Depois de um encontro com Marcelo, casal recebeu em sua casa, num bairro social de Lisboa, uma visita de Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social. "Foi uma grande honra", revelou o anfitrião Paulo Cunha.
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"A sra. ministra disse que aceitava o convite e que ia ver a agenda, mas pensámos que nos estava a despachar. No entanto, concretizou-se". Paulo Cunha, 49 anos e sem-abrigo durante 24, convidou Ana Mendes Godinho para almoçar em sua casa, como já tinha acontecido com o presidente da República, em 2017. A governante acedeu e quis conhecer o percurso de Paulo, que venceu o infortúnio e hoje trabalha no Sindicato dos Profissionais de Polícia.
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Ambos conheceram-se na última festa de Natal da Comunidade Vida e Paz (CVP); dois meses depois, o reencontro aconteceu. Na sala da casa de Paulo e da mulher Filipa, primeiro vieram as entradas e as bebidas - oferta de uma produtora de vinhos -, depois chegou o empadão de atum - que ficou a cargo de Filipa. "Com o forno que temos, não estava à espera que saísse tão bem", diz.
No almoço participaram ainda Henrique Joaquim, ex-presidente da CVP e atual gestor executivo da Estratégia Nacional de Integração dos Sem-Abrigo, e três voluntários da Comunidade.
Coma alcoólico
Ana Godinho afirmou ao JN que este caso mostra que é "possível criar condições para que as pessoas em situação de sem-abrigo se voltem a integrar na comunidade". Mas Paulo assegura que esse caminho foi tudo menos fácil: sem-abrigo desde os oito anos (os pais separaram-se e ele saiu de casa), na juventude agarrou-se ao álcool. Foi salvo por voluntários da CVP que o encontraram "já acabado" e o levaram para o hospital, onde esteve dois meses em coma alcoólico. "Acordei quando o médico estava a assinar a certidão de óbito", revela.
Em 2004 deixou as ruas e desde 2007 que não bebe. Três anos depois veio o casamento e, em 2017, o almoço com Marcelo Rebelo de Sousa, que tinha ajudado na campanha para a Câmara de Lisboa, em 1989. "Reencontrei-o em 2016, na festa de Natal da CVP", lembra Paulo. Pouco depois recebeu-o em casa - também lhe serviu empadão de atum - e, meses mais tarde, foi a Belém almoçar.
Viver com 400 euros
O dia-a-dia do casal não é fácil. Filipa diz só ter "um frango e uma perca" no congelador, embora Paulo garanta que os 270 euros de pensão que recebe, a que se somam os 90 euros da pensão de sobrevivência do pai de Filipa e algumas ajudas pontuais, chegam para viver. Os encontros com governantes (a ministra prometeu convidá-lo para um almoço em breve, revela) não passam de exceções numa vida de dificuldades, e Paulo sabe-o. "Não quero que quem ainda vive na rua pense que somos mais do que eles, até porque não sei o dia de amanhã".
Ministra quer "resposta individual" aos sem-abrigo
"O grande objetivo é dar resposta individual" a cada sem-abrigo a nível de alojamento, saúde e emprego, disse a ministra do Trabalho. Ana Mendes Godinho lembrou também que está a ser preparada "uma plataforma para garantir o acompanhamento de todas as pessoas" e destacou a importância das respostas a nível local.