A Associação Nacional das Farmácias (ANF) tem uma nova presidente. A lista liderada por Ema Paulino, 45 anos, rompe com a atual direção, quer uma avaliação externa ao universo empresarial da associação e a divisão de competência entre quem dirige e quem gere as empresas.
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Acusou a anterior direção de ter deixado a ANF numa situação financeira insustentável. A realização de uma auditoria externa vai ser a principal medida da sua equipa?
Vai ser uma das primeiras. No nosso programa eleitoral incluímos medidas que queríamos implementar nos 100 primeiros dias do mandato. A auditoria é uma delas porque, sem uma auditoria, sentimos que não estamos capacitados para tomar decisões ao nível do funcionamento do universo empresarial da ANF e mesmo em relação à própria associação. Uma auditoria será o ponto de partida para todas as decisões que teremos de tomar, para retomar uma situação de tesouraria que nos permita cumprir com todos os nossos compromissos de futuro.
Quais são as restantes?
Temos a proposta de alteração estatutária, que no fundo também reflete a nossa preocupação com o universo empresarial. Pretendemos introduzir essa separação de forma clara. Os estatutos da ANF foram maioritariamente construídos numa altura em que ainda não havia o universo empresarial e, portanto, não refletem esse crescimento. Estes novos estatutos vão clarificar quais é que são as responsabilidades da direção e as do universo empresarial, em que estão uma série de empresas que devem ser geridas de forma responsável.
Depois temos outras questões mais relacionadas com o dia-a-dia das farmácias. Queremos apresentar uma proposta ao Ministério da Saúde no que toca à regulamentação dos circuitos de dispensa de medicamentos ao domicílio. Foi algo que, no contexto de pandemia, surgiu como uma situação de emergência, mas para a qual falta regulamentação específica que assegure a supervisão por parte de um farmacêutico.
E rever o programa de fidelização das farmácias portuguesas - Programa Saúda - do ponto de vista do modelo de financiamento e de funcionamento para o cidadão.
Faz sentido a associação manter um universo empresarial tão diversificado?
Faz, se cumprirem dois propósitos. Por um lado, na sua área de atuação, serem pioneiras e introduzir inovações no mercado, que beneficiem o funcionamento das farmácias. E, por outro lado, que deem resultados positivos que possam ser utilizados em projetos nas farmácias.
Por exemplo, temos uma empresa na área tecnológica que foi sempre importante para garantir que temos inovação nas farmácias e que os sistemas informáticos acompanham as necessidades tanto do ponto de vista do próprio "back office" das farmácias (assegurar que têm os medicamentos necessários) e de ligação a outros sistemas e a outros serviços de saúde.
Temos uma participação numa empresa no setor de distribuição, que também nos parece importante na medida em que é uma forma de introduzirmos inovação e dar mais escolhas às farmácias, em termos da distribuição de medicamentos, sobre os fornecedores com quem querem trabalhar.
E também uma na área da inteligência de mercado, que gera informação a partir dos dados de dispensa das farmácias, e não só. E que tem um enorme potencial que no nosso entender tem sido subaproveitado. Mas essa empresa é uma daquelas que nos suscita maior preocupação, porque tem tido resultados negativos muito por tentativas de uma internacionalização que não funcionou bem em determinados mercados.
Aqui a questão é de centrar nestas empresas, que servem estes dois propósitos, e ver se há outras participações noutras empresas que não os cumpram.
Mostrou-se preocupada com a situação das farmácias do interior. Como acha que se podem tornar sustentáveis?
A coesão territorial é uma das nossas prioridades. Temos farmácias que servem zonas com pouca densidade, mas que são fundamentais para a população porque já não existem mais recursos de saúde. Os centros de saúde fecharam e portanto as pessoas recorrem muito à farmácia, que são a porta de entrada no sistema de saúde e muitas vezes são a instituição que lhes dá resposta. Temos que garantir que essas farmácias se mantêm abertas e com o nível de serviço que se adequa às necessidades daquela população. Para isso, vamos ter certamente projetos associativos e também temos de interagir mais com os órgãos de poder local, que têm todo o interesse em manter as farmácias nas suas freguesias abertas para dar suporte à população.
Teve o apoio do fundador da ANF, eleito presidente da Mesa da Assembleia Geral. Isto não pode ser lido como um regresso ao passado?
Para mim é um honra poder contar com o dr. João Cordeiro. O histórico que traz, e o conhecimento e a visão que sempre teve sobre o futuro, é motivo de grande orgulho e sem dúvida que vou recorrer aos seus aconselhamentos. De qualquer forma, lidero esta equipa com ideias novas, frescas, que também trago da minha própria experiência. Esperemos que seja um regresso ao passado, numa perspetiva de recentrar a atividade da associação nas farmácias e numa visão sempre de futuro.
Segundo o comunicado da ANF, esta foi uma das eleições mais participadas. É sinal de que fazia falta uma mudança?
Nós sempre tivemos uma participação bastante elevada nas eleições e eu penso que o facto de haver duas listas é um sinal de vitalidade e dinamismo. Eram duas listas que tinham ideias opostas em relação aos estatutos e em relação ao modelo de gestão e liderança da ANF. Mas sem dúvida que somos duas listas que sempre tiveram o máximo interesse da associação e das farmácias em mente.
Eu gostaria de poder, durante o mandato, dar mais voz às farmácias e encontrar outras formas de se poderem exprimir, além das eleições, e contribuir para os desígnios da sua associação. Para que se sintam também cada vez mais envolvidas e responsáveis pelo seu próprio futuro.