Variantes brasileira e sul-africana têm uma mutação que pode conduzir a menor atuação dos anticorpos das células humanas.
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O estudo sobre a diversidade genética do SARS-CoV-2 detetou mais um caso da variante da África do Sul em Portugal, elevando, assim, o número para dois. O primeiro caso foi detetado a 22 de janeiro. Tratava-se de um homem que tinha regressado ao país a seguir ao Natal, oriundo daquele país africano.
No mais recente relatório da investigação a cargo do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA) e do Instituto Gulbenkian de Ciência, publicado sexta-feira, lê-se que "até à data" foram descobertos dois casos da estirpe associada à África do Sul. "Esta observação sugere que a circulação desta variante ainda é limitada em Portugal", explica o documento, que não revela quando foi detetada. Apenas é dito que nenhum caso foi encontrado na amostragem de entre 10 e 19 de janeiro. No mesmo período, foi detetada uma frequência de 16% da variante associada ao Reino Unido, na amostragem nacional, para a qual foram analisadas 532 sequências genéticas. A variante associada ao Brasil ainda não foi encontrada.
De 60% a 90%
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João Paulo Gomes, coordenador do estudo, explicou ao JN que a presença da variante do Reino Unido "era muito modesta" no país durante o mês de dezembro. Mas que, no início do ano, começou a aumentar muito rapidamente, a uma taxa de crescimento semanal de 60%, que depois chegou a 90%. O que levou os investigadores a prever uma prevalência de 65% da estirpe no total de casos diagnosticados neste mês de fevereiro. O especialista do INSA sublinhou, no entanto, que a tendência será para estabilizar. E que as medidas de confinamento podem alterar esta previsão.
A variante do Reino Unido partilha uma mutação com as da África do Sul e do Brasil, que é, explicou o cientista, na proteína de superfície - spike - num "dos locais que o vírus utiliza para se ligar às nossas células" (posição 501). Essa mutação "faz com que o vírus entre melhor, mais rapidamente e com mais facilidade" nas células humanas. "As pessoas terão mais carga viral e mais facilmente a passarão a um contacto".
Mutação extra
Mas as outras duas não se ficam por aí. É que as estirpes brasileira e sul-africana partilham uma outra mutação extra (na posição 484) que, além de também permitir uma maior transmissibilidade, "estudos em laboratório parecem ter demonstrado que quando os vírus eram postos em contacto com soros de pessoas imunes, que já tinham anticorpos, a reatividade era menor. Ou seja, alguns desses anticorpos não se ligavam tão bem ao vírus", esclareceu João Paulo Gomes.
Esta conclusão levou a comunidade internacional a dizer que as duas variantes "serão potencialmente mais perigosas". Além de a mutação que favorece a transmissão como a do Reino Unido, têm outra que "não só está no sítio de ligação do vírus às nossas células, como também parece estar envolvida no processo de fuga de alguns dos nossos anticorpos".
Testes PCR detetam três regiões do vírus
A grande maioria dos testes de diagnóstico PCR realizados em Portugal detetam três regiões do vírus. E uma dessas regiões é a do gene "S", onde ocorre a mutação detetada na variante do Reino Unido. "Foi uma casualidade" contou João Paulo Gomes. Mas esse facto permite que os investigadores, através de parceria com uma rede de laboratórios, consigam, diariamente, "perceber o número de testes que são realizados, em que localidades foram realizados, e quantos destes dos positivos representam a variante britânica", adiantou. O mesmo não acontece com outras estirpes, como as do Brasil e da África do Sul. "As empresas estão agora a desenvolver métodos de diagnóstico para os pesquisarem especificamente", revelou o investigador do INSA. Até esses métodos serem desenvolvidos é necessário "sequenciar o genoma de muitos casos de covid-19" para perceber se estão a circular ou não. Para os investigadores começarem a procurar uma determinada estirpe é preciso que esta tenha "alguma representação epidemiológica".
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