Pais de alunos com deficiência entregam petição no Parlamento por escola inclusiva
Um grupo de pais de crianças e jovens com necessidades educativas especiais vão entregar, esta quinta-feira, uma petição no Parlamento por uma escola pública verdadeiramente inclusiva. Exigem mais recursos humanos com formação especializada, meios materiais e apoios para pôr fim a desigualdades.
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Depois de, há cerca de duas semanas, se manifestarem nas ruas do norte ao sul do país, pais de crianças e jovens com deficiência, neurodivergência e surdez que integram o “Movimento por uma Inclusão Efetiva” vão entregar esta tarde uma petição pública no Parlamento que fechou com mais de 9300 assinaturas. Na missiva, exigem a revisão do Decreto-lei n.º54/2018, regime jurídico que regula a educação inclusiva, que denunciam não estar a ser cumprido, principalmente devido à falta de recursos humanos e materiais, e à garantia de uma formação especializada aos profissionais de educação.
O problema é “estrutural” e “repete-se de ano letivo em ano letivo” sob pena de comprometer que estas crianças desenvolvam as suas potencialidades e sejam independentes no futuro, alerta, ao JN, Filipa Nobre Pinheiro, uma das responsáveis pelo movimento. “Sentimos na pele o estado do ensino especial, e estamos disponíveis para encontrar soluções. Queremos fazer ouvir a nossa voz quando quem de direito avaliar a lei”, acrescenta o porta-voz, defendendo que as entidades competentes devem reunir profissionais e associações nesse diálogo.
A implementação do regime deveria ter sido fiscalizada quatro anos após a entrada em vigor, mas não aconteceu, denuncia a representante. Nesse sentido, o movimento defende que seja criado um novo plano de monitorização e avaliação das entidades intervenientes. As desigualdades são acrescidas entre escolas decorrentes da transferência de competências para autarquias, que “tem levado a uma subjetividade na aplicação das medidas”, descreve Filipa Nobre Pinheiro.
Formação é insuficiente
A falta de recursos humanos, desde professores do ensino especial a terapeutas da fala e assistentes operacionais, que condicionam um acompanhamento permanente das crianças, a par da formação insuficiente, é um problema transversal a diversas respostas educativas, sublinha Filipa Nobre Pinheiro. A porta-voz denuncia que os alunos estão confinados aos centros de apoio à aprendizagem (os designados CAA) sem que haja um "verdadeiro acompanhamento de um plano curricular" que garanta o desenvolvimento das crianças.
O cumprimento de um currículo adaptado às necessidades dos alunos também está comprometido pela falta de profissionais com formação especializada nas escolas de referência para crianças invisuais, nota Filipa Nobre Pinheiro. O problema também bate à porta das escolas de referência para a educação bilíngue: quer os professores titulares quer a comunidade escolar em geral "têm pouca ou nenhuma formação em Língua Gestual Portuguesa (LGP)", que na verdade não é obrigatório por lei, esclarece um porta-voz. Muitas vezes faltam também intérpretes para acompanhar as crianças.
Para a porta-voz, requerer formação específica é um dos principais pontos necessários para melhorar na legislação porque “se perde o pressuposto de se integrar a criança numa comunidade escolar que sabe as duas línguas”. E mesmo no caso dos professores do ensino especial, que têm uma especialização para poder concorrer a um grupo de recrutamento específico, as horas de formação de LGP que são dadas “são manifestamente insuficientes”, adverte.
Todas estas "lacunas" fazem com que estas crianças e jovens se "tenham de adaptar a um currículo escolar", ao invés de ser a escola a adaptar-se às necessidades especiais dos alunos de forma a garantir-lhes a mesma oportunidade de acesso à educação, atenta Filipa Nobre Pinheiro “Existe uma comunidade surda e uma comunidade própria que tem de ser fomentada Mas a própria comunidade escolar pressiona a colocação dos alunos surdos em turmas regulares, sem o ensino da LGP, porque desenvolvem a oralidade”, exemplifica.
Embora não sejam conhecidos indicadores oficiais, mais 83% dos diretores dos agrupamentos de escolas e das escolas não agrupadas admitem não ter os recursos necessários para responder às necessidades específicas dos alunos, segundo um levantamento da Fenprof , divulgado em janeiro, realizado durante o primeiro período do ano letivo 2023/2024.
O “Movimento para uma Inclusão Efetiva” surgiu, em 2022, por iniciativa de um grupo de pais de crianças e jovens com necessidades educativas especiais unidas por casos de exclusão dos filhos na comunidade escolar, e, inclusive, de maus-tratos psicológicos. No passado já foram recebidos por partidos com assento parlamentar, e levaram a cabo denúncias à Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares.
Sem respostas concretas, o grupo de pais volta a organizar-se para exigir mudanças ao poder político e aos responsáveis na área da Educação. Neste momento, o grupo do movimento na rede social Facebook já conta com mais de 5500 encarregados de educação, vários dos quais não têm filhos com deficiência, mas estão solidários com a causa.