"Todos os portugueses sentem a maior repulsa pelo violento ato de banditismo". Foi, assim, que o Jornal de Notícias noticiou, na primeira página da sua edição de 24 de janeiro de 1961, o assalto ao paquete "Santa Maria", quando navegava no Mar das Caraíbas com 600 passageiros a bordo, no que ficou conhecida como a "Operação Dulcineia".
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O assalto aconteceu na madrugada de 22 de janeiro de 1961 por um grupo de 23 homens, portugueses e espanhóis, do Directório Revolucionário Ibérico da Libertação (DRIL), liderados pelo capitão Henrique Galvão e por Jorge de Soutomayor. O objetivo era iniciar um golpe de Estado capaz de derrubar o regime salazarista. Daí que não seja de estranhar que, para o Governo de então, tenha sido visto como "um facto gravíssimo", numa "nota oficiosa" publicada no JN.
Também é compreensível que, no título da primeira página daquela terça-feira, o grupo de Henrique Galvão, apresentado como "chefe rebelde", tenha sido chamado de "criminosos" e "piratas". E o assalto ao paquete da Companhia Colonial de Navegação, batizado pelo DRIL como "Santa Liberdade", tenha sido encarado como "um significativo ataque à soberania do país", enquanto a tripulação era apresentada como "heroína" pela forma como tentou resistir ao assalto.
"Os aludidos rebeldes, ao tentarem apoderar-se do barco português, por meio de uma revoltante ação de piratas sem escrúpulos, não contaram, porém, com o heroísmo da tripulação portuguesa", lê-se num artigo publicado do Jornal de Notícias, onde os marinheiros são chamados ainda de "destemidos" pela forma como "defenderam uma cara parcela do património pátrio".
Na edição do dia seguinte, o JN revelou como o assalto foi concretizado: "O comando terrorista assaltou de noite a ponte de comando com granadas de mão e pistolas metralhadoras". Um oficial, o piloto Nascimento Costa, foi morto e outro ferido gravemente.
"Seguidamente, os assaltantes apoderaram-se do navio, que mudou de rumo, para ir desembarcar alguns dos feridos na pequena ilha inglesa de Santa Lúcia", relata-se ainda, avisando-se, numa outra notícia, que o paquete "será detido se demandar num porto brasileiro".
O "Santa Maria" andou a ser procurado por navios de guerra norte-americanos e ingleses, além de aviões holandeses. O paquete acabou libertado a meio de fevereiro e o assalto foi apelidado na Assembleia Nacional como tendo sido um "crime de lesa-Pátria".