Farmacêutica espanhola é pioneira no desenvolvimento de medicamentos para tratar o cancro a partir de invertebrados marinhos e tem em Madrid o maior banco do Mundo do género.
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“Sempre acreditamos que o mar podia ser fonte de novos medicamentos para o cancro.” Era esta a visão de José Maria Fernández que há 39 anos fundou a PharmaMar, farmacêutica espanhola pioneira na investigação, desenvolvimento e comercialização de tratamentos oncológicos derivados de fontes marinhas. A recolha invertebrados começou em 2007 e, desde então, já foram realizadas 200 expedições em 35 países e, nos laboratórios da empresa, em Madrid, estão armazenados 500 mil amostras naquele que é maior banco do género a nível mundial.
O processo é complexo e longo, nunca menos de 10 a 15 anos, como todos os que levam ao desenvolvimento de novos medicamentos. Mas tudo começa com a procura de novas fontes marinhas, o que implica mergulhar em colaboração com as autoridades locais, explica José Maria Fernández, ele próprio mergulhador. As organizações internacionais impõem protocolos e regras rígidas sobre a exploração de recursos marinhos e definem benefícios futuros caso a PharmaMar desenvolva medicamentos a partir das amostras recolhidas num determinado país – podem ser royalties ou transferência de tecnologia ou bolsas de estudo, no caso de países em vias de desenvolvimento.
Depois de feita a colheita (não mais de cem gramas) e feita a catalogação e georreferenciação (no registo da patente, é obrigatória a indicação da origem), a amostra é transportada para Espanha para armazenamento. O passo seguinte é sintetizar a molécula e testar se tem atividade antitumoral, explica Carmen Cuevas, diretora de Investigação e Desenvolvimento na PharmaMar. “As amostras são primeiro testadas para quatro dos tumores mais frequentes: cólon, mama, pulmão e pâncreas. Sabemos que 70% não se mostram efetivas nos primeiros ensaios. São guardadas para o futuro”, sustenta a investigadora.
O primeiro sucesso veio das águas tropicais do Caribe. Em 2001, foi concluído o processo de síntese da trabectedina, derivada do invertebrado ecteinascidia turbinata, e, seis anos mais tarde, o Yondelis (nome comercial da trabectedina) é aprovado na Europa para o tratamento do sarcoma dos tecidos moles, tornando-se o primeiro tratamento antitumoral de origem marinha espanhol aprovado a nível mundial. Esta ascídia marinha veio a revelar-se especialmente profícua já que serviu de base ao desenvolvimento de outros fármaco: o Zepzelca (designação da lurbinectedina), que ataca o cancro do pulmão de células pequenas, e o ecubectedin, em fase de ensaios para carcinomas sólidos, nomeadamente da próstata.
Já o Aplidin (plitidepsina) foi desenvolvido a partir do invertebrado aplidium albicans, que se encontra no Mediterrâneo, ao largo das Baleares, e está indicado principalmente para o tratamento do mieloma múltiplo.
“O objetivo é desenvolver produtos com mecanismos de ação diferentes, isto é, encontrar novas formas de combater o cancro", resume Carmen Cuevas. A busca por novas armas contra o cancro já passou pelos Açores e as Ilhas Desertas e continua. Em 2020, foram diagnosticados 18 milhões de novos casos de cancro a nível mundial. Em 2040, estima-se que o número aumente para 28 milhões.