Um companheiro de armas do primeiro português a combater o Estado Islâmico defendeu esta quinta-feira que o Governo devia inspirar-se no exemplo deste "herói português" e apoiar os movimentos democráticos que podem vencer o grupo extremista no terreno.
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Em Lisboa para apresentar o livro do jornalista Nuno Tiago Pinto sobre Mário Nunes, o jovem português que morreu em maio na Síria, onde combatia o grupo Estado Islâmico (EI), Macer Gifford deixou um apelo: "Penso que [o Mário] devia ser uma inspiração para o Governo português e para o povo português".
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Em entrevista à Lusa, o antigo combatente britânico recordou Mário Nunes, ao lado de quem combateu contra os 'jihadistas' do EI, como "um ser humano muito decente".
"Ele era muito dedicado, muito profissional em tudo o que fazia. Era fácil gostar dele, ou até amá-lo. Tinha um ótimo sentido de humor e o riso mais louco que já ouvi", acrescentou.
Mário Nunes foi o primeiro português a viajar para a Síria para combater o EI, recordou o autor do livro, Nuno Tiago Pinto, que reuniu no livro depoimentos do próprio jovem, com quem manteve contacto ao longo de vários meses, assim como de familiares, amigos e outros voluntários internacionais que com ele se cruzaram na Síria, entre os quais Macer Gifford.
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Com 21 anos, Mário Nunes decidiu deixar a Força Aérea, onde trabalhava, para fazer alguma coisa contra o EI.
"Decidiu travar uma batalha que no fundo é nossa, mas individualmente. (...) Decidiu ir para combater o mal", contou o jornalista à Lusa.
Macer Gifford concorda que Mário partiu para a Síria "por detestar o EI. Eles são de facto o oposto de tudo o que ele representava como pessoa".
"O Mário amava a democracia, o povo curdo, ele saiu para prestar solidariedade e pagou o preço mais elevado. A história dele tem mesmo de ser contada ao povo português", afirmou o também ex-voluntário ocidental junto das forças curdas.
Gifford lembra Mário Nunes como "um internacionalista" que "acreditava que Portugal devia fazer mais para ajudar o povo Sírio e o povo curdo".
"As ações dele significam muito mais do que palavras sem sentido. Ele podia ter ficado em casa, seguro e confortável, e escolheu pôr a vida em risco pelas suas crenças e ideais", argumentou.
O britânico, que atualmente se dedica a defender a causa curda e a advogar na comunidade internacional a necessidade de apoiar as forças curdas que estão a combater o EI, além de estar a criar uma organização para angariar fundos para ajudar as Unidades de Proteção Popular (YPG), defendeu que Portugal devia "virar-se para fora".
"Portugal foi sempre maior quando se virava para fora, quando era um país internacional. Penso que o Governo português devia olhar para o exemplo que o Mário representa, olhar para a sua vida, e começar a olhar para fora, começar a ajudar com apoio militar e ajuda humanitária os grupos democráticos que estão a combater e a vencer este culto de morte brutal", afirmou.
Aos portugueses, disse que "podem ficar muito muito orgulhosas porque um dos seus jovens desistiu de tudo, no limite, da sua vida, pelas pessoas do Curdistão e da Síria, transformou as palavras em atos e manteve-se firme naquilo em que acreditava".
Em concreto, Gifford defendeu que Portugal poderia dar apoio militar às Forças Democráticas da Síria, mas também ajuda humanitária e económica.
"Temos de mostrar às pessoas que há um futuro na Síria, não podemos continuar a esvaziar a Síria das pessoas, que saem como refugiados, muitos dos quais não vão regressar", lembrou.
O britânico disse mesmo ter pedido audições com deputados portugueses, a quem pretende falar sobre estas questões, no âmbito do trabalho que tem desenvolvido.
"Se não acontecer agora voltarei mais tarde. Porque quero falar com políticos e falar-lhes daquilo que sei e de coisas que eles vão compreender e com sorte apoiarão".
"O que eu quero fazer é falar e deixar a mensagem sobre aquilo que vi. (...) Tenho uma agenda cheia. Hoje Portugal, depois vou a Oslo e à Suíça. Cada vez mais pessoas vão saber sobre pessoas como o Mário e os sacrifícios que fizeram, vão ouvir sobre as YPG e vão começar a compreender (...). Vamos começar um movimento internacional de solidariedade", contou.