"Pouca coisa nova" e cautela nas opiniões: setor da saúde não é unânime sobre plano de emergência
As várias entidades envolvidas na saúde em Portugal têm opiniões díspares quanto ao plano de emergência apresentado pelo Governo. Há quem já faça críticas e outros preferem esperar por mais pormenores sobre as medidas.
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Após a apresentação do plano de emergência para a saúde pela ministra Ana Paula Martins, esta quarta-feira, não tardaram as reações do setor da saúde às medidas elaboradas pelo grupo de 13 peritos, coordenado pelo médico Eurico Castro Alves. As opiniões não foram unânimes e há várias reações, que vão da reticência, às críticas cerradas e à cautela. Há quem não se sinta representado no plano e outros tantos dizem que pouco vai mudar nos cuidados de saúde prestados em Portugal.
Do lado das estruturas sindicais, a presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), Joana Bordalo e Sá, afirmou à agência Lusa que as medidas apresentadas pelo Governo são "temporárias" e "só existem porque o Serviço Nacional de Saúde (SNS) está em rutura". A dirigente sindical lamenta que esteja a ser pensada a criação de mais incentivos, o que irá gerar "mais desigualdades" e "desestruturação das equipas", referiu. Um convite "a mais trabalho extraordinário e também mais trabalho precário", defendeu.
No plano de emergência para a saúde está, por exemplo, a criação de incentivos financeiros para aumentar a capacidade de realização de partos.
Nuno Rodrigues, secretário-geral do Sindicato Independente dos Médicos (SIM), disse, por outro lado, que vê com "bons olhos algumas medidas", como a "revisão das convenções na área da ginecologia e obstetrícia" e a criação de centros de avaliação médica e psicológica. "Todas as medidas de âmbito voluntário em que os médicos se possam candidatar as carteiras adicionais de utentes, à realização de consultas e de cirurgias adicionais, o SIM está a favor porque defende uma maior autonomia e flexibilidade dos médicos na gestão do seu tempo", acrescentou o clínico à RTP3.
Porém, o dirigente do SIM tem uma "baixa expectativa" relativamente a outras medidas, como a criação de um canal de atendimento telefónico direto para grávidas, à semelhança da linha SNS24, o SNS Grávida. "Não nos parece que seja uma medida que vá ter um benefício fulcral para o sistema de saúde. A maior parte destas situações requer uma avaliação presencial. Não é uma linha [telefónica] que vai fazer uma mudança estrutural", explicou Nuno Rodrigues.
Enfermeiros de fora das medidas
Também o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses se pronunciou sobre o plano de emergência para a saúde. "Há pouca coisa nova. O recurso ao setor privado em relação às listas de espera já existe, e o recurso (aos privados) para outras áreas também já estava a ser feito", referiu a dirigente Guadalupe Simões à agência Lusa. Tanto o sindicato como a Ordem dos Enfermeiros lamentaram a ausência dos enfermeiros das medidas apresentadas pela ministra da Saúde. “Qualquer medida, plano ou reforma que não tenha em consideração a maior classe profissional da saúde está condenada ao fracasso", considerou o bastonário Luís Filipe Barreira em comunicado.
Do lado da Ordem dos Médicos, o bastonário Carlos Cortes disse ser "relevante" ter o primeiro-ministro Luís Montenegro e a ministra da Saúde Ana Paula Martins numa conferência de imprensa conjunta a explicar o plano de emergência para a saúde. "Queria salientar um aspeto novo, mas que eu valorizo, que é uma monitorização deste programa, de forma transparente e pública. Todas estas medidas vão poder ser acompanhadas para nós percebermos se são só promessas ou se há uma vontade de execução", acrescentou o médico aos jornalistas.
Xavier Barreto, presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, referiu na CNN que não basta aumentar os incentivos dos profissionais, é necessário uma "transformação" na prestação de cuidados de saúde em Portugal. O responsável sugere, por exemplo, que se recorra a consultas de enfermagem para "libertar os médicos" das primeiras consultas. "Vamos ter de esperar pelo plano para poder fazer um juízo", salientou.
Cuidados continuados não foram referidos
Perante o número de camas ocupadas indevidamente nos hospitais, a Associação Nacional dos Cuidados Continuados lamentou, em comunicado, que não haja uma "única medida" no plano sobre este tipo de cuidados. Em março deste ano, contabilizavam-se 2164 camas ocupadas devido a internamentos inapropriados, um aumento de 11% face ao ano passado, segundo a 8.ª edição do Barómetro dos Internamentos Sociais.
"Não só, mais uma vez e na continuação da política do Governo anterior, os cuidados continuados é como que não interessam para resolver os problemas do setor da saúde (quando são tão fundamentais), como também o Governo não explica como irá resolver estes internamentos indevidos", refere a associação, que deixa também críticas à ausência de medidas para valorizar os salários dos profissionais de saúde do setor social e privado.