Os pais de Aira chegaram do Bangladesh, os de Tadei da Ucrânia, o pai de Júlio César do Brasil. No caso de Emília, os pais já nasceram cá. Mas os avós são chineses. Em Portugal, o peso das crianças filhas da imigração é cada vez maior. Acresce que a proveniência é mais diversa. E que há desafios prementes a considerar.
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Muhammad Al Amin, de 33 anos, nasceu e cresceu em Brahmanbaria, cidade do Bangladesh que fica a uns 100 quilómetros da capital, Daca. O pai era agricultor e tinha um negócio local, recolhia arroz junto dos pequenos produtores e vendia-o para mercados maiores. Não passavam fome, também não eram ricos. Prova disso é que, quando quis proporcionar ao filho a possibilidade de prosseguir estudos noutro país, o pai de Amin teve de vender as propriedades. Com 20 anos, o jovem rumou então ao Reino Unido para se licenciar em Gestão. Depois, em 2015, com o curso já praticamente concluído, veio visitar Portugal e por cá continuou. “Os amigos que cá tinha insistiram e achei que era um bom sítio para viver”, conta, em inglês. Já diz praticamente tudo em português, mas, para conversas mais complexas, continua a encontrar refúgio no inglês. Os primeiros anos no nosso país foram uma aventura daquelas. Queria muito continuar a estudar, mas logo percebeu que teria de deixar a intenção em standby. “Na altura, o salário mínimo em Portugal era pouco mais de 500 euros. Não dava para pagar uma casa e as propinas com esse dinheiro.” Até começou por partilhar casa com amigos, eram quatro num T2 em Almada, pagavam 300 euros ao todo. Mesmo assim, o pouco que ganhava numa loja de computadores do Monte da Caparica (margem sul do Tejo), não dava para grandes voos.
Em 2017, já com o certificado de residência garantido, abriu uma “gift shop” na Costa da Caparica, que passou a acumular com o trabalho na loja de computadores. Para amealhar o mais possível. Mas a manta continuava curta e o sonho de prosseguir os estudos inalcançável. Ele resistiu. Em 2019, trocou a loja de computadores por um trabalho num call-center, em Porto Salvo (Oeiras), onde rapidamente progrediu. Mas os dias tornaram-se irrespiráveis. “Acordava às seis da manhã para chegar à empresa a tempo, saía às cinco da tarde e voltava à Costa da Caparica, para trabalhar na minha loja das sete à meia-noite.” Foi quase um ano assim. Depois, em setembro de 2020, ainda entrou no mestrado, em Estudos Internacionais. O corpo não tardou a sucumbir à rotina estonteante. “Um mês depois, fiquei muito doente e voltei para casa.” Não abriu mão da ambição de fazer vida em Portugal, ainda assim. Nem de continuar a estudar. Nos três meses que passou no Bangladesh, continuou o mestrado (aproveitando o facto de a covid ter trazido as aulas online), aprofundou o estudo do Português (também online), recompôs-se, casou. E assim ganhou energias para retomar o sonho.