Centenas de bombeiros sapadores ocuparam, na quarta-feira, a escadaria da Assembleia da República para exigir melhores condições salariais, nomeadamente um subsídio de risco mais justo para a classe. Alegam que estão há 22 anos sem respostas. Saiba o que são, quantos há, quanto recebem e quem paga aos sapadores.
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Qual é a diferença entre os bombeiros?
De acordo com a Liga dos Bombeiros Portugueses, há 468 corporações de bombeiros em Portugal: 435 de voluntários, 14 municipais, 11 de sapadores e oito privadas.
A principal diferença entre as corporações prende-se com a sua propriedade. As corporações de voluntários, onde também há bombeiros profissionais, pertecem a associações humanitárias e são financiadas pela Autoridade Nacional de Proteção Civil e por subsídios, donativos e sócios. As corporações municipais (que podem ser constituídas por voluntários e profissionais) e de sapadores estão na dependência direta de uma câmara municipal.
Das 25 corporações de sapadores, apenas uma pequena percentagem está no Interior do país, estando a maioria concentradas no Litoral.
Os bombeiros voluntários trabalham, como o próprio nome indica, em regime de voluntariado. Os sapadores são profissionais, sendo a sua ocupação principal a de bombeiro, trabalhando em turnos rotativos.
Além disso, para ingressar na carreira de bombeiro voluntário é necessário ter a escolaridade mínima obrigatória, ter entre 18 e 45 anos e fazer uma formação de 250 horas. Para ser sapador são necessárias provas de ingresso físicas, escritas e médicas. A idade de entrada na carreira é entre os 18 e os 25 anos e é preciso ter como habilitações literárias o 12.º ano de escolaridade ou equivalente.
Quantos sapadores há e quanto recebem?
De acordo com o Sindicato Nacional de Bombeiros Sapadores (SNBS), há cerca de três mil bombeiros sapadores em Portugal.
O vencimento base é de 1075 euros brutos, sendo que 2% da remuneração inclui o pagamento de três suplementos: risco, penosidade e insalubridade; disponibilidade permanente e ónus específico da prestação de trabalho.
Isto significa que os três suplementos juntos representam 21,50 euros brutos da remuneração base de um sapador e que o subsídio de risco, por exemplo, vale 7,17 euros.
Quem paga aos sapadores?
Quem determina as condições de carreira e de trabalho dos bombeiros sapadores é o Estado, ainda que sejam as câmaras municipais as responsáveis por pagar aos profissionais. Os bombeiros sapadores são funcionários públicos. A questão deu origem a uma troca de acusações entre a ministra da Administração Interna e as autarquias, na quarta-feira, dia da manifestação dos sapadores.
A ministra da Administração Interna sacudiu as responsabilidades ao afirmar que "o patrão não é o Estado", uma vez que os sapadores "dependem das autarquias". As palavras de Margarida Blasco não agradaram à Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) que admitiu, em comunicado, ter recebido as declarações da ministra sobre a responsabilidade das câmaras em relação às exigências dos sapadores com "estranheza e estupefacção".
Os autarcas lembraram que, a 12 de junho, entregaram ao Governo uma proposta para a revisão da carreira e remunerações dos bombeiros sapadores, não tendo obtido resposta. A ANMP, liderada pela autarca socialista Luísa Salgueiro, referiu ainda que as autarquias locais "não têm poder legislativo" e que a revisão da carreira profissional e respetiva remuneração são "fixadas por decreto-lei do Governo".
Também o presidente da Câmara Municipal do Porto afirmou que só por "desconhecimento" é que a ministra da Administração Interna pode dizer que os sapadores são da responsabilidade das autarquias e não do Estado. Na segunda-feira, o executivo de Rui Moreira aprovou uma proposta que recomenda ao Governo as "necessárias alterações legislativas" para atualizar as tabelas salariais e os valores dos subsídios de risco.
Como surgiu o protesto?
O acordo entre o Governo e os polícias e os guardas prisionais, firmado após sucessivos protestos, foi um dos rastilhos da manifestação dos bombeiros sapadores, que exigem - entre outras reivindicações - um subsídio de risco mais justo para a profissão.
Os incêndios ocorridos em setembro na zona Norte e Centro do país agigantaram a perceção pública da necessidade de valorização dos bombeiros. A manifestação foi promovida pelo Sindicato Nacional dos Bombeiros Sapadores (SNBS), alegando que o diploma que regula o estatuto dos bombeiros profissionais não é revisto há mais de 20 anos.
Quais são as principais reivindicações?
No anúncio da manifestação marcada para 2 de outubro, o presidente do SNBS afirmou que os bombeiros sapadores "reivindicam acertos salariais para compensar o aumento da inflação, conforme foi atribuído às demais carreiras da Função Pública.
Em comunicado, Ricardo Cunha sublinhou que "existiu um compromisso do anterior Governo" para atribuir a compensação aos bombeiros" com retroatividade a janeiro de 2023, mas que "até à data tal não aconteceu". O dirigente considerou que os sapadores terão "ficado fora desses acertos salariais por serem uma carreira especial da Função Pública não revista".
O SNBS exige também a "regulamentação da carreira, onde sejam contemplados os suplementos de risco, penosidade e insalubridade, bem como a disponibilidade permanente, em percentagem e à parte do vencimento". Para o sindicato dirigido por Ricardo Cunha, os dois subsídios deveriam representar 25% do vencimento e ser pagos à parte, de modo a acompanhar os aumentos salariais.
Também é exigido um horário de trabalho "a nível nacional que garanta a operacionalidade e a segurança dos bombeiros e daqueles que por eles são socorridos".
O que diz o Governo?
Apesar de ter dito que o patrão dos sapadores "não é o Estado" - declaração fortemente contestada pelas autarquias -, a ministra da Administração Interna garantiu que as negociações "chegarão a bom porto". "Estão a decorrer várias negociações no sentido de chegarmos a um bom termo, a um bom porto, relativamente ao estatuto dos bombeiros", afirmou Margarida Blasco.
A governante insistiu que "é à mesa das negociações que se fazem os acordos" e que "este Governo tem dado provas disso", defendendo que o Executivo já negociou com forças de segurança, guardas prisionais, oficiais de justiça, forças armadas ou enfermeiros o respetivo estatuto.
A ministra responsável pela tutela lembrou ainda o bónus de 25% do valor diário para os bombeiros voluntários afetos ao Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR), que trabalharam nos incêndios de há duas semanas.