Paulo Portas: sem o CDS há mais "gritaria", "demagogia" e "aparelhistas medíocres"
O antigo presidente do CDS, Paulo Portas, discursou, este sábado, numa convenção do partido que também juntou os ex-líderes Assunção Cristas e Manuel Monteiro, além do atual, Nuno Melo. Portas apontou a mira ao Chega e apelou a que, à Direita, não haja "negacionistas" das mudanças climáticas. "Chicão" esteve ausente.
Corpo do artigo
"O momento não é fácil, mas sou dos que acham que é nos momentos difíceis que as pessoas precisam de ajuda", afirmou Paulo Portas, justificando a sua presença na convenção do partido. O antigo ministro falou num palco montado à entrada da sede nacional do CDS, no Largo do Caldas, em Lisboa, durante um evento que juntou algumas centenas de pessoas.
Com humor, Portas afirmou que o CDS resiste, há 49 anos, a "prognósticos reservados". Pedindo aos presentes "que não vos falte a fé", acrescentou, arrancando palmas: "Com tenacidade, temperança e boa disposição, lá chegaremos ao dia em que voltaremos a dizer aos nossos adversários: 'Não se enganem outra vez'".
Frisando que as eleições europeias de junho do próximo ano serão "a primeira prova de vida" do CDS, Portas exortou o partido a trabalhar para que essa seja, também, "a primeira prova superada". Dito isto, elencou alguns motivos pelos quais, no seu entender, "Portugal e o seu sistema político ficam pior" sem esta força política.
Embora nunca tenha nomeado o Chega, o partido de André Ventura foi o principal destinatário das palavras de Portas. Sem o CDS, frisou o antigo ministro, o país terá "menos ideias e mais gritaria", "menos moderados e mais extremistas", "menos racionalidade e mais demagogia". Foi muito aplaudido quando sustentou que o eventual desaparecimento do seu partido significará também "menos quadros de qualidade e mais aparelhistas medíocres".
Portas diz que Chega ajuda PS: "Olhem para Espanha e tirem lições"
Portas continuou com os avisos, alertando que, sem o CDS, existirá também "menos concórdia e respeito pelos outros e mais crispação, divisão, insultos e até ódios". Isso dificultará a construção de uma alternativa ao PS, uma vez que "será fácil, para alguns, fazer campanhas baseadas no medo".
"Olhem para o que aconteceu em Espanha e tirem as vossas lições", explicou, a esse propósito, o antigo vice-primeiro-ministro. Portas aludia às recentes eleições, em que o centro-esquerda contrariou o favoritismo de uma Direita que se preparava para governar com a extrema-direita.
Paulo Portas também reservou uma palavra para as alterações climáticas, tema que a nova Declaração de Princípios do CDS - elaborada por António Lobo Xavier e que foi apresentada este sábado - irá integrar. Nesta "era de eventos climáticos extremos", o ex líder pediu que os militantes "não vão atrás da conversa de que não há alterações climáticas".
Paulo Portas insurgiu-se contra o "negacionismo", lamentando que se viva numa época em que a política se faz via Twitter, através da propagação de ideias simples e "que nos atiram para as cavernas". O democrata-cristão acrescentou que a negação da Ciência "causou demasiados mortos durante a pandemia para ser sequer perdoada".
Além da questão climática, Portas trouxe também os temas do salário médio e do SNS. Sobre o primeiro, salientou que os rendimentos só melhorarão quando a produtividade das empresas aumentar; sobre saúde, lembrou que as três maiores maternidades do país são hoje privadas e atirou, com o PS na mira: "Que epitáfio do vosso discurso".
Portas falou depois de Manuel Monteiro, seu antigo aliado e, mais tarde, rival. Saudou-o no início do discurso, referindo-se a ele como "meu caro Manuel Monteiro". Foi o último dos líderes presentes que Portas mencionou, após Nuno Melo e a "querida" Assunção Cristas, e também depois do ex-deputado Lobo Xavier. Monteiro, que discursou antes, cumprimentou igualmente o seu "companheiro Paulo Portas".
"É um dia histórico", diz Cristas
Assunção Cristas, ex-ministra da Agricultura e líder do CDS entre 2016 e 2020, rejeitou a ideia de que o partido esteja morto. "O CDS está vivo e vai crescer", prometeu, antes de saudar Nuno Melo por ter promovido um "dia histórico", no qual os militantes e ex-líderes surgiram "unidos pela mesma razão". "É obra", elogiou.
Tal como Portas, também Cristas procurou vincar a importância da "Direita moderada", que "respeita as instituições" e é "capaz de resolver [problemas] sem ir para os extremos". Aludiu à "vocação de Governo" do CDS para frisar que ela traz consigo a respnsabilidade de não se poder "dizer tudo de forma inconsequente".
Numa curta intervenção, Cristas salientou igualmente a importância do combate às alterações climáticas. Despediu-se com nova interpelação ao atual líder: "Nuno, tens condições para navegar até mar alto", afirmou. "O que posso desejar é que o vento esteja de feição".
Monteiro ataca Ventura: "É católico aos domingos mas foge quando vem o Papa"
Manuel Monteiro, presidente do partido de 1992 a 1998, saudou a atualização da Declaração de Princípios do CDS, frisando que um partido "que se fecha apenas na sua História e no seu passado" não tem "presente nem futuro".
Assumindo-se como conservador, Monteiro, que se refiliou no partido em 2019, afirmou que o documento prova que "os conservadores portugueses podem e devem continuar a confiar no CDS". Apontou não só ao Chega mas, também, à IL: "Não recebemos lições de recém-chegados à política", atirou.
Sobre os liberais, criticou, embora de forma implícita, os que confundem "a liberdade com o libertarismo" - isto é, a diminuição extrema do papel do Estado; no que toca ao Chega, acusou o partido de "segregação e estigmatização de pessoas". Sem mencionar Ventura, insurgiu-se contra "pessoas que são católicas ao domingo mas que fogem desse catolicismo quando o Papa vem a Portugal", recebendo uma salva de palmas.
"Baixe lá um bocadinho" os impostos, pede Nuno Melo a Costa
O líder do CDS, Nuno Melo, foi o último a discursar e deixou um desafio ao Governo em matéria de impostos: "Dr. António Costa, baixe lá um bocadinho aquilo que retém às empresas. Verá que os salários sobem. E não sobem por decreto, sobem por justiça e por vontade", atirou.
Nuno Melo disse ter a certeza de que o CDS "há-de voltar à Assembleia da República", uma vez que é necessário e insubstituível. "Nenhum outro partido representa hoje na Assembleia da República o que o CDS é. O CDS não está lá, mas não foi substituído por ninguém", defendeu.
António Lobo Xavier, o autor da Declaração de Princípios atualizada - e que o CDS deverá disponibilizar em breve -, falou da necessidade de impulsionar um "partido de acolhimento" que não rejeite ninguém independentemente de "raças, credos e orientações" e se centre na justiça social.
A convenção do CDS contou com muitas personalidades do partido. Além dos citados, estiveram também nomes como o ex-ministro Pedro Mota Soares, o ex-secretário de Estado Paulo Núncio ou os ex-deputados João Almeida, Hélder Amaral e Adolfo Mesquita Nunes (este último desfiliou-se do partido em 2021).
Dos cinco ex-líderes ainda vivos, Francisco Rodrigues dos Santos e Ribeiro e Castro não estiveram presentes.