A presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN), Ana Paula Martins, disse, esta quarta-feira, no Parlamento,que a auditoria realizada revelou que a primeira consulta das gémeas brasileiras foi marcada pela secretaria de Estado da Saúde, via telefone.
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"Ontem [terça-feira], por volta das 23.30 horas, recebemos um email com o relatório final da auditoria interna que, no dia 9 de novembro, tínhamos,enquanto conselho de administração determinado abrir", esclareceu Ana Paula Martins, no Parlamento, onde está a ser ouvida sobre o caso das gémeas luso-brasileiras com atrofia muscular espinhal que vieram a Portugal em 2019 receber o medicamento Zolgensma, conhecido como um dos mais caros do mundo.
"Os controlos internos implementados no tratamento de doentes com Atrofia Muscular Espinhal, onde a terapêutica utilizada foi o Zolgensma, no período de 2019 a outubro de 2023, na sua admissão tratamento e monitorização asseguram o cumprimento da legislação em vigor e das operações em todos os aspetos, exceto na referenciação para a primeira consulta na especialidade de neuropediatria de dois doentes que foram referenciados ao departamento de pediatria pela secretaria de estado da saúde, segundo registo em dossiê clínico, com consulta marcada via telefone, não tendo sido cumprido o disposto na portaria n.º 147/2027, artigo 8.º", referiu, citando as conclusões da autoria interna que já foi enviada para o Ministério da Saúde e para a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS).
Segundo a auditoria, as outras oito crianças tratadas no Santa Maria com o Zolgensma, entre 2019 e 2023, foram referenciadas para o hospital por centros de saúde ou por hospitais. "O Conselho de Administração quer crer que não ocorrem no Centro Hospital e Universitário de Lisboa Norte tratamentos que não sejam objeto da validação ou parecer favorável clínico existencial”, acrescentou Ana Paula Martins.
Responsabilidades disciplinares e criminais "fora do âmbito" da auditoria
Ana Paula Martins explicou ainda que “estará fora do âmbito da presente auditoria averiguação de quaisquer responsabilidades disciplinares ou criminais que são do âmbito das presentes ações de fiscalização do IGAS e do Ministério Público”, bem como não “constitui objeto do relatório a análise e verificação dos procedimentos de contratação pública adotada para a aquisição do medicamento”. A presidente do CA do Santa Maria revelou também que a informação pedida pela Ordem dos Médicos já foi “enviada”.
A presidente do Santa Maria explicou que a auditoria versou sobre a avaliação do “sistema de controlo interno em funcionamento abrangendo os procedimentos realizados antes, durante e após o referenciado tratamento às duas bebés gémeas brasileiras”, abrangendo as 10 crianças e os três ensaios clínicos que foram tratados naquele hospital.
Ana Paula Martins esclareceu que era importante perceber qual “eram os procedimentos que estavam em causa, como é que era o estado das crianças que nos chegavam, como é que nos chegavam, de onde é que lias vinham, como é que elas vinham, qual era o processo para a decisão médica, qual era o processo para a submissão à comissão da farmácia, como é que o conselho de administração fazia a autorização destes tratamentos”, explicou.
Questionada pela deputada do PS, Maria Antónia de Almeida Santos, sobre se já foram recuperados os documentos perdidos relativos ao processo, a presidente do conselho de administração do Santa Maria esclareceu salientou que o único registo desaparecido foi “uma carta que era referida pelos médicos neuropediatras ter sido entregue no conselho de administração”. “Não posso explicar se ela devia existir ou não porque não a conhecia e não estava na nossa memória histórica”, admitiu.
Tratamento dos dez doentes custou 16,4 milhões
Durante a Comissão de Saúde, foi esclarecido aos deputados que “os dez doentes representam um custo de 16,4 milhões de euros para o orçamento do hospital, entre os quais 12,4 milhões de euros já pagos”.
Ana Paula Martins explicou também que são sempre pedidos dois documentos a todas as crianças tratadas no Santa Maria com esta terapêutica: o “cartão de cidadão”, para o registo do utente, e uma “declaração por parte da família de que há residência em Portugal”. Já a administração do medicamento "decorre sempre de pareceres técnicos clínicos favoráveis à sua persecução”, tendo sido pedido à União Europeia uma autorização excecional para o financimento deste tratamento, eclareceu.
Quanto ao facto de o Estado português ter custeado quatro cadeiras de rodas elétricas e duas cadeiras/carrinhos manuais às duas gémeas brasileiras, a presidente do CA do Santa Maria adiantou que a prescrição destes equipamentos foi feita de acordo com “a melhor arte médica”, tendo o hospital feito o mesmo “para todas a crianças de acordo com o prescrito pelos médicos”.
Recorde-se que o processo das gémeas está a ser investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), pela Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) e foi objeto de uma auditoria interna no Hospital de Santa Maria.