Escolas a trabalhar a meio gás, filas para encher garrafões com água, ruas cheias de pessoas e longas filas de trânsito. A semana começou como todas as outras, mas rapidamente se instalou o caos. O apagão nacional obrigou os portugueses a reinventarem-se e até houve lugar para encontros inesperados.
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À saída da circunvalação, no Porto, dezenas de pessoas fazem fila junto a um bebedouro ligado à rede pública de água do município. Habitualmente serve quem ali passa para fazer exercício físico, mas o dia anormal exige medidas extremas. Com baldes, garrafas ou garrafões, tudo é útil na hora de levar água para casa. “Não tenho internet, só sei o que se está a passar pela rádio e aproveitei este ponto de água para reabastecer, ainda nem consegui tomar banho”, admite Sara Silva, 35 anos. Entre a correria pouco habitual de um dia sem luz, a portuense relata que o carteiro ficou preso durante 15 minutos no elevador do seu prédio e nem o “gerador do condomínio funcionou quando era preciso”. “Mas deu para conhecer a minha vizinha e até lhe ofereci gasolina que ainda tenho de reserva no carro”, realça.
Também Lúcia Ribeiro, 50 anos, saiu à rua para encher os garrafões, a “bomba do prédio é elétrica e não tenho água em casa”, explica, notando que tem comida enlatada para os próximos dias. De férias e com viagem marcada para o estrangeiro, ainda não sabe o que fazer. “Nunca aconteceu uma situação assim, nem no tempo da pandemia. Parece que voltamos ao século passado”, refere.
Alerta para futuro
A falha de energia e o bom tempo que se faz sentir levou milhares de pessoas à praia de Matosinhos. Entre estudantes, trabalhadores e reformados, foram muitos os portugueses que aproveitaram o apagão para fazer uma pausa na rotina do dia-a-dia. “Planeamos uma tarde de cinema, mas caiu tudo por terra”, contam ao JN Maria Helena, 80 anos, e Vila Rodrigues, 77 anos. Sem perceberem a origem do problema, o casal antecipa que já planeou algumas estratégias para as próximas horas. “Ainda temos alguns garrafões de água e algumas conservas em casa e vamos fazer sandes para o jantar”, sublinham. “Nunca pensamos que estas coisas podem acontecer, nem um kit de emergência temos casa. É um alerta para o futuro”, acrescentam.
A escassos metros da praia, Manuel Pinheiro não conseguiu abrir o restaurante “O Gaveto”, que dirige há 41 anos. O espaço já estava pronto para servir mais de 100 refeições, mas resta apenas fazer contas aos prejuízos. “Não temos sistemas de faturação, os aquários com marisco não funcionam, nem as câmaras frigoríficas. Temos congelados, peixe e marisco que se vai estragar, refere o proprietário. No ar continua a incógnita se será possível cumprir com as 80 pessoas que já tinham feito reserva para o jantar e deixa a garantia: “Vou comprar um gerador para da próxima vez minimizar os estragos”.
Já na Escola Secundária Augusto Gomes, em Matosinhos, as aulas decorreram dentro da normalidade. Quando a energia faltou, as refeições já estavam prontas e foram servidas aos alunos. Dentro das salas de aulas, foi necessário recuperar estratégias do passado. “Os nossos professores são muito dedicados e sabem desempenhar o seu papel de forma exemplar e reinventaram-se. Não tivemos apresentações, nem conteúdos multimédia, mas nada que não se resolva”, vinca. Para esta terça-feira, os portões da secundária só poderão reabrir se a energia for reposta durante o dia.