Os benefícios serão enormes se as instituições passarem a universidades politécnicas. Tem a ver, fundamentalmente, com o alargamento da nossa intervenção em termos internacionais. Não deixamos de ser uma universidade naquilo que é a missão das instituições.
Em termos de conceito em si. Não numa ótica concorrencial?
Nada. De todo queremos deixar a nossa missão. Não tem nada a ver com invadir a questão das universidades. É o conceito de que é uma universidade de cariz politécnico.
Mantendo os dois subsistemas?
Isso é intocável da nossa parte. Queremos continuar alinhados com a nossa missão.
Mas não está no programa de Governo e obriga a alterar a Lei de Bases. Acredita ser exequível? Sei que há uma petição...
Uma iniciativa de cidadãos, que vem do anterior mandato, liderada pelos conselhos gerais dos politécnicos. Reunimos as assinaturas necessárias e a petição já foi ressubmetida e aceite. Agora é preciso que este assunto seja discutido no Parlamento. Enquanto Instituições de Ensino Superior (IES) estamos a fazer o nosso trabalho junto dos deputados eleitos das várias regiões. E posso dizer que temos a concordância plena na questão dos doutoramentos.
De todos os partidos?
Sim. Apoio à Esquerda e à Direita de todos os partidos a quem apresentamos este processo. A iniciativa legislativa tem dois pontos: a designação e os doutoramentos, havendo consenso nos doutoramentos.
Sente que o ensino politécnico não é ainda devidamente valorizado?
Não. Acho que passados estes anos de afirmação não é uma questão essencial. O que nós queremos é que haja mais estudantes no Ensino Superior (ES) no seu todo, olhando às vias profissionais, onde há uma margem muito elevada de captação de estudantes.
Como explica a quebra de procura por estes estudantes no concurso especial aberto há dois anos? O que falta fazer?
Falta uma maior divulgação. É um caminho que tem que se fazer. Neste ano há um conjunto de ações a serem desencadeadas para a divulgação. Mas não podemos esquecer que muitos destes alunos estão a escolher os CTeSP [cursos de curta duração]. Temos mais de 18 mil alunos em CTeSP, que são potenciais candidatos ao concurso das vias profissionalizantes.
O Governo abriu a porta a mudanças no acesso ao Ensino Superior. Qual a posição do CCISP?
O CCISP ainda não tomou posição formal, até porque não há nenhum modelo apresentado, estando disponível para colaborar em todas as alterações que venham a ser equacionadas. Todos nós queremos mais estudantes no ES e mais estudantes repartidos pelo país. Temos a questão destes dois anos pandémicos, numa situação excecional, também em termos de exames de acesso. A primeira questão vai ser discutir se este modelo é para manter ou não.
E deve ser mantido?
Na minha opinião pessoal, como está, este modelo está perfeito. Há uma pressão tão grande no acesso. Havendo esta exceção neste período pandémico vai ser difícil recuar. Porque a minha dúvida é: qual foi a consequência negativa deste modelo?
Falou de estudantes repartidos pelo país. Como vê a questão das vagas nos cursos de excelência, concentrados em Lisboa e no Porto. Faz sentido manter-se?
Não. Não podemos desertificar o interior. Esse será o primeiro embate com esta mudança governativa. O anterior ministro tinha ideias relativamente a isto.
Como se equilibra a balança?
Temos que ter limitação de vagas para, em função dos resultados, as pessoas espalharem-se pelo país. Senão vamos desertificar ainda mais as instituições do interior.
Defende mudanças no Regime Jurídico das IES. Por uma maior autonomia?
É um dos pontos fulcrais. Tem a ver com a autonomia que as IES têm. Mas também o próprio Orçamento do Estado. Um exemplo: quando falamos da massa salarial, do limite ao aumento de 3%, neste Orçamento continua a mesma regra. Isto é limitar a nossa autonomia, porque se conseguimos arrecadar receitas, temos é que gerir os orçamentos que temos.
E quanto à lei do financiamento do Ensino Superior?
Temos uma fórmula de financiamento que já não é aplicada desde 2009. E, neste momento, temos que concordar que a fórmula também já está desatualizada. Tem que ser revista. A fórmula atual distingue os politécnicos das universidades em muitas áreas que já não faz agora sentido.