Retrato sombrio do país nos 50 anos do 25 de Abril: Habitação e Justiça são os direitos sociais mais comprometidos, mas a Educação, Trabalho, Segurança Social, Saúde e Ambiente também são negativos. Ainda assim, 85% acreditam no poder do seu voto, de acordo com sondagem da Aximage para o JN, DN e TSF.
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Cinquenta anos depois do 25 de Abril, os portugueses fazem um retrato sombrio do país. Há uma maioria insatisfeita com o estado da democracia (51%) e em particular com os políticos, que não se preocupam com os interesses das pessoas (67%). De acordo com uma sondagem da Aximage para o JN, DN e TSF, a vida piorou nos últimos anos (39%) e só um terço acredita que poderá melhorar no curto prazo (33%). Habitação (69%) e Justiça (64%) são as áreas que geram maior descontentamento.
Apesar de, na população em geral, a insatisfação com o estado atual da democracia ser maioritária (51%), há resultados diferentes consoante quem responde. No género, uma vez que eles são mais otimistas (53%) e elas mais pessimistas (54%). Na faixa etária: quanto mais velhos, mais satisfeitos (56% nos 65 ou mais anos), quanto mais novos, mais insatisfeitos (62% nos 18/34 anos). No rendimento: quanto maior, melhor a avaliação (55% para os do topo), quanto menor, pior a avaliação (56% para os do fundo). E até no voto: os eleitores dos dois maiores partidos fazem uma avaliação positiva da democracia (64% entre os socialistas), mas os que votam nos mais pequenos fazem uma avaliação negativa (67% entre o Chega).
Onde se deteta uma opinião mais vincada (e negativa) é na avaliação que os portugueses fazem dos políticos e da sua capacidade de conduzir o país. Quando confrontados com a afirmação de que os eleitos se preocupam com o interesse das pessoas, dois terços discordam (67%). Há também uma maioria significativa que não acredita na capacidade de o Estado atuar em nome de todos (58%). Isto não é sinónimo, no entanto, de descrença total nas soluções do sistema político: 85% acreditam no poder do voto e 67% encontram pelo menos um partido que representa os seus pontos de vista e valores.
Quando se pergunta sobre qual seria a melhor forma de melhorar o funcionamento da democracia (a partir de uma lista de cinco possibilidades), destacam-se as qualidades pessoais, seja de quem quer ser eleito, seja de quem elege: 33% respondem que precisamos de melhores líderes políticos (41% no caso dos eleitores da Iniciativa Liberal); 26% acham que o mais importante é ter cidadãos mais informados e participativos (51% no caso dos eleitores do Livre). Só depois aparecem a prosperidade económica (15%), a igualdade (13%) e a reforma do sistema eleitoral (11%).
A insatisfação com os políticos resultará, pelo menos em parte, da avaliação negativa que os portugueses fazem das suas condições de vida. São mais os que dizem que a sua vida “piorou” nos últimos anos (39%) do que aqueles que sentiram uma melhoria (17%), embora haja 43% para quem ficou tudo igual. A esperança no futuro próximo também não é elevada: 33% acham que vai melhorar (quanto mais jovens mais otimistas), 30% que continuará tudo na mesma, e 31% que vai piorar (quanto menor o rendimento, maior o pessimismo).
Com tanto ceticismo não surpreende que, postos perante sete direitos sociais inscritos na Constituição da República, a avaliação volte a ser negativa. A Habitação e a Justiça são as duas áreas que geram maior insatisfação, com um saldo negativo (diferença entre respostas positivas e negativas) de 40 e 30 pontos, respetivamente. No caso da habitação destaca-se o descontentamento das mulheres, dos que têm 50 a 64 anos e, curiosamente, dos que têm melhores rendimentos. Na Justiça, a frustração é particularmente elevada nos homens, nos que têm 65 ou mais anos e nos que fazem parte da classe média baixa.
Num segundo patamar de insatisfação com os direitos sociais constitucionais, que são afinal áreas fundamentais para o funcionamento do país, aparecem a Educação (com destaque para o descontentamento de quem tem 35 a 49 anos), o Trabalho (que preocupa sobretudo quem tem menores rendimentos) e a Segurança Social (que deixa particularmente frustrada a classe média baixa). Um pouco melhor é a avaliação à saúde (saldo negativo de cinco pontos), sendo que, entre os homens, os mais velhos e a classe média até há mais gente satisfeita do que insatisfeita. Última nota para o Ambiente, com saldo negativo de um ponto, mas é avaliado de forma bastante positiva pelos mais jovens, contrariando a ideia de que são os mais inconformados nesta matéria.
Otimismo socialista. Os eleitores do PS são os mais otimistas nas avaliações à democracia e às suas conquistas: estão satisfeitos com a democracia (64%), são os que mais acreditam nos políticos (44%) e que o Estado beneficia todos (49%).
67%. No polo oposto dos socialistas estão os eleitores do Chega: são os mais insatisfeitos com a democracia (67%) e estão entre os que menos acreditam nos políticos (74%) ou na equidade do Estado (71%).
Crítica feminina. As mulheres são bastante mais críticas do que os homens quando se pede uma avaliação aos direitos sociais. O único caso em que os homens têm uma visão mais negativa do que a delas é na Justiça.
52%. Os portugueses com 65 ou mais anos são os mais satisfeitos com o estado da saúde (52%). Os mais velhos também são benevolentes que os restantes quando está em causa a Segurança Social, o Trabalho e a Habitação.
Vida vai melhorar. Os eleitores da Aliança Democrática são os mais otimistas quanto à evolução das condições de vida, mas sem demasiado entusiasmo: 36% acreditam que será melhor dentro de um ano, 19% que será pior.
23%. Para melhorar a democracia é essencial maior igualdade, dizem 23% dos portugueses mais pobres, enquanto 21% apontam à prosperidade. Ou seja, neste segmento a dimensão económica prevalece sobre a política.
Corrupção nos partidos
É quase unânime a preocupação com a corrupção e os seus efeitos negativos para a democracia (94%), sendo que dois terços dos portugueses (66%) dizem mesmo que é um problema “muito grande” (e em particular os comunistas). Quando se lhes pede para apontarem duas instituições (de uma lista de seis) em que têm a perceção de que os casos de corrupção são mais frequentes, há duas que se destacam claramente das restantes: os partidos políticos (64%), com destaque para os mais pobres e os que têm 35 a 49 anos; e a administração pública (57%), que “vence” entre os homens, os que têm rendimentos mais elevados e os que votam no PAN e na Iniciativa Liberal. A corrupção nas empresas privadas é valorizada por um quarto dos inquiridos (26%), com especial incidência entre os eleitores do Livre; a corrupção entre os agentes da justiça é apontada por 14% (com destaque para os mais velhos); as polícias e os serviços de saúde por 8% (esta última destaca-se entre os mais jovens).