Investimentos têm sido definidos pelas necessidades do território, pela orientação dos fundos europeus e pela saúde das contas municipais.
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Cultura, apoios sociais e educação, em vez de saneamento, estradas e pavilhões desportivos. As prioridades das câmaras mudaram, nos últimos 30 anos, consoante as necessidades dos territórios, a saúde das contas públicas e os incentivos dos fundos europeus. E os próximos anos continuarão a transformar o poder local, concordam três presidentes de câmara no limite de mandatos (12 anos) e um quarto, o que há mais tempo está em funções.
Francisco Amaral é o único que se poderá recandidatar (a Castro Marim), apesar de já levar 28 anos como presidente (primeiro, em Alcoutim). Nestas três décadas, assistiu a várias transformações das prioridades do Poder Local. "Antes do 25 de abril não havia poder local, nos anos 80 e 90 estava tudo por fazer".
A prioridade foi dada às infraestruturas de base: água, saneamento, eletricidade, estradas. Elísio Brandão, professor na Faculdade de Economia do Porto, recorda como, no verão, faltava água na zona alta do Porto. "Só se resolveu com a barragem de Crestuma".
Pontes entre fronteiras
No início do milénio, a atenção estava na habitação social, escolas, recolha de resíduos, parques industriais ou pavilhões desportivos. Muitas vezes, nota Elísio Brandão, sem acautelar a sustentabilidade. "Havia uma fronteira entre os concelhos, cada câmara queria ter os seus equipamentos, sem partilhar", diz Gonçalo Rocha, de Castelo de Paiva.
Era essa a orientação do dinheiro europeu. "Havia fundos para fazer rotundas, era rotundas que se fazia. Agora houve para ciclovias. Foram feitas e são pouco usadas", lamenta Artur Nunes, de Miranda do Douro.
Hoje, há mais cooperação, facilitada pelas comunidades intermunicipais, pela estrutura dos fundos do Portugal 2020 e pela asfixia financeira com que muitas câmaras entraram na crise de 2008.
A última década foi de "boom" do turismo e as câmaras foram facilitadoras, ao investirem em regeneração urbana, mobilidade, cultura e natureza e em equipamentos sociais.
Agora, o foco voltará a mudar. A digitalização e as alterações climáticas serão centrais, de novo sob a influência da Europa. E a descentralização em curso resultará, no médio prazo, em mais competências para as câmaras, apesar do impacto negativos no imediato. "O valor que o Governo vai transferir não chega e teremos que reforçar recursos humanos, o que aumentará a despesa", nota Joaquim Pinto Moreira, de Espinho. Além disso, será necessário dar mais capacidade de gestão: "Com pelouro, temos um presidente e três vereadores. O dia só tem 24 horas!".
Velocidades diferentes
O percurso do poder local disfarça diferentes realidades locais. Em Castelo de Paiva, por exemplo, opções antigas levam a que ainda falte saneamento básico, apesar dos investimentos recentes. E a rede de abastecimento de água, já antiga, precisa de ser renovada - tal como em muitos outros concelhos do país.
Nos Interior despovoado, atrair gente é cada vez mais prioritário. A bazuca espanhola tem um plano próprio para municípios com menos de dez mil habitantes. "Deveríamos fazer o mesmo, para que todos tenham o mesmo ponto de partida", compara Artur Nunes. E Francisco Amaral nota ser "mais fácil comprar casa no litoral do que construir na serra", cada vez mais despovoada. "Este ordenamento do território só desordena", lamenta.