Padre operário participou na primeira manifestação, há 50 anos, e aponta realidades laborais que "continuam extremamente problemáticas". Esta tarde esteve com o cardeal Américo Aguiar na manifestação em Setúbal.
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Constantino Alves, o "padre operário", como é conhecido, voltou esta quarta-feira a desfilar na manifestação do 1.º de Maio, em Setúbal. Aos 75 anos, pároco na paróquia de Nossa Senhora da Conceição, responsável pela congregação religiosa Filhos da Caridade, em Portugal, o padre Constantino participou na primeira concentração do Dia do Trabalho há 50 anos, nos Aliados, no Porto.
"Estava a terminar o curso de Teologia no Seminário Maior e tínhamos alguns professores que, nas aulas e fora delas, nos falavam da liberdade e da ditadura”, disse ao JN o sacerdote natural de Castelo de Paiva. “Foi uma grande festa, foi a Festa dos Trabalhadores e da liberdade”, recordou. Antes da Revolução, de forma “não tão pública”, o então seminarista, juntava-se, neste dia, “no fundo da Avenida dos Aliados a um pequeno grupo de pessoas que celebrava a data”.
A “primeira consciência da classe operária” nasceu ao ver “os olhos vermelhos e as caras negras dos homens que, todos os dias, trabalhavam nas Minas do Pejão”. Anos mais tarde, quando, por opção religiosa, se juntou aos operários e trabalhou nos batoleiros do Tejo e foi fresador mecânico numa empresa metalúrgica de Setúbal, continuava a recordar os mineiros da sua terra.
Agora, nos 50 anos do primeiro 1.º de Maio, entende que é altura de “revisitar, redescobrir e recordar” os desafios do trabalho e da dignidade humana. “Voltamos a ter salários que não permitem sair da pobreza e há uma desqualificação progressiva da vida dos trabalhadores”, disse o sacerdote que foi, durante quase dez anos, dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos do Sul.
“Há realidades que continuam a ser extremamente problemáticas, apelativas, interpeladoras, à sociedade no seu conjunto, aos governantes, aos trabalhadores e à Igreja e a Igreja tem que saber ler a realidade e aproximar-se dos que mais precisam”, afirmou o homem que, nas empresas onde trabalhou, era conhecido como “o Constantino” ou “o Alves”.
Amigo de D. Manuel Martins, o primeiro Bispo de Setúbal, recorda os encontros que teve com o “bispo vermelho” onde lhe entregava listas “com os nomes das empresas de todo o Distrito de Setúbal que tinham salários em atraso ou que iam despedir pessoas” para que D. Manuel “intercedesse”.
"A Igreja tem, necessariamente, que se voltar para os pobres e deixar de fingir que está tudo bem", finalizou.