Várias escolas resolveram celebrar o último dia de aulas do 2.º período com missas pascais. Vieira do Minho, Famalicão, Bragança, Viana do Castelo ou Vila Real foram alguns dos concelhos.
Corpo do artigo
Os agrupamentos públicos devem fechar a porta à religião? Ministério e diretores invocam a autonomia e tradição para decidir. As associações República e Laicidade e Ateísta consideram um atentado à Constituição, que impõe neutralidade ao ensino público.
A Câmara de Vieira do Minho, por exemplo, explicou, num comunicado, que as "celebrações foram preparadas e dinamizadas pelos alunos, pais e professores assumindo-se como um verdadeiro momento de alegria, onde a tradição cristã se voltou a cumprir".
Os agrupamentos não têm de pedir autorização à tutela para realizar uma missa dentro de portões. O Ministério da Educação (ME) confirma que a decisão "é gerida no quadro da autonomia de cada escola". Apesar de, "por imperativo constitucional, as escolas públicas não poderem impor qualquer orientação confessional aos alunos, devendo respeitar o pluralismo dos territórios". A participação deve ser autorizada pelos pais.
Os representantes dos diretores sublinham que celebrações ou festas são aprovadas no plano anual de atividades pelos conselhos gerais, onde estão, além da direção e professores, pais e alunos. "Participa quem quer, não pode ser obrigatória", insiste Manuel Pereira, da Associação de Dirigentes Escolares (ANDE). Filinto Lima, da Associação de Diretores de Agrupamentos e Escolas (ANDAEP), defende que "devem ser dadas oportunidades a todas as confissões religiosas".
Já para o presidente da Associação República e Laicidade, "é uma situação lamentável". "Uma tentativa de instrumentalização da escola pública". Para Ricardo Alves, a religião não deve entrar nos agrupamentos. Pelo país, assegura, ainda há estabelecimentos com crucifixos nas paredes. O ME, reivindica, devia emitir uma circular a proibir a fixação de "simbolismos religiosos e a realização de cerimónias dentro das escolas públicas. Seria muito simples e clarificador".
Queixas de pais
À Associação Ateísta Portuguesa, garante Carlos Esperança, chegam queixas de pais cujos filhos se sentem pressionados a matricular-se na disciplina de Educação Moral e Religiosa e em atividades como as missas pascais. Este tipo de celebrações, considera, são "claramente atentatórias da letra e espírito da Constituição".
A disciplina de Educação Moral e Religiosa é de oferta obrigatória pelas escolas mas a frequência é facultativa. Para Fernando Moita, do Secretariado Nacional da Educação Cristã, "esta questão das missas no final de cada período, como outras atividades, diz apenas respeito a cada comunidade educativa".
Respeito pela tradição
Vieira do Minho O diretor do Agrupamento de Escolas Vieira de Araújo, Fernando Gomes, diz que a atividade pascal no último dia de aulas é "uma tradição que parte dos pais dos alunos". "Temos que manter a imparcialidade. Não potenciamos, mas também não contrariamos", sublinhou.
Compasso em 27 escolas
Famalicão No último dia de aulas, o compasso visitou as 27 escolas do Agrupamento D. Maria II, em Famalicão. Ninguém foi obrigado a participar e só colaboraram na iniciativa os alunos que quiseram.
Momentos de reflexão
Viana do Castelo Alunos das escolas de Lanheses, em Viana do Castelo, Arcos de Valdevez e Ponte da Barca participaram em cerimónias religiosas. Fonte da diocese afirma que "por norma são celebrações da palavra e reflexão com os alunos em espaços externos às escolas".
Agrupamentos participam
Bragança A comunhão pascal é facultativa no Agrupamento de Escolas Miguel Torga. Nos restantes agrupamentos do concelho também se realiza.
Em horário letivo
Vila Real A missa acontece em horário escolar, mas o subdiretor do Agrupamento de Escolas Diogo Cão, Licínio Pereira, ressalva que "é uma atividade como outra qualquer".
Cortejo pela freguesia
Vila do Conde No Agrupamento de Escolas Dr. Carlos Pinto Ferreira, na Junqueira, em Vila do Conde, no último dia de aula, alunos, professores e funcionários da EB 2,3 foram em cortejo até à igreja do Mosteiro de S. Simão da Junqueira para assistir à missa.
Laicidade não proíbe cerimónias nas escolas
Para PSD, PS e CDS, a laicidade do Estado não obriga as escolas a proibirem a realização de cerimónias religiosas dentro dos estabelecimentos. Celebrações como as missas pascais são aceites pelas três bancadas, desde que a participação dos alunos não seja obrigatória e todos tenham autorização dos pais. "É uma questão de autonomia", resumem as deputadas Margarida Mano, Susana Amador e Ana Rita Bessa. O PCP optou por não comentar.
"A escola não existe para ser espaço de cerimónias religiosas", mas ser uma "escola laica não impede determinadas cerimónias", defende Margarida Mano (PSD). Para a ex-ministra da Educação, as escolas têm autonomia para decidir, tendo em conta o contexto das suas comunidades educativas. O Ministério da Educação (ME), considera, só pode intervir se houver queixa de que as celebrações foram impostas. O JN não conseguiu obter uma reação do BE.
Local é "indiferente"
Para a deputada do CDS Ana Rita Bessa, "ser dentro ou fora das escolas é indiferente". O critério, defende, deve ser o caráter facultativo. "Se for obrigatório, é inadequado", pois a religião não faz parte do projeto educativo de um agrupamento público. "O facto de haver liberdade religiosa e de a escola pública ser laica não implica apagar todas as manifestações religiosas."
O PS, assume a deputada Susana Amador, revê-se na posição do Governo e do ME. Ou seja, apesar de, por imperativo constitucional, as escolas públicas não poderem impor qualquer orientação confessional, a participação dos alunos em cerimónias religiosas é permitida no âmbito da autonomia da escola.
*com A.P.F., A.T.M., E.M., S.F. e S.B.