Fim de semana com 140 óbitos em excesso com termómetros no vermelho. Hospital de S. João avança com plano interno para temperaturas adversas.
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A mortalidade por todas as causas está novamente acima do esperado, com 140 óbitos em excesso no passado fim de semana. Com a esperada subida das temperaturas nos próximos dias, com grande parte do país com máximas acima dos 40º C, aumenta o risco de incêndio e de descompensação das populações mais vulneráveis, nomeadamente os idosos. Até sexta-feira, Portugal está em situação de contingência, apelando António Costa à "responsabilidade de cada um".
De acordo com os dados do sistema de vigilância da mortalidade eVM (recolhidos às 15.30 de ontem), a mortalidade estava, no domingo, "acima do esperado", registando-se 680 óbitos no fim de semana, metade dos quais de pessoas com 85 ou mais anos de idade. Ao JN, o matemático Carlos Antunes calcula um excesso, face à média 2015-2019, de 84 óbitos no sábado e de 92 no domingo. Expurgando as mortes por covid, são 140 os óbitos em excesso naquele período.
Segundo o professor da Faculdade de Ciências de Lisboa, desde o início da semana passada que se verifica "uma tendência de excesso que se acentuou nos dias 9 e 10". Sendo que, sublinha, "sempre que há uma onda de calor, há picos de mortalidade". Tendo em conta as previsões para os próximos dias, com Coruche (Santarém) a poder chegar aos 46.º C na quinta-feira, "é expectável que nos próximos dias se registem 80 a 100 óbitos acima da média".
"Impacto significativo"
Outro indicador que aponta para o possível agravamento da mortalidade é o Índice Ícaro, que desde 2004 integra o Plano de Contingência da Ondas de Calor. Na prática, recorda ao JN o Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, "é uma medida numérica do risco potencial que as temperaturas ambientais elevadas têm para a saúde da população, podendo levar ao óbito". Um valor igual ou superior a 1 "indica que se espera um efeito sobre a mortalidade significativo". Às 15.30 horas de ontem, o Ícaro estava nos 0,68 para hoje e 1,05 para amanhã. A 7 de julho de 2013, quando uma onda de calor causou quase 1700 mortes, aquele índice chegou aos 11,79.
S. João ativa plano
No Centro Hospitalar Universitário de S. João, no Porto, a Urgência "tem assistido a um aumento" da procura, com um "maior número de idosos desidratados", "mas nada quantificável". Segundo fonte oficial, o CHUSJ está a "implementar o plano interno para temperaturas adversas". No Centro Hospitalar Lisboa Norte, que agrega o Hospital de Santa Maria, "não se sente um grande número de casos" de doentes descompensados pelo calor.
Para o presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, além do foco na "preparação dos hospitais, que devem ativar os seus planos de contingência para fazer face ao aumento da procura que se espera", importa proteger as populações mais vulneráveis. "As pessoas mais velhas, com patologia crónica, comorbilidades, muitas delas isoladas deviam ser um foco não só da Saúde, mas de toda a rede social". Defendendo a sua identificação, tanto mais que, diz Xavier Barreto, "muitas não têm condições habitacionais para estarem em segurança com temperaturas de 45º C - tem que haver respostas para estas pessoas, eventualmente até abrigos climatizados".
O bastonário da Ordem dos Médicos, por sua vez, defendeu, em declarações à Renascença, o reforço dos serviços de urgência na iminência de um aumento da procura. Para Miguel Guimarães, nesta altura as autoridades de saúde já deviam ter emitido "avisos às pessoas", antecipando um aumento da mortalidade.
Em périplo pela região Centro para se inteirar das operações de combate aos incêndios no terreno, o primeiro-ministro voltou a apelar à responsabilidade de cada um. "Ninguém pode estar descansado relativamente aos riscos de incêndio", disse António Costa.