Montenegro diz ter cedido ao PS no Orçamento "até ao limite do razoável". Ir mais além será "ofensa"
O primeiro-ministro afirmou, esta quarta-feira, que o Orçamento do Estado (OE) representa um "compromisso" com o PS "até ao limite do razoável". Luís Montenegro considerou que ir mais além será "uma ofensa" aos eleitores e ajustou contas com os Governos socialistas: agora, "há vida e objetivos para além do excedente".
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"Este é o primeiro OE em muitos anos que não aumenta um único imposto", afirmou o chefe do Governo, no arranque do debate do Orçamento na generalidadade, recebendo palmas da bancada do PSD. Considerou que o documento garante "contas equilibradas, redução de impostos, capacidade reformista, investimento nos serviços públicos e a melhoria das condições de vida dos portugueses".
Já de olho na discussão na especialidade, Montenegro avisou: ir "para além" da proposta do Executivo "em aspetos essenciais, seja na generalidade, na especialidade, no tocante à margem orçamental ou na direção política governativa, descaracterizaria o OE" e seria "uma ofensa" aos eleitores que escolheram ser governados pela AD.
O primeiro-ministro quis também assinalar um separar de águas entre os nove anos do PS no poder e o seu Governo. Aludindo à retórica das contas certas - que se tornou uma das maiores bandeiras de António Costa, sobretudo durante a maioria absoluta -, atirou: "De que serviram contas certas se, apesar de os portugueses estarem asfixiados em impostos, o Estado engordava e os serviços públicos definhavam?". Foi ovacionado pela bancada social-democrata.
No entender de Luís Montenegro, esta é mesmo, "talvez, a maior das diferenças" entre a AD e o PS: "Para este Governo, há vida e objetivos para além do excedente orçamental", atirou, continuando a procurar marcar a diferença face ao passado recente de António Costa.
PS diz que crescimento ficará "longe" do prometido. Montenegro insiste nos 3% em 2028
O líder do PS, Pedro Nuno Santos, lembrou que, na campanha eleitoral, Montenegro acusava os socialistas de serem "pouco ambiciosos" no plano económico e "prometia um crescimento a rondar os 3%" em 2028. "Na altura dissemos que era irrealista, o sr. primeiro-ministro não quis saber", referiu. Acrescentou que, no Plano Orçamental de Médio Prazo agora entregue a Bruxelas, a trajetória de crescimento não só está "longe" dos 3% como até se situa "abaixo da média" dos valores alcançados pelo PS.
Sustentando que o Governo "herdou" a folga orçamental dos socialistas, Pedro Nuno Santos referiu que "a generalidade" das reformas estruturais do atual Executivo também "já estavam previstas" pelo seu partido. Quis ainda saber "qual é a reforma estrutural nova" que fará o crescimento "duplicar" e ir ao encontro do que tinha sido prometido.
Em resposta, Montenegro troçou: "O sr. deputado gostava mais de ter uma economia dirigida pelo Estado", no qual este "escolhesse os investimentos". O Governo, pelo contrário, limita-se à função de "estimular" as empresas e o crescimento, contrapôs. Garantiu que o objetivo de um crescimento a rondar os 3% em 2028 e mantém "intacto" e, sobre as reformas estruturais, respondeu, em nova crítica ao PS, que o tempo das "reformas de papel" acabou.
Pedro Nuno Santos quis ainda saber como irá o Executivo resolver a "falta gritante" de médicos e professores, tendo em conta que foi anunciada a reposição da regra de só poder ser contratado um funcionário público por cada um que sai. Para já, o primeiro-ministro não tocou nesse tema.
Ventura reclama estatuto de "maior partido da Oposição" e diz que PS "sustenta Governo"
André Ventura, líder do Chega, começou por reclamar o estatuto de "principal partido da Oposição", considerando que, ao viabilizar o OE, o PS passou a ser "o partido que sustenta o Governo". Defendeu que o Orçamento "continua a mesma lógica de dar com uma mão e tirar com a outra", por dar em IRC e IRS Jovem o que irá "sacar em impostos indiretos sobre o consumo".
Ventura utilizou boa parte do tempo disponível a falar dos tumultos da Grande Lisboa, frisando que os polícias foram "achincalhados" e acusando o Governo de não estar ao lado das autoridades. Depois, quando se preparava para falar das suas propostas para o OE, o tempo chegou ao fim e o microfone, como agora é regra para todos, desligou-se. O líder do Chega disse ter sofrido "censura".
A observação de Ventura sobre o PS levou à intervenção de Montenegro: "O maior partido da Oposição é o PS, não há dúvida. É uma questão matemática e objetiva", referiu, lembrando que não existe qualquer "acordo político" entre AD e socialistas. Afirmou que o Chega joga no "campeonato das equipas que não querem descer", já que "fica satisfeito" por ser "o que faz mais oposição".
No que toca à polícia, Montenegro acusou Ventura de estar mal informado, uma vez que o Governo está "em reunião permanente" com as autoridades (o líder do Chega alegava que o Executivo só teria reunido com representantes dos bairros). O primeiro-ministro observou que, enquando o Chega fomenta "o ódio de uns contra os outros", o Governo esforça-se para dar condições de vida "a todos".
IL diz que OE é "socialista", Esquerda critica benefícios fiscais
Rui Rocha, da IL, descreveu o OE como "socialista", considerando que é "em tudo semelhante" às posições do PS em matéria de despesa corrente, fiscalidade e Função Pública. Também quis saber se o Governo acredita nas metas de crescimento da ordem dos 3% para 2028 ou se irá usar as cedências ao PS "como desculpa" para não as atingir.
"Não esperava que se tornasse socialista tão depressa após chegar ao Governo", reforçou o líder liberal, dirigindo-se a Montenegro. Recordando um cartaz de 2023, onde o PSD pedia para o PS "descer impostos já", confrontou o Executivo com o facto de, agora, se congratular meramente por não subir impostos. "Não foi isto que disseram aos portugueses", frisou, justificando o voto contra da IL. O primeiro-ministro não escondeu "alguma desilusão" com o posicionamento dos liberais.
A líder do BE, Mariana Mortágua, acusou o Governo de se preparar para vender 900 milhões de euros de património público "para ter receita para pagar benefícios fiscais aos mais ricos". Também criticou o facto de o Executivo pretender mudar a lei do trabalho em funções públicas "sem dizer para quê", podendo mexer em questões como o direito à greve, o subsídio de doença ou as férias. Insurgiu-se contra o IRS Jovem, referindo os futebolistas como exemplo de jovens ricos que beneficiarão com esse regime.
Paulo Raimundo, secretário-geral do PCP, considerou que o OE é "abençoado pelo grande patronato" e "um estímulo aos baixos salários". Considerou que a prioridade do documento é "distribuir 1800 milhões de euros em benefícios fiscais, entregar 1500 milhões de euros em parcerias público-pribadas e transferir metade do orçamento do SNS".
Isabel Mendes Lopes, líder parlamentar do Livre, pediu para os partidos deixarem de estar "amarrados na pequena política de intriga" e discutirem "a criação de uma agência portuguesa para a Inteligência Artificial", que considerou "um dos maiores desafios do séc. XXI". O primeiro-ministro disse estar disponível para o fazer.