Uma nova espécie de dinossauro iguanodonte com 125 milhões de anos foi revelada, esta segunda-feira, por paleontólogos, com a publicação do estudo da descoberta na revista internacional "Journal of Systematic Paleontology".
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O "raro" crânio do dinossauro permitiu à equipa internacional descrever uma nova espécie de dinossauro iguanodonte (herbívoro e bípede) chamada "Cariocecus bocagei", a primeira espécie de iguanodonte nomeada do Cretáceo Inferior português.
"O "Cariocecus" exibe uma característica única entre os dinossauros: o osso jugal (zona análoga à posição da maçã do rosto) e a maxila são fundidos, uma adaptação provavelmente concebida para fortalecer a sua mastigação", explica, citado em nota de imprensa, um dos autores, o italiano Filippo Bertozzo, do Museu Real de Ciências Naturais de Bruxelas e da Sociedade de História Natural de Torres Vedras (SHN).
Apesar de existirem outras três espécies de iguanodontídeos identificadas no Jurássico Superior de Portugal ("Draconyx loureiroi", "Eousdryosaurus nanohallucis" e "Hesperonyx martinhotomasorum"), antes do estudo agora divulgado, "os fósseis de iguanodontes do Cretácico Inferior eram raros, pouco informativos e muito primitivos".
Segundo Bruno Camilo, também autor do estudo e diretor da SHN, esta nova espécie "representa o crânio de dinossauro mais completo alguma vez encontrado até hoje no país".
"Por se tratar de um exemplar jovem ou subadulto, permite conhecer o momento e as modalidades em que se deu a co-ossificação dos ossos cranianos durante o crescimento, o que é muito raro conseguir compreender num dinossauro", acrescenta o também doutorando do Instituto Superior Técnico.
A descoberta contribui para um melhor conhecimento da sua biologia, nomeadamente no que diz respeito à origem e diversificação destes animais durante o Cretácico.
A preservação e tridimensionalidade do achado permitiram a reconstrução digital do cérebro, dos nervos cranianos e, principalmente, do ouvido interno, revelando um lobo olfativo curto e um cérebro grande.
Além das características cranianas únicas, o americano Donald Cerio, outro dos autores do estudo e investigador da Universidade Johns Hopkins, destaca "evidências fósseis de estruturas neurossensoriais, incluindo as cavidades do cérebro, dos ouvidos e dos olhos" para explicar a sua evolução e diversidade no Cretáceo Inferior.
O estudo pode contribuir para a descoberta de novas informações sobre o metabolismo dos dinossauros.
"Estamos a aprofundar cada vez mais o conhecimento sobre capacidades sensoriais dos dinossauros, sendo que a preservação excecional do endocrânio permitiu-nos compreender melhor os detalhes dos ouvidos e audição destes animais", esclarece Ricardo Araújo, outro dos autores e investigador do Instituto Superior Técnico e da SHN.
O crânio foi encontrado em 2016 no litoral de Sesimbra, no distrito de Setúbal, por Pedro Marrecas, co-autor e investigador da Sociedade de História Natural de Torres Vedras, onde foram armazenados.
Na Praia da Área do Mastro, o fóssil estava "parcialmente visível no bloco rochoso, graças à fileira de dentes salientes" precisou de um trabalho de preparação e restauro.
Nesta região, já foram descobertos outros dinossauros, mas nenhum possuía as características necessárias para ser considerado uma nova espécie.
Em Portugal, "temos uma diversidade abundante de animais semelhantes de épocas ainda mais antigas, do Jurássico Superior, mas mais primitivos, não estando ainda dentro da linhagem dos iguanodontes. Portugal demonstra ser uma importante "ponte" entre estes períodos geológicos, o que nos permitirá desvendar os segredos do sucesso evolutivo dos iguanodontes", refere Filippo Bertozzo.
Os cientistas apelidaram a nova espécie de "Cariocecus bocagei", em alusão à antiga divindade da guerra venerada pelas populações locais no período pré-romano (Cariocecus) e em homenagem a José Vicente Barbosa du Bocage, um naturalista português do XIX ("bocagei").
O estudo é ainda assinado por José Carlos Kullberg (Universidade Nova de Lisboa), pelo italiano Fabio Manucci, Victor Feijó de Carvalho (SHN), Silvério D. Figueiredo (Instituto Politécnicop de Tomar) e pelo belga Pascal Godefroit (Real Instituto de História Natural da Bélgica).