Viveu o 25 de Abril de 1974 ao lado de Salgueiro Maia, que acompanhou desde Santarém. Todos os anos desfila na Avenida da Liberdade, em Lisboa, vestido de empregado de mesa e com a bandeira de Portugal aos ombros e, neste ano de 2020 - para além da pandemia da Covid-19 - a data foi-lhe particularmente triste pelo drama familiar que está a atravessar, com a mulher internada e sem a poder visitar.
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Carlos Ferreira, de 71 anos, saltou para a ribalta ao desfilar sozinho pelas ruas de Lisboa no 46.º aniversário da Revolução dos Cravos.
"Chorei e emocionei-me muito ao longo do caminho", enfatiza. Carlos Ferreira desfilou sozinho porque achou importante recordar e homenagear os valores da liberdade. "É importante que as pessoas abram os olhos e saibam dar valor ao que é a humanidade e a liberdade", entende.
Carlos Ferreira saiu do Rossio e foi em direção à Avenida da Liberdade. As autoridades abordaram-no, mas cordialmente. Pelo caminho, ouviu o "Grândola, Vila Morena", momento que, confessa, o emocionou. "Voltei a viver ali", conta. Só lamenta não ter tido o apoio de algumas forças tão importantes na Revolução.
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"Passei à porta da sede do PCP, mas não estava ninguém cá fora, só ouvi a música lá dentro", afirma.
Este ano o dia foi particularmente triste por ter a mulher internada em Ourém, com Alzheimer. Foi hospitalizada poucos dias antes de ser decretado o primeiro estado de emergência, o que o tem impedido de a visitar. Tem um filho que vive em Madrid, e que lhe vai contando os dramas que a capital espanhola tem vivido por causa da Covid-19.
Quem é este homem?
Mas quem é Carlos Ferreira? Nasceu na Mealhada, a 12 de setembro de 1948, e fez quase toda a infância e juventude em casas de acolhimento do Padre Américo. Andou por Santa Maria da Feira, Braga e Praia de Mira. Aos 18 anos, rumou a Lisboa e conseguiu trabalho na Pensão Monumental, nos Restauradores. "Dormia nas camaratas e ajudava as empregadas na limpeza e arrumação dos quartos", recorda. Depois, esteve mais de 30 anos como empregado de mesa do Hotel Tivoli, na Avenida da Liberdade.
No 25 de Abril de 1974, Carlos Ferreira estava na tropa, em Santarém. Foi daí que Salgueiro Maia partiu para o Terreiro do Paço. O homem explica que lhe foi comunicado que seria um golpe de Estado e que iriam todos até Lisboa, tendo Salgueiro Maia perguntado quem se juntaria a ele. "Muitas vezes nas paradas dizíamos isso, só acreditei quando seguimos".
Eram quatro horas da madrugada quando Carlos Ferreira chegou ao Terreiro do Paço, juntamente com o pelotão de Santarém, liderado por Salgueiro Maia. Ali ficou até ao final da manhã, num momento que acredita ter sido de grande viragem para Portugal.
Desafio
Correu de Lisboa a Viseu com bandeja na mão
Em 1984, Carlos Ferreira foi desafiado pela organização da Feira de São Mateus, em Viseu, a correr de Lisboa até à cidade de Viriato vestido de empregado de mesa com uma bandeja na mão. A aventura durou cinco dias e teve como momento alto a passagem na sua Mealhada natal. "Parei no Grande Hotel do Luso para comer e descansar", recorda. Um primo de Carlos, com quem foi criado, ainda vive no Luso, terra que visita quando tem oportunidade.