Nuno Rebelo de Sousa, filho do Presidente da República, foi constituído arguido no processo das gémeas que receberam tratamento hospitalar em Portugal com um medicamento que custou quatro milhões de euros, confirmou à agência Lusa fonte ligada ao processo.
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Questionada esta quarta-feira pela Lusa sobre se Nuno Rebelo de Sousa é arguido, a Procuradoria-Geral da República (PGR) limitou-se a responder que "o inquérito tem arguidos constituídos", remetendo mais informações para um comunicado de 7 de junho.
Nesse comunicado era referido que neste caso estão em causa factos suscetíveis de configurar "prevaricação, em concurso aparente com o de abuso de poderes, crime de abuso de poder na previsão do Código Penal e burla qualificada".
Entre os arguidos está também o ex-secretário de Estado da Saúde António Lacerda Sales.
Hoje, o filho do Presidente da República comunicou à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o caso das gémeas que não pretende prestar esclarecimentos, admitindo contudo estar presente em audição, segundo um documento ao qual a Lusa teve hoje acesso.
Em causa está o tratamento hospitalar (em 2020) de duas crianças gémeas residentes no Brasil que adquiriram nacionalidade portuguesa e receberam no Hospital de Santa Maria (Lisboa) o medicamento Zolgensma. Com um custo de dois milhões de euros por pessoa, este fármaco tem como objetivo controlar a propagação da atrofia muscular espinal, uma doença neurodegenerativa.
O caso foi divulgado pela TVI, em novembro passado, e está ainda a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República e a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde já concluiu que o acesso à consulta de neuropediatria destas crianças foi ilegal.
Também uma auditoria interna do Hospital Santa Maria concluiu que a marcação de uma primeira consulta hospitalar pela Secretaria de Estado da Saúde foi a única exceção ao cumprimento das regras neste caso.
Em 04 de dezembro do ano passado, o Presidente da República confirmou que o seu filho, Nuno Rebelo de Sousa, o contactou por email em 2019 sobre a situação das duas gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinhal que depois vieram a receber no Hospital de Santa Maria um tratamento com um dos medicamentos mais caros do mundo.
Nessa ocasião, Marcelo Rebelo de Sousa deu conta de correspondência trocada na Presidência da República em resposta ao seu filho, enviada à Procuradoria-Geral da República, e defendeu que deu a esse caso "o despacho mais neutral", igual a tantos outros, encaminhando esse dossiê para o Governo.
Marcelo desconhecia
"Já sabem que eu não tenho nada a dizer sobre isso. Acaba de me dar uma notícia que eu não sabia", declarou Marcelo Rebelo de Sousa, em resposta aos jornalistas, à entrada para a cerimónia de entrega do Prémio Pessoa, na Culturgest, em Lisboa.
Interrogado pelos jornalistas sobre esta notícia, Marcelo Rebelo de Sousa repetiu que não tem "nada a acrescentar" ao que já disse sobre este caso, considerando que não tem "verdadeiramente nada a juntar de útil, quer no plano dos factos, quer no plano dos juízos, a essa matéria".
O chefe de Estado referiu que tudo o que tem sabido sobre este processo foi pela comunicação social, a quem agradeceu por estar "a noticiar ao longo dos últimos dias e ao longo dos últimos meses" sobre o assunto.
Mãe das gémeas disponível para falar ao MP ou à PJ
A mãe das gémeas, que será ouvida presencialmente no parlamento, na sexta-feira, está disponível para prestar esclarecimentos ao Ministério Público e à Polícia Judiciária, revelou hoje o seu advogado.
Wilson Bicalho adiantou à agência Lusa que, nesta sua deslocação do Brasil a Portugal para ser ouvida na comissão parlamentar de inquérito, a sua cliente Daniela Martins estará também disponível para ser inquirida pelo "Ministério Público [MP], pela Polícia Judiciária [PJ] ou por qualquer órgão [judiciário] que esteja a investigar o caso".
"Se ela vier e se a PJ achar por bem ou o MP a quiser ouvir, ela vai estar à disposição para ser ouvida por quem quer que seja", vincou, acrescentando que a sua constituinte já se colocou à disposição das autoridades judiciárias portuguesas.
O advogado precisou que a mãe das gémeas luso-brasileiras "não foi constituída arguida" neste processo.
"Sabemos que há um processo a decorrer em segredo de justiça. Como o caso em si leva o nome das próprias filhas, imaginámos que há de haver sempre participação dela mesmo que seja para prestar esclarecimentos", concluiu.
De acordo com o advogado, é do interesse da sua cliente que o caso seja investigado e o "assunto seja findado", cabendo aos órgãos competentes avaliarem "a não responsabilidade" da mãe das gémeas no caso, por forma a que ela "possa seguir a sua vida sem essa mácula, essa mancha na história dela e das filhas".
A revelação do advogado surge depois de o presidente da comissão parlamentar de inquérito, Rui Paulo Sousa, ter dito à Lusa que desconhecia se a mãe das crianças é testemunha ou arguida no processo-crime instruído pelo MP.
Segundo o advogado, a chegada de Daniela Martins a Portugal provavelmente ocorrerá durante o dia de quinta-feira.