Durante a pandemia, empregadas domésticas assistiram ao congelamento da sua atividade. Banco de horas e férias antecipadas são algumas soluções apresentadas pelos empregadores.
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Todas as manhãs, Conceição saía de Pedras Rubras, na Maia, onde vive com a filha de 15 anos, para prestar serviços de limpeza ao domicílio. O dinheiro ajudava nas despesas, mas devido à pandemia não demorou a ser dispensada. Não fosse o trabalho que mantém num supermercado estaria de bolsos vazios. Atualmente sobrevive apenas com 378 euros mensais pelas cinco horas que cumpre na parte da tarde. "Estou com muitas dificuldades", desabafa com um sorriso inseguro.
Como muitos outros portugueses, a trabalhar informalmente sem fazer descontos para a Segurança Social, poderá agora ser uma das beneficiárias das medidas de apoio extraordinário anunciadas pelo Governo, que o JN ontem divulgou.
Com 49 anos, Conceição espera regressar ao trabalho rapidamente. "Enviei-lhes mensagem a garantir que aplicaria todas as precauções necessárias", mas a decisão não se alterou.
Transporte dificulta
"Cabe à entidade patronal decidir o que vai fazer", avalia Pedro Vaz Branco, sócio- -gerente da empresa de recrutamento Donas de Casa, no Porto. "Um tema preocupante é a questão da deslocação", sendo que muitas empregadas utilizam transportes públicos. Para contornar o problema, alguns empregadores disponibilizam-se a ir buscar a funcionária na própria viatura, e a deixá-la em casa no final do serviço. Desta forma protege o seu emprego e a própria saúde.
Isabel Gomes, 47 anos, também não tem a situação regularizada na Segurança Social. "Estive no fundo de desemprego para cuidar do meu filho que ficou doente", conta a mãe de três jovens de 15, 18 e 23 anos. Após o mais novo recuperar de uma leucemia que a impediu de trabalhar durante dois anos, Isabel não conseguia um emprego que proporcionasse alguma estabilidade. "Tive de me desenrascar, por minha conta em risco" lembra. Tornou-se empregada doméstica porque "caso contrário não ganharia nenhum".
Sem trabalho
A morar em Bitarães, Paredes, dirigia-se bem cedo a Penafiel para trabalhar. Exercia funções de limpeza em seis casas quando foi dispensada no início da pandemia. "Disseram que me voltavam a chamar". Entretanto, sobrevive sem trabalho e sem rendimentos.
Perante vários cenários negativos, Fátima, 64 anos, elogia os seus empregadores por se encontrar numa situação mais confortável. "Trabalho com três famílias que me mandaram ficar em casa, mas continuaram a pagar-me", conta agradecida. A trabalhadora não está regularizada na Segurança Social.
"Há muito menos propostas de clientes, mas continuam a existir", conta Arminda Serrano, sócia gerente da QuerMarias, em Lisboa. Os clientes priorizam trabalhadoras em quarentena dispostas a realizar testes de despiste. Outros casos estão a ser resolvidos com "férias antecipadas ou banco de horas". No geral, "tem havido bastante bom senso".Quando questionada sobre o regresso das empregadas domésticas ao trabalho, não hesita na resposta: "Vão voltar porque são necessárias, sempre foram e vão continuar a ser".
Pedro Vaz Branco
Empresa Donas de Casa "Temos recebido pedidos de empregadas por parte de profissionais de saúde e de idosos que precisam de acompanhamento"
Arminda Serrano
Empresa QuerMarias "Algumas mulheres em regime externo sugeriram às entidades patronais que as passassem a interno para protegerem o seu emprego"
Isabel Gomes
Empregada doméstica "Embora em lay-off, o meu marido tem sido capaz de amparar as despesas. A empresa parou a 16 mas o patrão pagou o mês inteiro"
Regularização
Uma ação em tribunal para o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho de serviço doméstico. Terá de haver um indício das funções exercidas, sejam testemunhas, transferências bancárias ou recados deixados pela entidade empregadora.
Fundo de desemprego
Na maioria dos casos as empregadas domésticas não têm acesso, sendo que optam por um regime de contribuições cujo valor de referência, substancialmente mais baixo, não é necessariamente o valor real.
Indemnização
O empregador pode fazer caducar o contrato de trabalho se este for devidamente justificado. A trabalhadora tem direito a uma compensação equivalente à retribuição de um mês por cada três anos de serviço, até ao limite de cinco meses.
Filhos menores de 12
Tem acesso a um apoio correspondente a dois terços da remuneração registada no mês de janeiro de 2020, com um limite mínimo de 635€ e um limite máximo de 1905€, calculado em função do número de dias de falta ao trabalho. Desde que tenha situação regularizada.