
Sucessivos confinamentos impediram crianças de brincarem ao ar livre e de estarem com os seus amigos
Foto: Arquivo Global Imagens
Relatório da OMS Europa, coordenado pelo INSA, analisa comportamentos, entre 2020 e 2022, em crianças dos seis aos dez anos. Mais snacks e doces, menos exercício, num reforço das tarefas feitas em família.
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Já lá vão quatro anos desde que a covid-19 nos entrou portas dentro. Fechando-as. Com impactos ainda por dimensionar nas crianças e que vão muito para além das aprendizagens. Os dados que o Instituto Nacional de Saúde (INSA) apresenta nesta terça-feira dão pistas para a atuação que urge na infância, não só no campo da obesidade, mas do bem-estar emocional. Mais consumo de alimentos processados, um escalar do sedentarismo e escassas brincadeiras com os amigos. Num tempo que permitiu mais atividades em família. Cá, como nos 17 países que integram a Organização Mundial de Saúde (OMS) Europa analisados.
Enquanto Centro Colaborativo da OMS para a Nutrição e Obesidade Infantil o INSA coordenou uma análise ao impacto da pandemia nas rotinas diárias e comportamentos de crianças entre os seis e dez anos de idade, numa amostra total de 54.373 menores em 17 estados-membros (Albânia, Azerbaijão, Bulgária, Croácia, Chipre, Geórgia, Itália, Cazaquistão, Malta, Montenegro, Polónia, Portugal, República da Moldávia, Roménia, San Marino, Eslováquia e Uzbequistão). Concluindo-se que a “pandemia impactou de forma muito transversal em todos os países”, sublinha ao JN Ana Rito, investigadora do INSA.
Que destaca, no lado positivo da balança, o aumento de atividades em família durante a pandemia. Seja a preparar refeições em conjunto (+26%, na média dos 17 países; 33,6%, para Portugal) ou a partilhar refeições em família (+29%, na média; +35,4%, para Portugal). Mas também o aumento do consumo de fruta (+11,9%, no nosso país) ou de legumes (+7,1%) e a diminuição do consumo de refrigerantes (-12,7%, na média; -13,8%, em Portugal).
Contudo, o lado negativo de sucessivos confinamentos impacta na balança. Num universo de 5.139 crianças portuguesas (dos 6 aos 8 anos), as famílias inquiridas reportaram um acréscimo do consumo de doces (+19,4%), de snacks salgados (13,8%), com quase metade dos menores a passarem mais tempo em frente à televisão ou ao computador. Famílias essas que reportaram um agravamento da dificuldade (+11,4%) em “chegar ao fim do mês sem grandes problemas financeiros”.
Confinadas, sedentárias e sem contacto com os seus pares, nos 17 países estudados a perceção de uma deterioração do bem-estar dos filhos. Porque se divertiram menos com os amigos, desfrutaram de menos tempo ao ar livre ou tiveram menos tempo para si próprias. Para serem crianças. Com os “piores hábitos a serem mais evidentes no Sul da Europa”, diz Ana Rito.
Que se questiona: “O que é ficou?”. Para a investigadora, o relatório levanta uma “série de questões que, provavelmente, continuaram na vida destas crianças”. Merecendo “reflexão”. Do lado do excesso de peso e obesidade, confirmou-se já a “tendência invertida, com um ligeiro aumento” nas nossas crianças. Se bem que, entende, “não diretamente ligado à pandemia, mas ao estilo de vida”. Quanto ao que podemos fazer, reserva-se um painel de discussão na tarde desta terça-feira.

