Eurodeputado desde 2009 Nuno Melo é visto como o candidato preferido na corrida pela liderança do CDS-PP. Caso seja eleito, garante que só fica dois mandatos e que não vai receber "um cêntimo" do partido.
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Os seus adversários associam-no, em tom crítico, ao portismo. Recusa ser um "herdeiro" mas tem lembrado que foi com Paulo Portas que o CDS-PP teve os melhores resultados eleitorais. Em que ficamos? Se for eleito, será o regresso do portismo ou o início de uma nova tendência?
O CDS teve o pior resultado da sua história, fomos varridos do mapa parlamentar. Acredito profundamente que vamos dar a volta às atuais circunstâncias. Vamos devolver o CDS ao lugar que se justifica do ponto de vista democrático mas, vamos fazê-lo, a olhar para a frente, a projetar o CDS no futuro e a fazer oposição ao PS e às esquerdas. Não é a olhar para o passado e a falar para dentro, sempre preocupados com o retrovisor, Portanto, o que os meus adversários digam de mim a mim não me interessa nada. Interessa-me é aquilo que sei que sou e o que pretendo fazer, que é unir, acrescentando e trazer para o partido muitas outras pessoas que estão disponíveis e têm muita qualidade.
Tem prometido o regresso ao partido de quem saiu. Já falou com eles? Estão disponíveis para regressar? E em que moldes?
Falei com muitos, pelo menos, seguramente com os nomes mais visíveis. Nuns casos, voltarão ao CDS. Noutros continuarão ligados espiritualmente ao CDS, não voltam ainda por entenderem que não é ainda o momento.
Quando diz que quer que o CDS volte a ser "um partido de quadros de qualidade" está a falar na captação de independentes, novos filiados ou no aproveitamento de figuras já existentes?
A ideia é ir buscar. Quero um partido com bases fortes e motivadas, mas, ao mesmo tempo, um partido que volte a ser o que foi nos seus melhores momentos, ou seja, um partido com quadros que toda a gente reconhece. Quero ligar o CDS à sociedade através dos melhores quadros, em cada área setorial. Hoje, se perguntar na rua algumas ideias nítidas e identitárias do CDS, as pessoas não conseguem identificar, menos ainda rostos como no passado existiam. A minha preocupação é tornar o CDS num partido do século XXI, abrir a porta a independentes, trabalhar com os melhores do CDS e aproveitar aqueles que, sem a ambição de serem deputados ou dirigentes, querem apenas que as suas ideias não morram numa espécie de mesa de café.
Mas pretende criar uma espécie de governo-sombra?
A ideia é ter pessoas capazes. Vou dar alguns exemplos. Na minha moção, a parte da agricultura foi feita pelo engenheiro Luís Mira, que é secretário-geral da CAP. A par do engenheiro Luís Mira, que é independente, temos pessoas como o prof. Nuno Vieira Brito, que foi secretário de Estado da Agricultura, ou de Mário João Araújo Silva, que foi o número dois da Direção-Geral de Agricultura do Norte. Ou ainda de pessoas como Francisco van Zeller que faz os melhores vinhos deste país, ou Francisco Pavão que faz os melhores azeites deste país. Ou seja, pessoas do setor que o país conhece. Na saúde, João Varandas Fernandes, cirurgião que gere um dos principais hospitais do país; Isabel Galriça Neto, a referência dos cuidados paliativos em Portugal; António Marinho que é um muito conhecido otorrinolaringologista; o professor Queiroz e Melo que fez o primeiro transplante cardíaco em Portugal. Na economia e finanças, temos pessoas como Cecília Meireles ou Paulo Núncio, que foi secretário dos Assuntos Fiscais; Miguel Morais Leitão, que gere um dos principais bancos de Portugal; José Teotónio, que é o CEO do grupo Pestana; João Pedro Tavares, que é o número dois da Accenture.
E o partido em si não tem também que se modernizar, nas suas estruturas e na forma como comunica?
Naturalmente. Tenho dito muitas vezes que o CDS tem que ser um partido moderno do século XXI. Isso implica muita coisa. Na renovação dos seus quadros, desde logo perceber-se que o partido tem que ser renovado com homens e com mulheres, mas também com jovens. Partidos como o CDS perderam votos principalmente no eleitorado jovem e nas mulheres. Temos que ser capazes de recuperar aqueles votos. O partido tem que ter nos seus militantes pessoas que estão motivadas, que estão porque querem, que têm o direito de eleger e ser eleitos mas também de ajudar o partido numa situação que todos sabem que é terrível.
Refere-se ao pagamento de quotas?
O que quero é que as pessoas ajudem no financiamento do partido, pagando quotas, que têm outra vantagem: acabar com uma lógica que tem penalizado muito os partidos antigos em Portugal que são os sindicatos dos votos. Prefiro ter menos militantes inscritos mas saber que os que tenho são verdadeiros e não estão, por exemplo, também filiados noutros partidos ou que apenas estão inscritos para ajudar o amigo a ser presidente de Concelhia ou de Distrital. A questão da comunicação é verdadeiramente essencial. O CDS tem que saber comunicar. Tem que lembrar as suas causas de sempre mas também ser capaz de agarrar novos temas, que não são causas de esquerda, são causas de modernidade, que qualquer partido tem que ter para ser visto como útil. Falo da transição digital, da transição verde, das questões da sustentabilidade.
As diretas para a escolha do líder? Deveriam ser retomadas?
Estou à vontade com diretas ou com congressos. Mas para ter eleições diretas tem que ter cadernos eleitorais verdadeiros. Estou à vontade com um sistema e com outro. Mas acho os congressos num partido como o CDS absolutamente fundamentais. Porque não temos a máquina de comunicação de grandes partidos como o PS ou o PSD. E porque os congressos são grandes momentos de afirmação política. E isso não tem a mesma força se um congresso for eletivo ou não. As pessoas assistem a um congresso com mais interesse quando não sabem ainda quem venceu.
Os apoiantes do atual líder apresentaram uma moção e admitem entregar listas aos órgãos nacionais. Como tenciona liderar o CDS se a fação de Rodrigues dos Santos conseguir maioria nos órgãos nacionais?
A minha disponibilidade para fazer pontes é total. Eu quero fazer pontes, contar com todas as tendências, com todas as sensibilidades, desde que as pessoas tenham disponibilidade, qualidade e estejam de boa fé. No mais, em democracia não há unanimismos. É normal existirem oposições. Não é um drama.
Não tem receio que façam consigo o que lhe acusam de ter feito a Francisco Rodrigues dos Santos? O tal "ruído"?
Mas eu não fiz nada. A única coisa que fiz foi trabalhar para o CDS. Enquanto eurodeputado, dei o melhor de mim. Limitei-me a candidatar-me a um congresso no momento em que ele foi convocado. Não aceitei é que o congresso fosse adiado a 24 horas da eleição dos delegados. Isso é outra coisa. Não temo nada que me façam a mim o que não fiz aos outros, até porque eu não farei aos outros o que me fizeram a mim.
Já disse que se perder "nunca mais" voltará a ser candidato à presidência do CDS-PP. Consegue ser assim tão definitivo?
Consigo. Sabe porquê? Porque a minha disponibilidade é única e irrepetível. Sou uma pessoa profundamente realizada. Entendo apenas que, olhando para as minhas circunstâncias, estou em melhores condições do que outros hoje para ser presidente do partido. Sou o único com palco, sou eurodeputado, sou conhecido nas ruas, sou uma ferramenta que pode estar a serviço do CDS, se o partido quiser aproveitar. Serei o primeiro presidente do partido que será presidente graciosamente. Eu não vou receber um cêntimo por ser presidente do partido. Quero dar esse exemplo. E isso não tem nada a ver com as próximas eleições ao Parlamento Europeu, porque antes das próximas eleições ao Parlamento Europeu provavelmente teremos outro congresso.
E se não conseguir manter um lugar no Parlamento Europeu e reentrar na Assembleia da República, que consequências tira?
Todas. Tiro as consequências todas. Isso significa que não atingi os meus objetivos. Não fazia sentido nenhum continuar como presidente do CDS. Aliás, não quero ser presidente do CDS muito tempo. Será, no máximo, em princípio, de dois mandatos. Quero cumprir um ciclo, esse ciclo passa pelas eleições europeias e legislativas. Depois, acho que será tempo de dar tempo a outros. Até lá, vou a votos e se o partido quiser serei presidente do CDS e darei o melhor de mim. Se não atingir os meus objetivos deixarei de ser presidente do CDS, porque nunca deixei para outros a responsabilidade que cabe a começar às lideranças.