Medidas visam minimizar o problema da falta de médicos de família, permitindo à população aceder a consultas gratuitas ou a preços reduzidos.
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A carência de médicos de família está a levar alguns municípios a criar planos de saúde para a população, que garantem o acesso a cuidados gratuitos ou a custos reduzidos. Há também autarquias com incentivos para a fixação de médicos, que vão desde a cedência de casa, a comparticipação para despesas com habitação e deslocações, passando por creche e ATL gratuitos para os filhos ou a ajudas pecuniárias.
Entre as autarquias que responderam ao JN, há oito que disponibilizam planos de saúde: Amadora, Cascais, Figueira de Castelo Rodrigo, Idanha-a-Nova, Oeiras, Lisboa, Porto de Mós e Vila Velha de Ródão. Óbidos aprovou recentemente a medida, que deverá entrar em vigor nos próximos meses, o mesmo acontecendo com Penela, Torres Novas, Alenquer e Castelo de Paiva. Os municípios de Proença-a-Nova e de Cabeceiras de Basto admitem avançar com um programa desta natureza.
Os modelos variam de concelho para concelho. Em alguns, como é o caso de Lisboa, a medida abrange moradores com mais de 65 anos e inclui assistência médica ao domicílio. Os beneficiários do complemento solidário para idosos têm também acesso gratuito a consultas de oftalmologia, optometria e medicina dentária, bem como a óculos e próteses.
Diversificação
Na Amadora, os beneficiários são também pessoas acima dos 65 anos ou outros reformados e o programa contempla consultas gratuitas ao domicílio ou na clínica da associação de socorros médicos "O vigilante" e teleconsultas. Em Oeiras, o plano envolve consultas ao domicílio, entre as 20 e as 8 horas, para munícipes com 65 ou mais anos, com carência económica e portadoras do cartão 65+.
No caso de Figueira de Castelo Rodrigo o programa abarca toda a população e mais de 20 especialidades médicas e 50 tipos de análises gratuitas. O Município financia ainda um programa para operações às cataratas, que no primeiro ano chegou a 90 pessoas.
Em Idanha-a-Nova, o plano é também para todos os residentes, com serviços gratuitos (enfermagem, consultas de clínica geral e de especialidades prescritas na Casa de Saúde local ou na Unidade Móvel) e outros a preços reduzidos (15 euros por médico ao domicílio e desconto de 50% em TAC, ecografia e raio-X).
No concelho de Vila Velha de Ródão, o programa Saúde Mais permite aos habitantes terem consultas gratuitas de clínica geral, que têm lugar quinzenalmente em cada uma das freguesias.
O plano de Cascais abrange "todos os 214 mil residentes e os seus animais domésticos" e disponibiliza teleconsultas de medicina geral e de pediatria, bem como aconselhamento veterinário. Quem não tem médico de família pode recorrer à Cabine de Saúde, no pavilhão Abóboda, que assegura cuidados médicos através de uma parceria entre Câmara e Misericórdia. Os portadores do cartão Viver Cascais têm ainda disponíveis serviços médicos (45 euros) e de enfermagem (a partir de 35 euros) ao domicílio.
Se fosse para o hospital seriam horas de espera
Em casa de Dolores Parreira, foi a neta Sara a primeira a usufruir do plano de saúde criado, no ano passado, pelo Município de Porto de Mós. Depois de vários dias com febre, a menina, de três anos e meio, começou a evidenciar dificuldades respiratórias. "Nessa altura, havia o caos nas urgências. Sabia que se fosse para o hospital seriam horas de espera", conta a avó, que acabou por acionar o serviço de médico ao domicílio.
Foi informada que iriam demorar "um pouco mais do que o normal", mas ao final do dia a menina já tinha sido observada por um clínico e estava medicada, com a consulta a custar 15 euros. "O médico veio a casa. Foi excelente. Nem imagino o que iria penar se tivesse de ir às urgências", diz Dolores, residente em Mira de Aire que, quando aderiu ao plano, não tinha médico de família.
Depois da neta, também a mãe, de 77 anos, já usufruiu do cartão para uma consulta de neurologia no privado. "Infelizmente, se fosse através do SNS, talvez ainda estivesse à espera".
Foi também por pretender uma solução mais rápida que Eduardo Cunha ativou o plano de saúde municipal para fazer duas ressonâncias. Conta que, após a infeção por covid-19, em outubro último, ficou "um pouco mal, com uma dor no ombro e na cervical".
Poupou 160 euros
Sem médico de família, esteve um dia no centro de saúde para conseguir uma consulta de intersubstituição, com o médico a prescrever-lhe uma ecografia aos tecidos moles.
"Teria de esperar três ou quatro meses e precisava de trabalhar. Acabei por recorrer ao privado", revela Eduardo Cunha, que com o cartão poupou 160 euros nos exames, além do desconto na consulta. "Não devia ser necessária, mas é uma boa medida. O ideal era termos um SNS que respondesse, mas nessa ausência de resposta, este tipo de programas ajudam", defende.
Quase 6900 beneficiários
Em vigor há nove meses, o plano de saúde de Porto de Mós é gratuito para todos os residentes e conta com 6893 beneficiários, ou seja, "quase um terço da população" do concelho.
O presidente da Câmara, Jorge Vala, explica que o programa pretende assegurar à população cuidados de saúde primários a custos "acessíveis".
O objetivo "é que as pessoas encontrem aqui uma solução mais rápida e que não deixem de fazer exames, rastreios, consultas, devido aos problemas do SNS com os quais nos deparamos em muitas das freguesias do concelho", salienta o autarca, que considera que este "é um projeto bem-sucedido".