Cerca de 60 mil militantes socialistas escolhem na sexta-feira e sábado o sucessor de António Costa no cargo de secretário-geral do PS, numas eleições disputadas entre José Luís Carneiro, Pedro Nuno Santos e Daniel Adrião.
Corpo do artigo
Um processo eleitoral que foi aberto com a demissão de António Costa das funções de primeiro-ministro a 7 de novembro, após ser tornado público que era alvo de um inquérito judicial no Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito da Operação Influencer. António Costa afirmou logo nesse dia que não se recandidataria às funções de primeiro-ministro nas eleições legislativas, que viriam a ser antecipadas pelo Presidente da República para 10 de março.
Além do novo líder do partido, os socialistas vão eleger na sexta-feira e no sábado 1400 delegados (aos quais se juntam 1100 com direito de inerência) ao congresso nacional, que se realizará entre 5 e 7 de janeiro, na Feira Internacional de Lisboa.
De acordo com dados fornecidos pela Comissão Organizadora do Congresso (COC), dos 80 mil membros inscritos no PS, cerca de 60 mil regularizaram o pagamento das suas quotas até 1 de dezembro, estando em condições de votar nas diretas para a escolha do novo líder e nas eleições de candidatos a delegados ao congresso.
Mesmo com a redução do universo eleitoral em 20 mil militantes, depois de terem sido retirados dos cadernos eleitorais os militantes sem quotas em dia, a Federação da Área Urbana de Lisboa (FAUL) continua a ser a terceira maior estrutura deste partido a nível nacional com 7170 eleitores, atrás do Porto com cerca de 11 mil e de Braga com 7800.
Na sexta-feira, votam os militantes da FAUL e os das federações de Aveiro, Bragança, Castelo Branco, Évora, Guarda, Leiria, Portalegre, Oeste, Setúbal, Viana do Castelo e Vila Real.
No sábado, há eleições nas federações do Algarve, Baixo Alentejo, Braga, Coimbra, Porto, Santarém, Viseu, Açores e Madeira. As votações terminam às 23 horas (hora indicativa) de sábado.
Os primeiros resultados eleitorais serão divulgados pelas 23.30 horas, na sede nacional do PS, pelo presidente da Comissão Organizadora do Congresso (COC), Pedro do Carmo.
Carneiro e Pedro Nuno em confronto
As candidaturas à liderança do PS de José Luís Carneiro e de Pedro Nuno Santos, durante o período de campanha interna, travaram um intenso debate sobre quem melhor defende a autonomia estratégica deste partido.
Ao longo da campanha para as eleições diretas desta sexta-feira e sábado, tanto o ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, como o deputado Pedro Nuno Santos, assumiram que dificilmente o PS repetirá a maioria absoluta de 2022 nas eleições legislativas antecipadas de 10 de março, e a discussão travada centrou-se na questão da governabilidade num cenário em que os socialistas ficam em maioria relativa no parlamento.
José Luís Carneiro procurou apresentar a sua candidatura como a mais moderada e, como tal, a que posiciona o PS com maior capacidade para disputar com o PSD os eleitores do "centro político" nas legislativas antecipadas de 10 de março. Em várias intervenções públicas, considerou que é ele quem está em melhores condições para derrotar o PSD de Luís Montenegro nas próximas eleições.
Nunca excluiu a reedição da "Geringonça" de 2015, mas também nunca colocou essa hipótese como preferencial. O modelo de governabilidade de José Luís Carneiro apresentou linhas em comum com as opções seguidas pelos executivos minoritários de António Guterres (1995/2001) e de José Sócrates (2009/2011), em que o PS governou com base em acordos pontuais tanto à sua direita (viabilizações de orçamentos), como à sua esquerda (entendimentos em políticas sociais).
Já Pedro Nuno Santos afastou a possibilidade de o seu partido viabilizar um Governo minoritário social-democrata - "o PS não será muleta do PSD" - e, por várias vezes, atribuiu a José Luís Carneiro essa intenção. Uma intenção que, alegadamente, visa evitar que o Chega integre uma futura solução de Governo, ou que o país entre numa conjuntura de ingovernabilidade e instabilidade política.
O ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação defendeu os resultados dos governos minoritários de António Costa suportados pela "Geringonça", sobretudo o primeiro entre 2015 e 2019, disse acreditar que a saúde da democracia portuguesa depende de PS e PSD serem alternativas, mas recusou-se a especificar por enquanto o que fará se for eleito líder dos socialistas e vencer com maioria relativa nas legislativas de março.
Apoiantes com peso político
Em termos de peso político, os principais apoiantes da candidatura de José Luís Carneiro foram o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, o ministro das Finanças, Fernando Medina, o antigo ministro José António Vieira da Silva, o líder parlamentar, Eurico Brilhante Dias, e figuras "históricas" como Jorge Lacão, José Leitão ou Arons de Carvalho.
Na sua moção de estratégia, o ministro da Administração Interna comprometeu-se com "contas certas" nas finanças e com pactos de legislatura na saúde e na habitação, além da defesa da regionalização.
A candidatura de Pedro Nuno Santos reivindicou ter o apoio da maioria das federações, concelhias e deputados do PS. Recebeu o apoio do presidente do partido, Carlos César, dos ministros do Ambiente (Duarte Cordeiro), Educação (João Costa) e Saúde (Manuel Pizarro), do "histórico" Manuel Alegre e, para surpresa geral, de figuras da chamada "ala direita" dos socialistas, como Francisco Assis, Sérgio Sousa Pinto e Álvaro Beleza.
A sua moção foi coordenada pela ex-ministra e atual deputada Alexandra Leitão e, além de defender um referendo à regionalização e uma revisão constitucional para o aprofundamento das autonomias regionais, prometeu uma linha de concertação entre trabalhadores e empresários e a reposição da totalidade do tempo congelado dos trabalhadores da administração pública - uma medida com particular incidência no caso dos professores.
Daniel Adrião recandidata-se
Nas eleições desta sexta-feira e sábado para o cargo de secretário-geral do PS, recandidata-se o dirigente socialista Daniel Adrião. Já o tinha feito contra António Costa em 2016, 2018 e 2021.
Líder de uma sensibilidade minoritária nos órgãos nacionais do PS, Daniel Adrião afirmou ao longo da campanha interna que José Luís Carneiro e Pedro Nuno Santos representam candidaturas de continuidade e, como tal, tiveram responsabilidades no caminho "de más práticas" que, na sua perspetiva, conduziu à queda de um Governo com maioria absoluta no parlamento.
Daniel Adrião defendeu uma profunda reforma do sistema político para aproximar eleitos e eleitores, revitalizar o sistema democrático e combater as correntes populistas. Ao nível interno, tem criticado a falta de democracia interna no seu partido e bate-se pela generalização de eleições primárias na escolha de candidatos socialistas a cargos de representação política externa, casos, entre outros, de candidatos a deputados e a presidentes de câmara.
Considerou, ainda, essencial que se acabe com a acumulação na mesma pessoa dos cargos de primeiro-ministro e de secretário-geral do PS.
Nesta campanha eleitoral, as ministras Ana Catarina Mendes, Mariana Vieira da Silva, o secretário de Estado António Mendonça Mendes, o deputado Jorge Seguro e o anterior líder António José Seguro, cada um por diferentes motivos, não apoiaram qualquer um dos três candidatos à sucessão de António Costa no cargo de secretário-geral do PS.
António Costa manifestou-se neutro nesta corrida à sua sucessão, mas elogiou as qualidades políticas de dois dos três candidatos: José Luís Carneiro e Pedro Nuno Santos.