O deputado Hugo Carvalho, do PS, admitiu esta quinta-feira, no Parlamento, que o partido não exclui a reentrada do Estado no capital dos CTT "se isso for necessário" para "defender o interesse superior de todos os portugueses".
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À Esquerda, BE, PCP, PAN e Verdes denunciaram a "degradação" da empresa de serviço postal desde a entrada da gestão privada; à Direita, o PSD lembrou que a privatização rendeu dinheiro ao Estado e os restantes partidos insistiram que o tema não é prioritário em tempo de pandemia.
"Devemos debater tudo sem tabus", afirmou o socialista Hugo Carvalho, "sem excluir a entrada do Estado no capital da empresa se isso for condição necessária para salvaguardar que não há distribuição de dividendos acima dos lucros quanto há um desinvestimento no serviço prestado".
O parlamentar do PS reforçou que o seu partido apoiará a medida "se isso for necessário para termos uma presença equilibrada e justa dos CTT em todo o território nacional", seja para "melhorar os níveis de qualidade do serviço" ou para "defender o interesse superior de todos os portugueses".
Para Hugo Carvalho, o fim do atual contrato de concessão - em vigor desde os tempos da troika e que termina no fim deste ano - é uma "oportunidade por excelência para corrigir alguns aspetos" e devolver os CTT ao "papel central que estes sempre tiveram na vida dos portugueses".
O deputado lembrou que há vários concelhos sem serviço postal e acusou o PSD e o CDS, no Governo à época da venda dos CTT, de terem feito a privatização "de forma cega".
Privatização deu 900 milhões de lucro, diz PSD
O PSD defendeu-se através de Sofia Matos, que argumentou que a privatização ocorreu "para honrar os compromissos assumidos não por nós, mas por aqueles que, em 2011, levaram o país à bancarrota", referindo-se ao PS.
A deputada acrescentou que a privatização não ocorreu "a preço de saldo" - expressão repetida pelas bancadas à Esquerda - mas que permitiu ao Estado arrecadar 900 milhões de euros. Sofia Matos pediu ainda "bom senso" e "rigor" à ANACOM, entidade reguladora das comunicações postais, no momento de avaliar a atual gestão dos CTT.
O debate foi desencadeado pela apresentação de dois projetos de lei - de BE e PCP - que propõem a reversão da privatização dos CTT e por dois projetos de resolução - de PAN e Verdes - que recomendam ao Governo medidas no mesmo sentido. Isabel Pires, do BE, recordou que, entre 2015 e 2012 - um ano antes da privatização -, a empresa deu cerca de 500 milhões de euros de lucro ao Estado.
A venda dos CTT, referiu a bloquista, foi um "profundo erro" que abriu a porta ao encerramento de 69 estações de correios até novembro de 2019. Atualmente, acrescentou, já há 33 concelhos sem qualquer posto dos CTT e o número pode subir até aos 48, o que afetaria "quase 500 mil habitantes".
Isabel Pires sustentou que os CTT foram vendidos apenas para distribuir dividendos aos privados, denunciando ainda a "vampirização" da empresa em benefício do Banco CTT.
PCP também responsabiliza PS
Bruno Dias, do PCP, criticou as "opções ruinosas" da gestão privada, dizendo que se tem assistido à "degradação" dos CTT. O comunista notou que há sedes de concelho que apenas têm balcões da empresa a 30 quilómetros de distância, lembrando ainda que, em 2019, a empresa chumbou em 23 dos 24 indicadores de qualidade.
O comunista denunciou a "distribuição agressiva de dividendos acima dos lucros" e a "delapidação do património" dos CTT, que considera estarem a ser levadas a cabo pela administração. Também criticou o PS: "ate quando os senhores vão deixar arder para depois discutir as cinzas?".
Inês Sousa Real, do PAN, apontou baterias ao "experimentalismo ideológico" do Governo PSD/CDS, uma vez que os 5,5 mil milhões de euros exigidos pela troika em privatizações "já tinham sido alcançados". A deputada considerou que a venda total dos CTT ocorreu para satisfazer os "devaneios" da gestão privada.
José Luís Ferreira, dos Verdes, disse que PSD e CDS "privaram o Estado de centenas de milhões de euros em dividendos". Em resposta aos sociais-democratas, afirmou que, se privatizaram os CTT "contrariados" nos tempos da troika, nada os impede agora de reverterem esse negócio.
Realidade não é "compatível" com o que quer a Esquerda, diz CDS
João Gonçalves Pereira, do CDS, lembrou que, tanto em Portugal como no plano internacional, o serviço postal tem tido quebras "de 6% e 7% ao ano", considerando que a realidade dos factos não é "compatível" com aquilo que a Esquerda defende para os CTT.
André Ventura, do Chega, disse que houve menos despedimentos com a gestão privada e que a Esquerda quer destruir o que está "a funcionar bem". Já João Cotrim Figueiredo, da Iniciativa Liberal, referiu que a nacionalização ainda não ocorreu porque "até o PS sabe que é má ideia".
Cotrim acrescentou ser preciso "topete" para a Esquerda andar a "brincar aos carteiros" durante a pandemia. Ventura também foi crítico do momento em que a discussão ocorreu.